CAPÍTULO 1

Nada Para Ler…

Quão maravilhosamente verdadeira é a palavra que o Senhor falou a Moisés: “Terei misericórdia de quem Eu tiver misericórdia”. (Ex 33:19) Como autor destas páginas, meu desejo é registrar, para a glória de Deus que a mim mostrou misericórdia, os Seus caminhos de soberana graça.

Quando criança tive pouquíssimas oportunidades, mas uma grande sede por livros e por aprender. Certo dia comentei, perto de uma humilde senhora, o quanto ansiava por livros e, no entanto, nada tinha para ler.

— O quê, Charles? — disse ela — Você tem a Palavra de Deus bem ali naquela mesa e diz que não tem nada para ler?!

Ela não disse mais nada, mas aquelas palavras não puderam ser esquecidas. Foram usadas pelo Espírito para mostrar-me que eu não tinha um coração para Deus. Sem dúvida, aquilo me atingiu com muito mais força devido ao fato de eu ter já um bom conhecimento do texto da Palavra, embora contasse com apenas doze anos de idade. Naquele tempo a Bíblia era o livro de leitura usado na escola do povoado, da qual saí um ano depois e pela qual sempre fui grato.

A Conversão

Até então eu não tinha consciência da minha verdadeira condição de pecador perdido, e logo decidi tornar-me religioso. Esforcei-me tentando reformar minha conduta exterior, mas o que mais me surpreendia era que quanto mais eu me esforçava, pior me tornava. E foi assim por alguns meses. Naqueles povoados não havia ninguém que pudesse me indicar a obra completa de Cristo. Todos os que pareciam se importar um pouco mais com as coisas de Deus, estavam se esforçando para fazer alguma obra a fim de obterem a salvação. Devido à minha familiaridade com a letra das Escrituras, eu tinha certeza de que existia uma paz com Deus que não poderia obter por meio do meu esforço e de todas as minhas obras.

Após meses de lutas e angústias, estava voltando para casa durante uma noite escura e chuvosa, quando o fardo sobre minha alma tornou-se tão pesado que me prostrei ali mesmo no caminho e clamei:

— Oh Senhor, não posso seguir adiante!

Então, um profundo sentimento de que estava perdido pousou sobre minha alma. Foi ali, enquanto estava prostrado sozinho naquele caminho escuro, que o Espírito de Deus revelou à minha alma a obra completa de Cristo. Vi, então, que aquilo que eu em vão estava tentando fazer, já tinha sido feito por meu precioso Substituto sobre a cruz. Não me recordo de ter enxergado muito além disso, mas, como Israel no Egito, encontrei refúgio e segurança sob aquele sangue precioso. E, quando me levantei, não tenho dúvida de que era uma nova criatura em Cristo Jesus. Mas, embora nascido do Espírito, ainda tinha muito que aprender acerca do que era a minha carne.

Necessidade de Comunhão

Quando me converti, comecei logo a buscar a comunhão de outros cristãos. Uma pregação de quinze ou vinte minutos por semana era tudo o que tínhamos, e nada poderia ser mais desprovido de vida. No entanto, não me recordo de nenhuma pessoa que frequentasse a igreja do povoado e tivesse certeza de seus pecados terem sido perdoados. Às vezes ia a outras pregações e era bastante tocado, além de gostar de seus hinos e orações; mas sentia que suas mensagens não apresentavam a obra completa de Cristo, por meio da qual Deus havia trazido paz à minha própria alma. Além disso, fiquei, desde o momento da minha conversão, com um profundo sentimento da soberania de Deus, e logo senti que isto era sempre deixado de lado nas pregações. Agora posso compreender que aquilo que a nova natureza ansiava era a comunhão com os santos em separação do mundo.

A Primeira Pregação: João 3:16

João 3:16

Uma pequena reunião havia começado na vizinhança, e a pregação estava bem de acordo com aquilo que o Espírito Santo me havia ensinado naquela estrada escura. Uma obra de Deus em graça tinha ocorrido ali, e um bom número de almas foram convertidas a Ele. Isso aconteceu em Laughton, Yorkshire, no ano de 1835. Naquele mesmo ano, quando eu tinha 14 anos, aconteceu de o pregador faltar numa certa ocasião. Então o Senhor, pela primeira vez, abriu minha boca para falar do Seu maravilhoso amor para com um mundo perdido no pecado. Lembro-me de que o texto era Jo 3:16. Ao visitar aquele povoado mais de quarenta anos depois, pude encontrar um homem que ainda lembrava-se bem do sermão e da passagem usada.

Para mim é bem interessante recordar, após tanto tempo — cinquenta e três anos — que naquela primeira pregação apresentei o que Deus é para nós: “Deus amou… de tal maneira.” (Jo 3:16). Não se tratava, e não se trata , do que somos para Deus. Oh, se assim fosse, eu teria estado perdido mil vezes desde então. Não; se fosse este o caso — se eu tivesse pensado que minha salvação dependesse do que tenho sido para Deus — estaria perdido para sempre. No meu caso, nada menos do que um Salvador que fosse infinito poderia ser suficiente para meus pecados e para minhas necessidades.

os Primeiros Anos

Gostaria apenas de recordar aqui a maneira como Deus me educou e me preparou, como um vaso de misericórdia, para a Sua obra. Havendo ficado órfão aos quatro anos de idade, fui criado por um avô, um homem da mais estrita integridade. Creio que foi nessa época que vim a conhecer algo acerca do Senhor. Quando eu tinha uns sete anos de idade, já ganhava parte do meu pão trabalhando nos campos durante o verão, e no inverno frequentava a escola do povoado.

Aos onze anos, um distinto cavalheiro levou-me para sua casa e recebi dele, durante dois anos, uma excelente educação. Eu recebia pouco aprendizado por meio de livros, mas ele me fez aprender tudo o que podia ser aprendido pela observação; a horta, os estábulos, os deveres do mordomo, de tudo isso ele me familiarizou perfeitamente. Uma vez me dizia:

— Charles, dou a você três horas para caçar um corvo.

Outra, ele me dava como tarefa trazer um bando de perdizes. De vez em quando ele exigia uma resposta imediata a alguma pergunta difícil, como esta que fez na frente de um grupo de pessoas:

— Qual é a causa do eclipse solar?

Respondi:

— Se eu colocar minha cabeça entre esta lâmpada e a sua cabeça, você não verá a lâmpada, da mesma maneira como acontece quando a lua está entre nós e o sol.

Dentre outras coisas, às vezes eu tinha que atuar como capelão e ler um sermão na sala de visitas. Isso era feito com grande solenidade, numa época em que, embora ainda criança, Deus já começava a trabalhar em minha alma.

Seria preciso gastar muitas linhas para descrever, em todos os seus interessantes detalhes, como e porque deixei aquele cavalheiro. Parece que foi ontem que ele dirigiu-me seu último e longo conselho. Suas últimas palavras foram: “Charles, você poderá ser uma bênção ou uma maldição para a humanidade”. E, com certeza, não fosse pela graça de Deus, eu teria sido a última coisa. A Deus seja toda a glória! Estou bem certo de que Deus usou aquele homem tão gentil, durante aqueles dois anos, para o benefício de toda a minha vida posterior. Após deixá-lo, caminhei atravessando dois campos e, sentando-me sobre um degrau junto a um muro de pedra, chorei. Nunca mais o vi.

Trinta anos depois, senti-me guiado a voltar àquelas paragens para visitar o idoso mordomo, que agora já se encontra com o Senhor. Nunca havíamos nos encontrado ao longo daqueles anos. Um pouco pálido, ele me disse:

— É estranho; acabo de ler seu folheto “Mefibosete”, o mesmo que meu patrão me deu antes de morrer, quando também disse: “Thomas, pegue isto, e guarde-o com você. Por meio deste folheto Deus mostrou-me que estive errado durante toda a minha vida. Pensei que tinha uma grande coisa a fazer para Deus, mas agora vejo que tudo se encontra na bondade de Deus, graças a Cristo e ao que Ele fez por mim”.

Fico grato por poder acrescentar que o idoso Thomas também foi encaminhado ao Senhor e encontrou descanso em Sua obra consumada.

Mudança Para Sheffield

Após a minha conversão mudei-me para Sheffield, então uma cidade com cerca de 70 a 80 mil habitantes. Ali me tornei aprendiz de um cavalheiro que tinha uma loja de ferragens. Ele era também fabricante de limas. Tornei-me assim familiarizado com o comércio de Sheffield e com todas as classes de pessoas de sua população. Minhas diversas ocupações ajudavam-me a adquirir um bom conhecimento da natureza humana, mas, naqueles anos, Deus queria mostrar-me a total corrupção de minha própria natureza má. Trata-se de uma lição terrível, mas que deve ser aprendida. “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum.” (Rm 7:18) Isto é algo que deve ser aprendido.

