OS NICOLAÍTAS EM APOCALIPSE

Leitura: Apocalipse 2:6
 
Antes de lançar o desafio à igreja Cristo elogia mais uma coisa. Levando em consideração a sua posição, esta recomendação dever ser secundária em relação à Sua aprovação total anterior. O primeiro elogio (v. 2) era em relação à coisas positivas - evidência de um resíduo de amor que ainda os inspirava no serviço, os encorajava na verdade e os capacitava a suportar as provações do testemunho. Aqui, a característica negativa elogiada por Cristo serve apenas para dar um pouco de esperança sobre sua condição não estar além do alcance de restauração. Ainda existe amor pela Sua pessoa, mostrado de forma negativa, aborrecendo aquilo que Ele também aborrece. O verbo "aborrecer" (miseo) é usado na sua força total de "detestar completamente". O detestar não é pessoas, mas certas práticas (erga) que são identificadas como pertencendo aos nicolaítas. Vemos claramente no VT como Jeová aborrecia toda a idolatria e imoralidade (Is. 61 :8; Jer. 44:4; Amos 5:21; Zac. 8: 17). Para o Seu povo compartilhar deste ódio, mesmo em dias quando não estavam obedecendo plenamente, era uma evidência de uma certa comunhão com o Senhor, que indicava uma possibilidade de recuperação. Esta é a idéia aqui. Embora o amor por Cristo pode ter diminuído, compartilhar em detestar o que Cristo detestava era uma certa evidência da operação da graça e uma base para esperança de que pudesse haver uma recuperação completa.
 
Muita discussão erudita tem surgido sobre quem eram os nicolaítas.
 
Há muitas sugestões sobre a identidade deste grupo, mas todas se resumem, basicamente, em dois pontos de vista principais:
Ponto de vista 1. Este ponto de vista pode ser chamado de ponto de vista histórico. É o mais antigo. Tem sido defendido desde os tempos de Irineu, no final do século 11. Este escritor antigo relacionava os nicolaítas com uma seita herege que tomou como nome Nicolau de Antioquia, um dos sete primeiros diáconos (Atos 6:5). Este Nicolau foi acusado de ser um judeu prosélito que apostatou. Este parecer teve grande apoio entre os primeiros pais da igreja, que diziam que os nicolaítas eram uma seita de hereges libertinos antinômicos que, sob a capa da liberdade professa que temos em Cristo, viviam na mais devassa libertinagem e imoralidade: Desta forma perversa esta seita procurava unir o Cristianismo ao paganismo. Himineu e Fileto (11 Tim. 2: 17) são mencionados como pertencendo a esta seita. Comentaristas que apoiam esta tradição insistem que eles são um paralelo, no NT, dos ensinos de Balaão nos dias do VT. Alguns também insistem que há um paralelo entre a etimologia grega de "nicolaíta" (conquistador do povo) e a etimologia hebraica de Balaão (devorador do povo). Veja comentários em vs. 15-16. O argumento é que o ensino de Balaão e dos nicolaítas serviu para derrubar a separação que Deus tinha colocado entre o Seu povo e o mundo ao redor. Assim as tentações sociais e sexuais oferecidas pelas mulheres moabitas, sob a instigação de Balaão, resultou em Israel ser julgado por Deus por causa de idolatria e imoralidade. Um elemento forte de gnosticismo no ensino dos nicolaítas daria um certo respeito intelectual a tal ensino libertino. Isto por sua vez incentivaria os cristãos a se unirem mais uma vez às praticas pagãs das quais Cristo os tinha libertado. Veremos, entretanto, que Cristo faz distinção entre dois grupos de pessoas (v. 15) e isto, por si só, é um forte argumento contra identificar o ensino dos nicolaítas com o de Balaão.
 