A história completa e fidedigna das duas naturezas deve ser tratada como a história de duas pessoas distintas. A história da carne, com suas concupiscências, não iria servir para proveito de ninguém: individualmente cada crente já aprende pela história de sua própria carne que a salvação provém totalmente de Deus. Por esta razão, o que será registrado nas páginas seguintes é tão somente o que Deus fez em perfeita e maravilhosa graça.

Ao olhar para trás, para todos aqueles anos, fico surpreso ao ver que durante aquele tempo não fiz nenhum progresso no conhecimento das coisas divinas. Eu era muito interessado em pregações eloquentes, mas não aprendia nada. Na verdade, eu me encontrava em um estado de satisfação própria, e sentia-me como se já conhecesse tudo o que havia para ser conhecido. Em poucas palavras, eu nem fazia ideia da minha própria ignorância. Não me refiro aqui a qualquer área de conhecimento secular; era nas coisas divinas que não havia nenhum progresso. Na verdade, havia em mim a mais surpreendente ignorância do verdadeiro significado da Palavra de Deus. Eu pensava que o mundo (o mesmo mundo que rejeitou e entregou o Senhor Jesus à morte) estava melhorando depressa, e que nós cristãos éramos as pessoas que gradualmente o consertaríamos até que se tornasse um mundo convertido!

Ouvindo da Segunda Vinda de Cristo

Vou contar agora como foi destruída essa soberba e engano. Eu devia ter uns 23 anos de idade, e nessa época cuidava de uma pequena loja de utensílios no comércio de Sheffield. Certa tarde um vizinho entrou e, olhando-me seriamente, disse:

— Você já escutou as notícias?

— Não — disse eu — que notícias?

Ele respondeu:

— Há dois homens dando palestras no Salão de Conferências, e eles declaram que o mundo vai acabar, e que Cristo virá amanhã às quatro horas da manhã!

Virei-me de costas para ele, pois não podia deixar de rir. Ele insistiu para que eu fosse escutar a palestra naquela noite. Eu fui. O orador não disse nada acerca do mundo acabar na manhã seguinte, mas explicou sobre Mateus 24, e demonstrou, a partir daquele capítulo, a impossibilidade do mundo ser convertido antes da vinda do Senhor. Apesar de aquele homem professar muitas doutrinas falsas e provavelmente nem ser cristão, ainda assim Deus quis, por meio daquela palestra, despertar em minha alma um desejo sincero de conhecer a verdade quanto à vinda do Senhor.

Fiquei maravilhado diante de minha própria ignorância das Escrituras, e mal pude dormir. Além de mim, cerca de oito ou dez pessoas foram também despertadas a investigar. Nós nos reuníamos às cinco horas da manhã para examinar a Palavra. No entanto, nem fazíamos ideia do que era a igreja ou a vinda do Senhor para levar os Seus santos, mas estávamos ocupados com a vinda de Cristo para estabelecer o Seu reino na Terra.

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CAPÍTULO 2

Uma Sala Aberta Para a Pregação

Por volta dessa época, dois de nós abrimos uma pequena sala para a pregação do evangelho em Sheffield, na Duke Street. Naquela época o Capitão W. trabalhava no serviço de Cristo em Sheffield e, ao ouvir falar de nossa pequena reunião, nos chamou e perguntou se poderia pregar o evangelho em nossa sala. Nós consentimos alegremente. Ele nos apresentou a Pessoa viva de Cristo encontrando a pecadora junto à fonte de Jacó — encontrando-a do jeito que ela estava (Jo 4). Cristo não a evitou e nem mandou que ela fosse mudar seu caráter pecaminoso antes de poder conversar com ela, ou antes de poder salvá-la. Era o Filho de Deus dizendo a uma pobre pecadora: “Se tu conheceras o dom de Deus, e Quem é O que te diz — Dá-Me de beber, tu Lhe pedirias e Ele te daria água viva”. (Jo 4:10) Eu nunca havia escutado um pregador apresentar Jesus daquela maneira; mas descobri que se tratava do mesmo precioso Jesus que, numa noite chuvosa, me encontrou naquela estrada escura e trouxe paz à minha alma atribulada. O efeito daquela pregação, sem dúvida alguma, acompanhou-me sempre desde então. Tratava-se de uma revelação maravilhosa de como Deus pode encontrar — e encontra — o pecador.

Descobrindo Nossa Ignorância

Logo vimos que, por ora, ao invés de pregar, o que estávamos precisando era de um contínuo e detalhado estudo da Palavra de Deus. Durante oito meses lemos juntos a epístola aos Romanos e, naquele período, não li quase nada mais além da Palavra de Deus. Isso foi de grande bênção para mim. Devo, no entanto, relatar um incidente que ocorreu no início daquelas leituras. Como quase todo mundo falava dos erros do Capitão W., achei que ele devia possui-los; e, é até estranho dizer, por causa de minha própria ignorância, eu achava que as mais preciosas verdades que ele procurou nos apresentar eram erros. Desde aquela época tenho visto que é comum acontecer isto.

Naquele tempo eu não me considerava pouca coisa e punha grande confiança na lógica. Sendo assim, achei que o melhor que tinha a fazer era preparar certo número de silogismos apoiados nos pontos que julgava estarem errados. Logo tive uma oportunidade e, em resposta a uma pergunta daquele servo de Deus, desencadeei uma torrente de silogismos. Nunca vou me esquecer daquele olhar amável e piedoso, enquanto o Capitão W. colocava as mãos juntas sobre seus joelhos e, calmamente, lia o versículo seguinte. Naquele momento o Senhor mostrou-me quão tolo eu era, e toda a minha confiança na lógica desapareceu para sempre.

Uma Grande Mudança de Rumo

Chego agora a um acontecimento que mudou totalmente o curso do meu futuro desde então. Eu tinha ouvido falar que o Capitão W. e alguns outros cristãos se reuniam no primeiro dia da semana para partir o pão, como faziam os discípulos em Atos 20. Numa certa manhã do dia do Senhor fui ver o que aquilo poderia significar. Encontrei-os reunidos em uma sala no segundo andar, na Wellington Street, em Sheffield. Sentei-me atrás e, naturalmente, procurei pelo púlpito. Não havia um púlpito, mas uma mesa arrumada, ou coberta com uma toalha branca, e sobre ela o pão e o vinho, em comemoração à morte do Senhor Jesus.

Procurei então pelo ministro, ou pelo dirigente, mas não havia tal pessoa. Todos os crentes reunidos estavam sentados ao redor da Mesa do Senhor. Uma impressão profunda e solene caiu sobre mim: “Estas pessoas vieram encontrar-se com o próprio Senhor”. Não tenho dúvida de que foi o próprio Espírito de Deus Quem falou assim comigo. É impossível descrever a sensação que tive, pela primeira vez, de estar na própria presença do Senhor Jesus, em conformidade com Sua Palavra: “Porque onde estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, aí, estou Eu no meio deles.” (Mt 18:20). Eu estava tão inundado pela presença do Senhor que mal podia notar o que estava sendo feito. Ninguém pode fazer ideia do que isto significa, a menos que esteja realmente reunido ao Seu Nome.

Que contraste com tudo o que eu havia visto antes e, no entanto, quão simples! Era como voltar ao que era no princípio do cristianismo, antes que se tivesse ouvido falar de qualquer sacerdote oferecendo na igreja um sacrifício para vivos e mortos. Por mais estranho que me pudesse parecer aquela reunião de cristãos para partir o pão, o que mais me surpreendeu foi descobrir que era exatamente o que é encontrado nas Escrituras. Ao invés de um ministro à Mesa do Senhor, encontrei a mesma liberdade descrita em 1 Co 14:29-37. Eu ficava imensamente impressionado a cada adoração que era elevada diante do Senhor, em dependência do Espírito Santo. Senti que aquele era o meu lugar, por mais indigno que pudesse ser dele. Eu bem me lembro de haver pensado: “Este é o meu lugar, nem que seja para eu ser um capacho para estes cristãos limparem os seus pés”.

Reunido à Mesa do Senhor

Após algumas semanas fui anunciado como um que desejava obedecer ao Senhor; “Fazei isto em memória de Mim” (1 Co 11:24) e, por graça, tomei meu lugar à Mesa do Senhor, como um redimido para Deus. Certa manhã, pouco tempo depois, enquanto estávamos sentados em silêncio, experimentei algo que nunca tinha conhecido antes — a direção do Espírito de Deus. Veio como um amável sussurro do Senhor: “Leia 2 Coríntios, capítulo 1”. E pensamentos muito preciosos, sobre os versículos 3 ao 5, ocorreram à minha mente. Senti-me agitado, tanto assim, que o suor começou a correr pelo meu rosto e por todo o corpo. Havíamos estado sentados por algum tempo em silêncio. Senti-me guiado a levantar-me e ler, mas não tinha coragem para tanto. Após haver passado algum tempo, o Capitão W., que estava sentado do outro lado da sala, levantou-se e disse:

— Vamos ler 2 Coríntios capítulo 1.

E então ele ministrou exatamente os mesmos pensamentos que o Espírito havia colocado em meu coração. Foi assim que aprendi, pela primeira vez, acerca da direção do Espírito no meio de cristãos reunidos para Cristo. Isto tem acontecido com frequência ao longo desses muitos anos e irei relatar algumas dessas ocasiões. Não podemos ler o livro de Atos sem vermos que, após o Espírito Santo ter formado a igreja, Ele esteve realmente presente para guiar os servos do Senhor. Estou persuadido de que é nossa incredulidade que hoje tanto impede a Sua direção. Algo que fez com que eu fosse mais cuidadoso no falar foi a contínua descoberta de minha espantosa ignorância das Escrituras. Quanto mais a estudava, mais descobria minha ignorância. Suponho que seja sempre assim. Vou relatar como voltei a pregar o evangelho novamente, então com um sentimento cada vez mais profundo da minha ignorância.

Um Segundo Começo na Pregação

Um irmão em Cristo havia chegado de Ackworth. Antes de voltar para casa ele me disse:

— Tenho em meu coração a forte impressão de que você deve voltar comigo e pregar o evangelho em Ackworth.

— O quê?! — exclamei — Eu ir pregar? Não! Vou levar a vida inteira para desaprender o que está errado, antes de poder pregar o que está certo!

Mas ele respondeu com firmeza:

— Acredito que você pregará, e o Senhor irá abençoar a mensagem.

Tratava-se agora de algo bem diferente. Eu não ousaria duvidar que o Senhor pudesse abençoar a Sua Palavra. Depois de orar, fui, e desde então pude provar que o Senhor pode e quer abençoar a Sua Palavra.

Foi este, portanto, o segundo começo na pregação da Palavra, cerca de dez anos depois da primeira vez que preguei, quando era um garoto de 14 anos de idade. Naqueles dias, era raro o Senhor abrir meus lábios pelas cidades e povoados da Inglaterra sem que alguma alma se convertesse. Não que isso ficasse evidente na ocasião, mas pude encontrar os convertidos em todo lugar, dez, vinte, ou trinta anos mais tarde. Como não mantive um relatório, seria impossível mencionar em ordem cada uma daquelas pregações, leituras e conversas que tive durante quarenta e dois anos, em Sheffield, Rotherham, e nos povoados dos arredores; em Hull, York, Wakefield, Scarborough, Malton, Whitby, Redcar, Newcastle e arredores; em várias partes da Escócia; em Manchester, Rochdale, Oldham, Bury, Southport, Liverpool, Llandudno, Stafford, Gnosall, Wolverhampton, Birmingham, Leamington, Banbury, Swindon, Londres e arredores; pelo condado de Kent, em Cheltenham, Malvern, Worcester, Gloucester, Bristol, Clifton, Bath, Taunton, Exeter, Torquay, Plymouth. E depois nos condados ocidentais: em Ipswich, Colchester, Needham Market, Stowmarket, Bury St. Edmunds, Norwich, Grimsby, etc., etc.

CAPÍTULO 3

Pregador e Homem de Negócios

Alguns poderão perguntar como pude pregar toda a minha vida em tantos lugares, e prover o suficiente para minha família. Bem, descobri que não há nada difícil demais para o Senhor. Devo dizer que nunca deixei meus negócios até o Senhor ter-me dado o suficiente para viver; mas meu costume era o de pregar três ou quatro vezes por semana, às vezes mais, e trabalhar o resto do tempo. Na verdade, era comum, após um dia de trabalho viajando a negócios às minhas próprias custas, achar-me, com o Senhor, pregando a Palavra. Com frequência Ele ajudava-me de modo bem extraordinário. Darei dois exemplos de ocasiões em que me senti grandemente necessitado de Sua ajuda.

O Caso do Esmeril

Na época em que eu mantinha uma loja de ferragens e utensílios no comércio de Sheffield, dispunha de apenas um pequeno capital, mas não desejava ter mais do que já possuía. Na verdade, eu havia aprendido que o Senhor toma um cuidado especial dos pequeninos que dependem dele.

Certa ocasião, após ter ficado ausente pregando até quase metade de meu horário de trabalho, estava eu em minha loja, andando de um lado para o outro, pensando em uma conta que tinha para pagar na segunda-feira seguinte. Eu entendia que um cristão precisa sempre pagar todas as suas dívidas, mas naquele momento eu não tinha o dinheiro e nem sabia de onde tirá-lo. Elevei meu coração ao Senhor em oração a respeito daquilo e, imediatamente, me veio à mente um grande estoque de esmeril; eu tinha muitas barricas cheias deles, que não conseguia vender. Falei ao Senhor sobre o estoque de esmeril. Ele me disse: “Lançai a rede para a banda direita do barco.” (Jo 21:6). Perguntei, “Senhor, qual é o lado direito do barco?” Imediatamente me veio o pensamento de que é Ele o lado direito — ou o lado certo — do barco. Pedi então ao Senhor que vendesse o esmeril para mim, já que eu não conseguia fazê-lo e o montante da venda seria exatamente o que necessitava. Enquanto estava em oração, um homem entrou em minha loja e perguntou:

— Você tem esmeril para vender?

— Sim, tenho — respondi; e fui buscar uma amostra do grande estoque que tinha, colocando-a em suas mãos.

— Sim — disse ele— este é exatamente o que desejo; quantos você tem?

Disse a ele o número de barricas (em toda a minha vida eu não havia vendido nem um vigésimo daquela quantidade); e ele disse:

— Vamos ficar com tudo pelo preço que pediu; envie para nossa firma amanhã. Costumamos pagar por tudo o que compramos na segunda-feira de manhã.

Eu disse:

— Farei o que me pede; mas, diga-me, como foi que você veio até aqui e para quê precisa deste tipo de esmeril? Tentei vendê-lo e não o consegui em lugar nenhum; na verdade, estava mesmo para devolvê-lo ao fornecedor, pois me foi enviado por engano.

Ele respondeu:

— Foi um amolador quem me disse que você teria uma boa quantidade para venda, e nós precisamos muito deste tipo, portanto vim vê-lo. É bem provável que você não consiga vendê-lo a outro, pois somos a única indústria que usa este tipo em particular: nós os usamos para amolar serras para exportação.

Enviei o estoque, e recebi exatamente o dinheiro de que necessitava.

Deus Cuidando dos Negócios

Darei outro, dentre as centenas de exemplos do cuidado do Senhor; e então voltarei a falar da Sua obra. Anos depois do caso anterior, quando eu era um comerciante de Sheffield, abastecendo firmas de exportação em Birmingham, Wolverhampton, Londres, Liverpool, e Glasgow, estive viajando por três dias — e pregando à noite — sem receber nenhuma encomenda. Aquilo era uma provação para mim. Estava caminhando por certa rua de Birmingham, orando para que o Senhor me dirigisse a um estabelecimento onde eu pudesse receber uma encomenda de produtos, quando senti claramente que deveria caminhar na direção exatamente oposta à do estabelecimento ao qual havia chegado. Fui e encontrei-me diante de uma porta com uma pequena placa ao lado — “H. & G.” — que não dizia com que trabalhavam. Espiei para dentro do estabelecimento e, pelo que consegui enxergar, disse: “Ora, Senhor, esta é uma loja de couro. Não tem nada a ver com o meu ramo!” Mas o Espírito de Deus parecia dizer-me: “Siga em frente!” E fui. Abri a porta da loja e encontrei alguns homens trabalhando com couro. Apresentei meu cartão e perguntei pelo proprietário. Fui levado ao escritório, onde encontrei o Sr. H. e perguntei se estavam necessitando de artigos de Sheffield para exportação, por exemplo, para a Austrália, uma vez que havia uma grande demanda para aquelas colônias. Ele fitou-me com certa surpresa, e perguntou:

— Você fornece artigos para Melbourne?

— Sim — respondi, e enumerei várias firmas para as quais eu fornecia. Abrindo o livro de pedidos que fora trazido por um funcionário, ele perguntou:

— Por acaso você fornece para R. & Sons?

— Certamente — respondi.