O verdadeiro problema em ver esta seita como libertinos que deviam sua existência aos ensinos de Nicolau, o diácono, é muito simples. A evidência histórica para isto é tão fraca que é quase inexistente. Nicolau, na estimativa de muitos historiadores, tem sido extremamente caluniado sem causa aparente, unicamente por causa do seu nome. A seita em si parece ter surgido somente por causa do seu nome, não tendo outras testemunhas. Historiadores e comentaristas do calibre de H. V. Alford, F. Hort, I. T. Beckwith e H. B. Swete não encontram evidência alguma para ligar esta seita com o Nicolau do NT. O melhor que eles podem sugerir pode ser resumido nas palavras de H. B. Swete: "Considerando tudo, parece melhor supor que havia um grupo com este nome na Ásia quando o livro de Apocalipse foi escrito, que devia ou não sua origem a Nicolau de Antioquia, o que não é improvável, ou a outro ensinador falso com este nome". De fato o argumento histórico para tal identificação é completamente negativo. W. Lincoln, resumindo, diz: "homens tem suposto que esta seita existia, depois deduziram que seu nome tinha sua origem em algum Nicolau, e depois o próprio Nicolau foi identificado - tudo pura imaginação".
 
Ponto de vista 2. Este ponto de vista pode ser chamado o ponto de vista etimológico, e tem muito mais para apoiá-lo. A identificação deste grupo é derivada da etimologia da palavra "nicolaítas". A palavra é formada da palavra nike ("vitória") e 'aos ("povo") que dá o significado "conquistador do povo". Este ponto de vista vê os nicolaítas como os precursores da hierarquia clerical que reivindicou domínio sobre os cristãos. O ensino do NT mostra como homens espiritualmente capacitados e com dons devem ser reconhecidos como presbíteros, anciãos e diáconos, nas igrejas locais. A mensagem de Paulo aos presbíteros em Éfeso mostra como isto deveria ser feito (Atos 20:28), e ao mesmo tempo alerta contra os que se levantariam "para atraírem os discípulos após si". O tempo do qual Paulo havia avisado trinta anos antes parece ter finalmente chegado a Éfeso; homens estavam procurando construir um círculo de influência pessoal e estabelecer uma hierarquia clerical para dominar a igreja. O que vemos aqui nos nicolaítas é, em essência, o surgimento do clericalismo e do movimento eclesiástico. Este apartar das verdades das Escrituras é bem definido nas palavras de W. Lincoln: "Com respeito a Deus, é o cessar de dar a Cristo o Seu devido lugar na igreja dos Seus santos, e também ignorar a presença do Espírito Santo. Ao invés disto, vemos no lado humano a dependência em algum indivíduo capacitado, e finalmente a predominância de um grupo, originalmente formada por tais indivíduos, responsáveis por liderar a adoração, etc." Isto explica a aversão específica de Cristo, pois Ele próprio é substituído. Dr. T. LaHaye, que é um pastor, escreve de forma reveladora: "A grande maldição do Cristianismo moderno é o eclesiasticismo. Quando os homens têm o controle do treinamento espiritual de outros, e estão numa posição para dominar a igreja, sua posição teológica irá eventualmente dominar aquela igreja. A história da igreja de Jesus Cristo é um círculo continuo de igrejas autônomas amalgamando em grandes convenções ou denominações de hierarquia eclesiástica que finalmente se tornaram apostatas" (Revelation - Ilustrated and Made Plain, T. LaHaye. Apocalipse - Ilustrado e Esclarecido). Em Éfeso vemos o surgimento do clericalismo através dos nicolaítas. Aquele que tem em Sua mão as sete estrelas e examina os sete candeeiros tem autoridade absoluta, e dificilmente irá delegar esta autoridade a homens que se auto-elegem, ou mesmo homens escolhidos pela igreja. Também podemos ver como as atitudes previstas para alcançar este domínio dos leigos surgiram primeiro, e depois seria desenvolvida a doutrina (v. 15) para justificá-la.
 
(Extraído do comentário RITCHIE – Apocalipse de James Allen
–>Publicado por Edições Cristãs E Sã Doutrina)
 

 

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