— Bem — disse ele — isto é muito estranho. Somos comerciantes exportadores de peles e um de nossos clientes em Melbourne acaba de nos enviar um pedido de ferramentas que são feitas em Sheffield. Nós não entendemos nada desse ramo, mas o pedido traz também alguns dos números e preços dos nossos produtos, que alguém deve ter enviado a eles.

Então ele deu ordem ao funcionário para que escrevesse um pedido para minha firma, que atingiu algumas centenas de libras. Aquele foi o início de uma conta das maiores e mais satisfatórias que já tive, e com um estabelecimento dos mais honestos e honráveis.

A que podemos atribuir tudo isso, exceto ao terno cuidado daquele que escuta as orações e as responde? A história desse amor sempre vigilante, mesmo nas coisas temporais, encheria todo um volume.

O Lanche Perdido

Desde criança fui levado a crer que Deus escuta e responde nossas orações. Isto pôde ser visto em um incidente ocorrido logo após a minha conversão. Eu estava em um campo, a quase quatro quilômetros de casa, e havia colocado meu lanche sobre uma cerca. Um potro derrubou meu lanche e o destruiu, exceto um pequeno pedaço de pão. Minha pederneira e a mecha* também foram perdidas, impedindo que eu acendesse um fogo naquele clima frio de inverno. Ajoelhei-me e orei por fogo, e também para que o Senhor fizesse com que o pão fosse suficiente para meu jantar. Encontrei a pederneira e, caminhando pelo campo, logo achei a mecha. Juntei algumas folhas secas e madeira podre, e logo tinha uma fogueira. Então me sentei e, se o Senhor multiplicou meu pão, ou fez com que este me alimentasse o necessário, eu não sei; mas certamente fiquei tão fortalecido e satisfeito como se tivesse comido o melhor dos jantares. Muitos podem sorrir ao ouvirem isto, mas, de minha parte, tão somente rogo que todos nós possamos ter mais daquela fé de criança, que espera e então desfruta das respostas à oração. Jesus diz: “na verdade, na verdade vos digo que tudo quanto pedirdes a meu Pai, em Meu nome, Ele vo-lo há de dar.” (Jo 16:23). Senti-me grato pela necessidade que me deu a oportunidade de pedir e receber.

[Nota: * Pederneira e mecha: instrumentos usados para acender fogo quando ainda não havia fósforos.]

Guiado Pelo Senhor

Saí um pouco do assunto, mas me alegra pensar no amoroso cuidado de Deus. Desde aquela primeira visita a Ackworth, há cerca de quarenta e três anos, fui guiado a ir sempre onde quer que o Senhor me enviasse, em dependência àquilo que Ele poderia, e iria, fazer, por meio do Espírito Santo, para bênção das almas. Não vou relatar tanto o que podia ver na ocasião; mas para o encorajamento dos servos do Senhor eu diria que raramente visitei um lugar, vinte anos após haver pregado, onde não tenha encontrado algum fruto para o louvor do Senhor.

Alguns podem estar prontos a perguntar o que quero dizer com ir aonde quer que o Senhor me enviasse. Vou tentar citar alguns poucos casos, dentre muitos. Havia descido a Hull para fazer algumas cobranças. Naquela ocasião eu estava sozinho em uma breve viagem de negócios e, por estar certo de que iria receber as cobranças, não levei dinheiro. Encontrava-me, às onze horas de uma manhã de sábado, em uma reunião para oração e leitura da Palavra junto com alguns cristãos de diferentes localidades e, enquanto líamos, o Espírito de Deus pôs em meu coração que deveria ir a Scarborough para pregar. Fui para uma sala onde pudesse ficar só e busquei o Senhor em oração, a fim de certificar-me de Sua vontade sobre aquele assunto. Ele deu-me uma clara certeza de que deveria ir.

Seria, na época, uma longa jornada passando por York e eu não tinha dinheiro para a passagem. Mas o Senhor já sabia disso. Peguei minha mala e avisei àqueles com quem me havia hospedado que me sentia claramente chamado para ir a Scarborough. Porém — e não disse isto a ninguém — eu nunca tinha estado naquela cidade e conhecia o nome de apenas uma pessoa lá. E não tinha dinheiro para pagar a passagem. Mas quando Deus dá fé, é fé mesmo. Saí da casa e caminhei até quase chegar à bilheteria da estação ferroviária, quando A. J. gritou atrás de mim:

— Acabamos de ouvir que você está sentindo-se guiado a ir a Scarborough para pregar amanhã. Um irmão, o Sr. H., deseja ter comunhão com você e enviou isto (acho que eram 3 libras) para pagar suas despesas.

A Viagem a Scarborough

No caminho tivemos uma leve colisão, exatamente no canto do vagão onde me encontrava, o qual acabou tendo sua parede atravessada. Exceto pelo susto, nenhum de nós saiu ferido. Achei que aquilo era seguramente um sinal de que o Senhor desejava que eu falasse a Palavra a alguém. Comecei a conversar com um jovem que estava, presumia eu, voltando para casa para morrer de tuberculose. Encontrei-o bem angustiado acerca de sua alma, mas ele achava que precisava fazer uma grande obra para poder ser salvo. Creio que Deus abençoou a mensagem que chegou à sua alma. “Está consumado” foi uma nova e maravilhosa verdade para ele. Ao nos aproximarmos de Scarborough, sua mãe, que o acompanhava, já estava tão maravilhada com o gozo e paz de seu filho, que rogou que eu fizesse de sua casa o meu lar enquanto estivesse ali. Agradeci muito a ela, mas disse que não poderia, já que tinha acabado de fazer um pedido ao Senhor que me impediria de aceitar o seu convite. Como eu só conhecia o nome de uma pessoa em Scarborough, eu tinha pedido ao Senhor que o trouxesse à estação e me mostrasse quem ele era.

Finalmente o trem parou. Um cavalheiro se aproximou, e olhou para mim demoradamente. E o Senhor me disse: “É ele”. Desci do vagão, mas ainda hesitei em lhe falar. Ele continuou a olhar-me. Pensei em quão tolo eu havia sido em orar e não crer, portanto dirigi-me a ele:

— Permita-me perguntar-lhe se seu nome é Sr. L.?

— Sim, é — respondeu ele — e seu nome deve ser Stanley, de Sheffield?

— Sim — respondi— mas como você sabe o meu nome?

— O Sr. J., de Hereford, estava sendo esperado neste trem para pregar amanhã; e este é o último trem e não há outro pela manhã. Já estava me sentindo desapontado quando meus olhos pousaram em você, e foi como se uma voz me dissesse, “Aquele é Stanley, de Sheffield: Eu o enviei”.

Ele cuidou para que eu tivesse uma calorosa recepção e bastante gente reunida pela manhã. Quando se prega a Cristo, trata-se de algo muito abençoado sentir a certeza de ter sido enviado por Ele. Evidentemente tive aquela segurança no dia seguinte.

Chamado a Pregar Num Navio

Pouco tempo depois, eu estava novamente em Hull, tendo pregado no dia do Senhor. Encontrava-me sentado com o Sr. A. J. após o jantar, quando senti um chamado distinto para pregar em um navio. Contei ao Sr. J. e ele me disse:

— Há um vapor mercante que sai amanhã às duas ou três horas — (não me lembro da hora exata) — e estará cheio de comerciantes.

Senti-me seguro de que estava sendo chamado a pregar a bordo naquele dia. Portanto, peguei minha mala, e o Sr. J. foi comigo para mostrar-me o caminho. Naquela época não existia uma plataforma apropriada para o vapor atracar e, quando eu estava subindo pela prancha que ia do píer ao navio, este, repentinamente, moveu-se um pouco, fazendo com que a prancha caísse na água e eu ficasse dependurado na amurada do navio. Alguém deu um alto grito e acabei sendo puxado a bordo, enquanto todos se emocionavam com o ocorrido. Quanto a mim, fiquei completamente arrasado. Numa condição assim tão débil, busquei ao Senhor em oração para que Ele me fizesse voltar o ânimo e me arranjasse algum ajudante a bordo. Andei em oração pelo convés cheio de gente e, enquanto andava, vi um homem sentar-se. O Senhor mostrou-me que aquele seria o que me ajudaria. Parei e perguntei se ele era cristão.

— Sim — respondeu — por misericórdia eu o sou.

Perguntei:

— Você tem fé? — Contei-lhe então como o Senhor havia me enviado a pregar a bordo, o quão abalado e fraco eu estava, e como tinha orado ao Senhor por um ajudante. Ele levantou-se de um salto e disse:

— Fé e ação, homem! — e saiu correndo.

Foi aí que me senti pior ainda. Como é estranha a maneira como o Senhor prepara os Seus servos para a Sua obra. Eu tinha chegado ao ponto de humilhação adequado para poder ser usado pelo Senhor, quando o homem voltou com o rosto radiante:

— Está tudo pronto — disse ele.

— O que é que está pronto? — perguntei.

Ele respondeu:

— Consegui a permissão do capitão, e algumas pessoas já estão prontas para cantar um hino.

Ele sugeriu o hino que passou a ser cantado de coração. O Senhor deu-me, então, forças para pregar o evangelho durante toda a viagem, quase até Thorne, que na época era o nome daquele lugar. À medida que o barco ia fazendo as suas escalas ao longo do percurso pelo rio, as pessoas continuavam a embarcar e a desembarcar. Na época não fiquei sabendo de uma só alma que pudesse ter sido salva naquele dia. Eu preguei a tarde toda, até à noite.

Um Sermão de Cinquenta Quilômetros

Muitos anos depois, quando já havia quase me esquecido daquela experiência, ao terminar de pregar em Birmingham, um cavalheiro aproximou-se e disse-me:

— Ouso afirmar que você não se lembra de mim.

E realmente eu não me lembrava dele.

Ele perguntou:

— Você se lembra de haver pregado um sermão de cinquenta quilômetros de comprimento?

Respondi que não me lembrava.

— Bem — disse ele — Você se lembra de ter pregado subindo o rio, de Hull a Thorne, por uma distância de cinquenta quilômetros ou mais?

Então me veio à lembrança claramente. Ele era agora um ministro wesleyano, e disse-me:

— Há muito que desejo vê-lo.

Tinha sido ele quem havia me ajudado tão gentilmente naquele dia. Contou-me que, depois daquilo, estabeleceu-se em Selby e visitou as diversas cidades e povoados ao longo do rio, onde o vapor fazia suas paradas, encontrando pessoas que haviam sido salvas naquele dia subindo o rio. Dessa forma, depois de muitos dias o Senhor nos dá prova do que diz: “Assim será a Palavra que sair da Minha boca: ela não voltará para Mim vazia, antes fará o que Me apraz, e prosperará naquilo para que a enviei.” (Is 55:11). Oh, poder pregar com total certeza de que as almas serão salvas!

Que gozo será na presença do Senhor, em Sua vinda, podermos ver os milhares (quem sabe?) de almas que foram levadas a Ele, pelas riquezas da Sua graça, por meio de Seus fracos servos! Oh, quão profunda a misericórdia, que não somente nos salvou do inferno, mas que nos usa como canais de misericórdia para outros. O apóstolo podia dizer: “Porque, qual é a nossa esperança, ou gozo, ou coroa de glória? Porventura não o sois vós também diante de nosso Senhor Jesus Cristo em Sua vinda?” (1 Ts 2:19) Que eu saiba, nunca vi nenhum desses queridos filhos ao longo do rio. Sem dúvida, a esta altura, após tantos anos, muitos deles já estão com o Senhor. Devo encontrá-los na glória, que já está tão próxima.

CAPÍTULO 4

Um Capitão Aleijado

Lembro-me bem de um incidente, acontecido na época, que poderá encorajar muitos pais à oração. Mais de setenta anos antes, uma mãe piedosa havia entregado seu bebê ao Senhor, na fé de que a criança seria convertida e iria encontrá-la nas alturas; e foi nessa sua fé que ela partiu, para estar ausente do corpo, mas presente com o Senhor. Por setenta anos não houve um sinal de que a oração tivesse sido respondida.

A criança cresceu, tornando-se um homem negligente e ímpio, um capitão do exército. Ambos os seus calcanhares haviam sido arrancados pelo estilhaço de um morteiro. Agora ele estava velho e aleijado. Foi levado para ouvir a Palavra, tendo sido carregado para dentro da sala lotada. Naquela noite o Espírito guiou-me a pregar sobre “Mefibosete”. Descrevi a completa perdição do pecador, sua condição de aleijado, e a bondade de Deus demonstrada em Cristo, não somente por haver entregado a Cristo para morrer pelos nossos pecados, mas por buscar o pobre pecador, tal como está, para levá-lo à Sua própria presença, do mesmo modo como Davi ordenou que se buscasse a Mefibosete, que era coxo de ambos os pés. E continuei, dizendo:

— Agora, você pobre e velho pecador aleijado, você foi trazido para a presença de Deus esta noite; onde está você?

O velho capitão sentiu que era Deus falando com ele; que era Aquele que sabia tudo a seu respeito e, tentando se levantar, gritou:

— Estou aqui!

Deus salvou sua alma naquela noite, respondendo, assim, às orações de uma mãe; todavia Ele o fez à Sua própria maneira e no Seu devido tempo. Foi agradável ver aquele querido capitão regozijando-se em Cristo Jesus e sentando-se à mesa do Rei como um filho do Rei, “e ele era coxo de ambos os pés”. (Leia 2 Sm 9, em conexão com esta história da graça de Deus.).

Chamado a Scarborough

Numa noite de sábado, estávamos tendo uma pequena reunião de oração quando recebi um chamado bem claro de que deveria voltar novamente a Scarborough no dia seguinte para pregar. Fui para casa, mas, nessa ocasião, minha querida esposa não achava que era da vontade do Senhor que eu fosse. Pedi ao Senhor que, se fosse a Sua vontade, Ele nos desse, a ambos, o mesmo pensamento a respeito. Após orar, fui para a cama e adormeci. Às duas horas da madrugada achei-me em pé, com o Senhor me dizendo: “Você deve ir a Scarborough”. Acordei minha esposa e agora ela tinha o mesmo pensamento. Preparei, em silêncio, um breve café da manhã e caminhei até à estação. Havia um trem com destino a York e embarquei nele pela fé. Depois de esperar um pouco em York, descobri que havia, naquela época, um trem para Scarborough no dia do Senhor pela manhã. Cheguei lá por volta das nove horas. Achei melhor não chamar ninguém até que chegasse a hora em que alguns cristãos iriam se reunir para, em conformidade com as Escrituras, partir o pão em nome do Senhor Jesus.

Andando pela praia, vi G. A. caminhando devagar, cabisbaixo. Fui atrás dele e, colocando a mão em seu ombro, cumprimentei-o:

— Como vai?

— Bem — respondeu ele virando-se para mim. — Isto até parece ser uma repreensão: O Sr. B. foi chamado repentinamente para um funeral em Londres, justamente hoje, quando haverá um grande grupo de pessoas no salão de reuniões à noite. Estava sentindo-me triste por pensar que não haveria ninguém para pregar, e agora o Senhor enviou você!

Aqueles que nunca experimentaram esse tipo de direção tão precisa não podem ter nem ideia da solenidade que traz.

A Maleta do Senhor

Naqueles dias havia outro fator que dava grande motivação à pregação do evangelho e concedia o enorme prazer de se poder desbravar um novo terreno. É que, como sucede ainda hoje, era frequente ir a uma cidade ou povoado onde raramente se encontrava uma alma que desfrutasse da certeza da redenção eterna. Se perguntássemos o significado de Hebreus 10:2-14, não eram capazes de responder. E ainda hoje, mesmo aqueles que são cristãos genuínos não têm muito mais do que uma esperança de que serão salvos. Assim sendo, quase sempre se pode encontrar almas vivendo sob a lei e, portanto, escravizadas. Era minha alegria poder ir por toda a Inglaterra pregando o completo evangelho de Deus.

Eu não era, de modo algum, rico nos bens desta vida, mas, mesmo assim, sempre tive meios para ir e pregar aonde quer que o Senhor me enviasse. Talvez o leitor deseje saber como isto podia acontecer. Eu direi. Eu tinha uma maleta que eu chamava de maleta do Senhor. Qualquer coisa que me fosse dada pelo povo do Senhor para as despesas de viagem era colocada naquela maleta e, por todos aqueles anos de trabalho no evangelho, nunca consegui alcançar o fundo dela. E assim foi, até que o Senhor me deu o privilégio ainda maior de Atos 20:35.

Relatarei agora como o Senhor iniciou a Sua obra em diversos lugares, embora sejam apenas alguns poucos exemplos tirados dentre muitos.

Um Funeral Católico

A cidade de York esteve em meu pensamento por alguns meses e com frequência eu havia buscado o Senhor em oração acerca disso. Certo dia eu retornava para casa, vindo de Scarborough, e dispunha de quase três horas para esperar uma conexão em York. Ao caminhar por uma ponte, elevei meu coração em oração e pedi ao Senhor que, se fosse Sua vontade, eu pudesse pregar a Palavra ali; e que Ele me conseguisse uma audiência naquele dia. Enquanto estava em oração vi uma grande multidão contornando o castelo. O Senhor me disse: “Siga aquela multidão”. Descobri que estava para acontecer o funeral de alguma autoridade católica. Caminhamos até próximo a um amplo galpão, quando começou a chover e as pessoas correram para o galpão que ficou lotado. Senti que era a vontade do Senhor que eu me dirigisse à parte da frente do galpão. Abri minha Bíblia e li as palavras: “Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor.” (Ap 14:13). Um grupo bem grande de pessoas aproximou-se, ficando de frente para mim. Algumas centenas escutaram a Palavra com visível atenção. Os católicos romanos pareciam pensar que eu era um deles e se acotovelavam para achar um lugar mais próximo de mim. Fui guiado a tratar primeiro da bem-aventurança daqueles que agora dormem em Cristo. Não fiz referência à que época o texto se aplica; mas expliquei de uma maneira geral o quão bendita é a alma que parte deste cenário para estar com o Senhor. Então mostrei que a Palavra não diz: Bem-aventurados aqueles que morrem na igreja Católica Romana ou nas igrejas Protestantes, mas NO SENHOR. Isto causou certa agitação e, então, uma atenção ainda maior, enquanto eu procurava mostrar nas Escrituras o que é estar “no Senhor”.

Quando terminei, um homem perguntou-me, em alta e clara voz, que todos puderam escutar:

— Terei entendido você dizer que um homem pode saber ainda nesta vida que está salvo e que tem vida eterna?

Aquela pergunta, e a resposta que se seguiu, pareceu ter um grande efeito sobre muitos, à medida que eu mostrava, nas Escrituras, que é um privilégio de todos os que creem saber que estão justificados de todas as coisas e têm paz com Deus. Pois a Palavra diz: “Seja-vos pois notório, varões irmãos, que por Este se vos anuncia a remissão dos pecados. E de tudo o que, pela lei de Moisés, não pudestes ser justificados por Ele é justificado todo aquele que crê.” (Atos 13:38,39). Se cremos em Deus, como poderemos duvidar do que Ele diz: “Seja-vos notório”? Outras passagens foram citadas e, tão logo terminei minha resposta, o dirigente do funeral aproximou-se de nós, estando cerca de duas horas atrasado. Não vamos dizer que aquilo tudo tenha sido estranho, pois não o seria se andássemos mais na fé.

os Sinais dos Tempos

Pouco tempo depois, senti-me guiado a ir pregar em York, no grande espaço do mercado, que é chamado de Pavimento. Coloquei um pequeno cartaz, “Palestra Sobre os Sinais dos Tempos”. Isso foi na época da agitação política a favor do voto, bem no auge da crise. De algum modo espalhou-se uma notícia de que eu era um político pertencente ao partido extremista que advogava o sufrágio universal, e que tinha vindo para incitar a cidade à revolução. O prefeito mandou me buscar e, como eu fosse apenas um cristão que não pertencia a nenhuma denominação, ele ficou sem compreender e concluiu que o boato era falso. Ainda assim, achou melhor fazer-me acompanhar de uma grande força policial para manter a ordem. Isso causou um imenso afluxo de pessoas que encheu todo o mercado. Eu estava muito fraco e quase tive que ser ajudado quando subi numa cadeira para falar.

É algo solene pregar para alguns milhares de almas, todas elas devendo passar em breve para a eternidade. Frisei bem o juízo vindouro das nações existentes, por ocasião da vinda gloriosa de Cristo. Então mostrei aos cristãos como o Senhor virá antes e os levará para Si (João 14:1-3; 1Ts 4:13,18). Naquela época, na cidade de York, isso tudo era uma grande novidade. E a pregação prosseguiu até que o céu se escureceu e foi-se formando um temporal com raios e trovões. Com um cenário assim, aquela acabou sendo uma noite inesquecível para muitos.

Eu deveria ter contado que ouvira falar de um cristão chamado S. e, embora desconhecido dele, fui à sua casa antes da pregação e perguntei-lhe se me permitiria usar sua casa para pregar a Cristo às dez horas daquela noite. Ele olhou-me meio surpreso, mas consentiu. A pregação no mercado terminou um pouco antes das dez e então convidei a todos os que estivessem angustiados, ou que desejassem conhecer mais sobre o assunto, para que fossem comigo à casa daquele irmão. A maior capela da cidade teria ficado cheia. A pequena casa ficou lotada, e nos estendemos até à meia-noite.

Naquela noite o Senhor havia enviado o Seu servo, o agora já falecido T. S., de Leeds, para trabalhar em York. Ele chegou tarde, foi para o lugar onde ficaria hospedado e não ouviu falar coisa alguma acerca de nossas reuniões. Na manhã seguinte, bem cedo, o Senhor o guiou àquela mesma casa; e ali a obra começou, sendo também ali estabelecida a mesa do Senhor na cidade de York. Logo a obra cresceu e o Senhor enviou o Seu querido servo, o também já falecido W. T.

CAPÍTULO 5

A Volta do Senhor

Não muito tempo depois fiz minha primeira visita a Southport. Naquela época era um lugar relativamente pequeno. Por ocasião da minha chegada, um sério acidente — e se me recordo corretamente, um acidente fatal — havia ocorrido nas dunas. Fiquei fortemente movido a pregar o evangelho nas dunas, mas o povo estava espalhado por todos os lados na extensa praia. Falei, no entanto, a um homem, e descobri que era um crente. Pedi que permanecesse ali enquanto eu lia uma passagem da Palavra de Deus. Ele assim fez. Subi em uma pequena elevação de areia, onde hoje está o passeio público. Enquanto vacilava para poder começar, fiz um pequeno buraco na areia e coloquei os pés dentro dele. Quando comecei a ler o capítulo, pessoas vieram de todos os lados para ouvir.

Após a pregação anunciei uma palestra sobre a “Segunda Vinda do Senhor” e tivemos, segundo nos disseram, duas mil pessoas para escutar a Palavra em um amplo vale de areia, a meio caminho de Church Town. Logo após começar, notei que um homem de idade avançada veio se aproximando por entre o povo e sentou-se na areia bem na minha frente. Pouco depois ele se levantou de um salto, permanecendo ali maravilhado e extasiado. Seu nome era J. H., de Church Town, e já faz muito tempo que partiu para estar com o Senhor, embora ainda exista quase uma colônia de descendentes seus morando naquele lugar. O Senhor havia despertado aquele querido cristão em um local tão improvável como aquele. O Espírito Santo tinha aberto seu entendimento para compreender as Escrituras e para aguardar o Senhor Jesus vindo do céu. Como na parábola das dez virgens, há muito que a igreja dormia ao redor desse irmão. Deus ensinou muitas outras verdades preciosas ao Seu idoso servo, como aquela que trata da cristandade apostatando de sua vocação celestial.

Após ter permanecido só por muitos anos, ele foi intensamente tentado. Ele estivera orando fervorosamente ao Senhor para que enviasse pelo menos um de Seus servos para confirmá-lo na verdade. Um jovem lhe contara a respeito da palestra e o trouxera para ouvi-la. Mas quando ouviu, pela primeira vez, a bendita verdade da volta do Senhor, exatamente como o Espírito lhe havia ensinado, quase não podia conter-se de tanto gozo. E foi assim que começou aquela obra que resultou em cristãos sendo reunidos ao Senhor Jesus em Church Town e Southport. Sim, naqueles dias muitas almas passaram da morte para a vida nas areias de Southport e ao ar livre em Church Town. Ao Deus de toda a graça seja toda a glória.

Enquanto estava envolvido em tal serviço, meu Deus e Pai achou por bem e necessário me afligir. Posso verdadeiramente dizer: “Foi-me bom ter sido afligido, para que aprendesse os Teus estatutos”. (Sl 119:71) Por diversas vezes tive graves e repetidas hemorragias dos pulmões, até chegar à beira da morte pela tuberculose. Passei um inverno em Torquay em 1850 e poucos achavam que eu voltaria vivo. O Dr. T. disse-me que um pulmão tinha se acabado quase que totalmente e que eu dificilmente conseguiria viver no norte; mas que poderia, como um inválido, viver no sul. Houve muita oração por toda a Inglaterra e o Senhor ouviu e respondeu; e por 37 anos desde então tenho sido fortalecido para pregar a centenas, às vezes milhares, de pessoas, usando somente um pulmão.

Lydia

Quando era incapaz de pregar a grandes multidões nas cidades, o Senhor me dava grande gozo e bênção no trabalho nos povoados. Darei aqui um exemplo. Uma humilde viúva convidou-me para ir à sua casa em W.-on-D. Fui, e ela pediu a alguns cristãos professos que fossem me encontrar. Eles estavam seguros de não haver necessidade de nenhuma pregação em W., mas, segundo eles, a alguns quilômetros havia um povoado bastante carente, habitado por rudes oleiros e trabalhadores das minas de carvão. Imediatamente veio-me a certeza de ser aquele o lugar onde deveria pregar. Fui e preguei numa casa ali naquela tarde e noite. Doze meses depois me senti guiado a voltar lá. Devo dizer que, com frequência, vejo como é importante ser guiado exatamente ao lugar certo do povoado, especialmente quando se prega pela primeira vez em uma localidade. Naquela ocasião fui dirigido a ficar exatamente de frente para a pequena casa de W. M. O nome de sua esposa era Lydia. É claro que eram todos estranhos para mim. Aquelas pessoas eram, naquele tempo, totalmente avessas àquilo que chamavam de dissidentes e, suponho, não teriam andado vinte metros para me ouvir.

Eu estava falando sobre a purificação do leproso (Lv 14). Lydia estava passando pelo jardim de sua casa quando me escutou dizer: O passarinho é solto. Isto despertou sua curiosidade e ela aproximou-se do portão para saber de que passarinho eu estava falando. Ela ouviu com grande atenção, enquanto aprendia que um pássaro apontava para a morte de Jesus por causa dos pecados dela; enquanto o outro era mergulhado no sangue do pássaro que fora morto e, após o sangue ser espargido sobre o pobre leproso, o pássaro era solto para voar, mostrando que o leproso estava limpo. Ela ouviu que isso mostrava como Deus declara, pela ressurreição de Jesus, a nossa justificação; ela ouviu que se o passarinho fosse solto o leproso estaria limpo. Se Jesus, nosso Substituto, que morreu por nossos pecados, está ressuscitado, nós, crendo em Deus, somos justificados de todas as coisas. Lydia nunca antes soubera o que a ressurreição de Jesus tinha a ver com a nossa justificação; e ficou imensamente cativada. Ela não pôde deixar de ouvir novamente naquela noite.

Lydia se converteu, ou talvez, como uma alma despertada, encontrou paz. Ela e toda a sua família, desde sua idosa mãe já com mais de oitenta anos, até seu neto com cerca de quatro anos, foram salvos. Tivemos pregações ali por sete dias do Senhor, quando, então, a mesa do Senhor foi estabelecida na casa de Lydia, continuando ali por muitos anos, até ser mais tarde removida para W. Foram treze pessoas que se reuniram pela primeira vez para obedecer ao Senhor no partir do pão. Isto me traz à memória uma das mais marcantes demonstrações da graça do Senhor como jamais presenciei. Aconteceu no mesmo povoado alguns anos depois.

Pregação na Olaria

Certa noite tivemos uma pregação do evangelho na Olaria, logo depois do fim da jornada de trabalho. Foi feita em um dos grandes galpões, chamado de Sala de Modelagem. Certo número de trabalhadores das minas também tinha vindo, logo após terem saído dos túneis. Era um grupo de aparência estranha, alguns brancos como trabalhadores de moinhos de trigo, e outros negros como limpadores de chaminés. Foi uma pregação bem calma, tendo a Palavra sido pregada apenas com esperançosa fé; e havia um sentimento profundamente solene em todo aquele grupo.

No final, repeti os versículos das Escrituras, vagarosamente: “na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a Minha palavra, e crê naquele que Me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas, passou da morte para a vida”. (Jo 5:24) E também: “Seja-vos pois notório, varões irmãos, que por Este se vos anuncia a remissão dos pecados. E de tudo o que, pela lei de Moisés, não pudestes ser justificados, por Ele é justificado todo aquele que crê”. (Atos 13:38) Não fiz nem mesmo um simples comentário, mas havia o profundo sentimento de que Deus, o Espírito Santo, estava falando estas palavras aos pecadores perdidos e culpados. Você já viu o vento passar por um campo de cereais, dobrando cada folha e caule. Foi exatamente assim. A divina presença passou sobre a reunião, de um extremo ao outro, e inclinou cada coração e cada cabeça. Um profundo suspiro foi ouvido de um lado ao outro; muitos caíram, alguns em figura, outros se recostando à parede. Pairava sobre o local um silêncio profundo, quebrado apenas pelos soluços.

Então os cristãos que estavam presentes começaram a conversar com os convertidos. Darei um exemplo. D. M. disse a um, que havia sido um jovem leviano e estava ali recostado contra a parede:

— David, você deseja sinceramente ser salvo?

— Não — respondeu ele — eu já estou salvo; eu tenho vida eterna.

David havia passado da morte para a vida, e a nova criação havia sido manifestada nele em sua totalidade. Hoje ele já partiu para estar com o Senhor. Foram dirigidas algumas palavras a alguns, mas foi o Senhor que abriu seus corações para receberem a Sua Palavra. Eles escutaram as Suas palavras, eles creram que Deus havia enviado a Cristo, e o Espírito deu-lhes fé para crerem naquilo que Ele havia dito. E acaso não é este um momento precioso, quando o ouvido é aberto para que escute a mensagem de perdão de pecados que vem de Deus e para que saiba, então, que já está justificado de todos os pecados, pois Deus assim o declara? Mas o que foi por demais marcante foi o que Lydia, uma cristã com uma capacidade de julgar bem apurada, disse-me anos depois daquela reunião. Ela havia acompanhado cuidadosamente o resultado e não tinha dúvidas de que cada incrédulo daquela reunião havia sido convertido. E, ou já tinham partido para estar com o Senhor, ou eram provas vivas da graça de Deus. Querida Lydia! Um dos primeiros frutos naquela região; ela, seu marido e quantos mais, que foram convertidos na época que eu descrevi e que se encontram agora com o Senhor!

Há poucas alegrias mais profundas e reais do que vermos nossos filhos no Senhor partirem em paz. Que cena de perfeita paz e calma podia-se ver na face da idosa Lydia, quando jazia no sono da morte! Que maravilha será vermos, naquela manhã por demais radiante para os olhos mortais, os milhares assim abençoados pela Palavra levantando-se na glória de Cristo para encontrá-Lo nos ares! Será que você, querido leitor, estará ali, ou porventura será deixado de fora para sempre?

os “Folhetos Ferroviários”

Meu coração se prende àquele trabalho nas aldeias, mas devo me transportar agora a outras paragens. Gostaria de relatar como o Senhor colocou em meu coração escrever os “Folhetos Ferroviários” e tudo o que aconteceu por meio deles. Eu tinha estado pregando a Palavra em Tetbury, aonde ia com frequência naqueles dias. Nosso irmão W. falou-me:

— Por que você não publica alguns dos incidentes da obra do Senhor que aconteceram nos vagões dos trens? Estou certo de que o Senhor poderia usá-los.

Eu respondi que nunca havia pensado naquilo, porém ele insistiu que eu o fizesse. Senti que o Senhor estava me falando assim para fazer aquilo para Ele, esperando poder usar os folhetos para a bênção das almas. Quão pouco eu imaginava, naquele momento, a maneira como o Senhor os usaria em muitas línguas por todo o mundo. Foram escritos os quatro primeiros “Folhetos Ferroviários” e muitas almas já foram salvas por meio do Espírito de Deus usando aqueles pequenos folhetos. Também escrevi o folheto “O que é o Sábado?” e vou expor algumas das razões de haver escrito cada folheto.

Busquei a Deus para que me concedesse escrever exatamente o que Ele desejava, capacitando-me a escrever com simplicidade e sem nenhum adorno. Pedi que nunca me deixasse escrever com um sentimento de parcialidade, mas que pudesse escrever para toda a igreja de Deus, ou o evangelho para todo pecador. Pedi ainda que, em cada acontecimento relatado, Ele me desse as palavras exatas; que me fizesse relembrar o melhor possível.

Mais Folhetos

Assim, tem sido um hábito constante escrever folhetos, já que creio que o Senhor me guiou a fazê-lo. O mesmo aconteceu com folhetos como “Mefibosete”, “José”, “Rute”, “Jônatas”, “Jó”, “Neemias”, etc., etc. Estes foram escritos depois de eu haver pregado sobre os mesmos temas em diferentes partes do país durante um período de mais de quarenta anos. Creio que raramente o Senhor me guiou a pregar a história de Mefibosete, indicando a Cristo, sem que almas fossem convertidas. Ele também tem Se agradado em usar, com frequência, cada folheto que é lido ou contado a enfermos ou moribundos, ou pregado por outros. O Sr. M. contou-me que pregou a mensagem deste folheto em quase toda cidade e vila dos Estados Unidos e acredita que nunca o tenha feito sem que almas fossem levadas a Deus. Seria necessário todo um volume só para contar o grande número de casos que o Senhor permitiu que eu ficasse sabendo. Oh! Com que frequência nosso Deus e Pai, pelo Espírito Santo, Se agradou em usar um folheto em lugares tenebrosos da Inglaterra, onde todas as portas pareciam fechadas à luz do evangelho.

Há mais de trinta anos foi-me contado o que aconteceu com um folheto, que creio ter sido um denominado “Despedaçado”, entregue a uma mulher em Rutlandshire. Ela ficou doente e o Senhor concedeu paz ao seu coração por meio deste folhetinho. Ela morreu segurando-o em sua mão. O pedido que fez ao seu marido antes de morrer foi que ele o lesse a seus filhos. Depois de sua partida, aquele folheto foi uma bênção na conversão de oito pessoas. Muitos casos similares aconteceram e muitos deles na América, Índia e Austrália. Vou citar um.

O Pastor de Ovelhas

O administrador de uma grande fazenda de criação de ovelhas, no interior do sertão australiano, encontrou um pobre pastor de ovelhas morrendo abandonado em um lugar distante, profundamente amedrontado com a perspectiva da morte e do juízo. Não havia ninguém por perto para indicar-lhe o caminho a Cristo. O jovem cavalgou uma longa distância até sua casa a fim de pegar um folheto e lê-lo ao moribundo. Deus falou à sua alma. Ele partiu daquele ermo sertão para estar com o Senhor, o que é muito melhor.

E quantos, dentre uma classe tão interessante como é a dos marinheiros, foram abençoados por um folheto. Certo dia eu caminhava em Glasgow quando o Capitão G. (agora falecido) me encontrou e disse:

— Devo contar-lhe um caso muito interessante, de como o Senhor quis abençoar o folheto “Vitória”. Durante minha última viagem, um de meus marinheiros ficou muito doente e ansioso acerca do estado de sua alma. Pedi ao imediato que segurasse a lâmpada enquanto eu lia o folheto “Vitória”; e aprouve ao Senhor usar a leitura daquele folheto tanto para a conversão do pobre homem, como também do imediato. O homem morreu em paz e seu corpo foi sepultado no mar.

Aquela foi a última vez que encontrei o capitão G., pois algum tempo depois ele navegou, com seu imediato, para as Índias Ocidentais e seu navio nunca mais foi encontrado.

O Hindu e o Muçulmano

Estou certo de que é Deus Quem Se agrada de usar esses pequenos folhetos, pois são, em si mesmos, inigualáveis para atender a certas ocasiões. Veja este exemplo: Um pobre mineiro hindu, em Demerara, estava em grande angústia acerca de sua alma. Ele tinha um amigo, um muçulmano, que estava bastante preocupado com sua angústia. O muçulmano disse-lhe:

— Creio ter um folheto que poderá trazer-lhe o alívio que procura.

Ele leu e traduziu o folheto “Teus Pecados Te São Perdoados”. Ambos converteram-se a Cristo e tornaram-se pregadores do evangelho. No entanto, para o raciocínio humano, nada havia naquele papel que pudesse produzir um resultado tão maravilhoso. Deus Se agradou em usar Sua própria Palavra impressa naquele folheto.

O mesmo folheto foi usado da seguinte maneira para um infiel que estava à morte em Sheffield: Aquele homem recusava-se a ler qualquer coisa ou a receber a visita de qualquer pessoa que falasse de Cristo. Era uma alma que se dirigia ao inferno em trevas e incredulidade. Uma mulher dobrou o folheto em sua mão, de modo que somente o título pudesse ser visto, ficando o folheto escondido. Ela abriu a mão diante dos olhos do homem e perguntou:

— Você consegue ler isto?

Ele leu as palavras: “Teus Pecados Te São Perdoados”. Foi o começo. Era Deus falando à sua alma. Sim, Deus disse, “Teus pecados te são perdoados”. O homem falou:

— O que? os meus pecados?! Será possível que sejam os meus pecados?!

Enquanto os pecados de sua vida passada apareciam diante dele, Deus, em infinito amor pelo nome de Cristo lhe falou: “Teus pecados te são perdoados”. Pela graça divina ele creu em Deus e, no dia seguinte, já estava no céu. Quem poderá medir ou limitar a graça de Deus? Poderia contar centenas de casos, mas devo agora voltar à maneira como o Senhor tem me guiado.

CAPÍTULO 6

O “Bell-Man”

É importante buscar o Senhor todos os dias, para a direção do Espírito Santo, pois nunca sabemos quando ou onde Ele poderá nos usar em soberana graça. Certa vez eu estava viajando de Bristol, onde estivera pregando, a Tetbury, e nunca tinha estado naquela parte do país antes. Ao chegar a Wootton-under-Edge, dispunha ainda de algum tempo antes de seguir viagem. Eram cerca de cinco horas da tarde de um dia quente na época da colheita, e mal se podia ver uma pessoa na pequena cidade. Eu sentia claramente do Senhor que deveria pregar o evangelho ali naquela tarde, no entanto parecia não haver pessoas às quais eu pudesse pregar. Parecia que quase todos estavam trabalhando nos campos. Ainda assim a convicção de que eu devia pregar permaneceu. Peguei alguns folhetos e os entreguei onde consegui encontrar alguém. Estava em uma pequena loja, falando a uma mulher acerca de sua alma, quando um homem subiu a rua correndo, com o rosto molhado pelo suor. Entrando na loja, perguntou-me:

— Por favor, acaso você é um pregador do evangelho?

— Sim — respondi — pela misericórdia de Deus; mas, por que você pergunta?

Ele respondeu

— Eu sou o bell-man*, e se você for pregar hoje eu anunciarei.

[Nota: * bell-man = pregoeiro que andava pelas ruas das pequenas cidades tocando um sino e dando notícias e anúncios.]

— Bem — disse-lhe — eu tinha em meu coração um grande desejo de pregar o evangelho aqui hoje, mas não vejo ninguém a quem possa pregar. Diga-me, por que você veio correndo tanto e me fez essa pergunta?

Ele respondeu:

— Eu estava trabalhando no campo e uma mulher passou dizendo-me que havia alguém distribuindo folhetos em Wootton. Senti como se uma voz me dissesse: Corra, pois deve haver uma pregação em Wootton hoje. Foi por isso que deixei meu trabalho e vim imediatamente.

Já que ele era o bell-man , instintivamente enfiei minha mão no bolso para dar-lhe uma moeda.

— Oh, não, senhor — disse ele — Eu não quero o dinheiro; eu quero que almas sejam salvas! — e o tom sincero e solene de sua voz confirmava suas palavras.

Em meia hora ele já havia tomado banho, anunciado a pregação, e estávamos caminhando em direção a Chipping para pregar. Para o raciocínio humano parecia impossível conseguir alguém para ouvir a pregação.

Pregação à Porta

Assim que saímos da cidade, passamos pela casa de um cavalheiro à nossa direita. O Espírito de Deus fez-me parar e guiou-me claramente para que ficasse sobre os degraus, em frente à porta daquela casa na saída da cidade. Até aquele momento, cerca de meia dúzia de pessoas tinham se reunido e ficaram à minha frente. Sugeri um hino:

Tal qual estou, eis-me Senhor,

Pois o Teu sangue remidor

Verteste pelo pecador;

Ó Salvador, me achego a Ti!

Havia poucas pessoas para escutar; mas eu estava bem motivado a mostrar-lhes as sobrexcelentes riquezas da graça de Deus, recebendo o pecador tal qual está; e isto em perfeita justiça, por meio da obra completa de Cristo. Não se tratava tanto do gozo do pródigo, mas do gozo do Pai em recebê-lo. Descobri depois que o senhor e a senhora que moravam naquela casa, ao escutarem alguém cantando em frente à sua casa, vieram para a porta, que estava atrás de mim, e escutaram cada palavra.

Quando terminei, o cavalheiro, que era médico, rogou que eu entrasse para ver sua idosa mãe no andar de cima. Enquanto lágrimas de gozo rolavam por sua face, ele disse-me:

— Eu nunca escutei isso antes: achava que era preciso trabalhar muito para ser salvo e, no entanto, agora ouço que tudo já foi feito e que Deus tem gozo em receber-me tal qual estou.

Encontrei a idosa senhora em sua cama, e ela tinha escutado cada palavra, já que a janela de seu quarto estava exatamente sobre o lugar onde eu pregara.

Aqueles acontecimentos já tinham quase fugido de minha memória quando, anos depois, estava pregando em Cheltenham e uma senhora de lá me contou que o Senhor abençoara a Palavra aquele dia para a conversão do médico, de sua esposa e também de sua idosa mãe que a escutara pela janela. O médico e sua mãe já haviam partido para estar com o Senhor. Acaso não é verdade que Ele “compadece-Se de quem quer”? (Rm 9:18) Até àquele dia, o médico tinha estado envolvido na escura nuvem do ritualismo. Que contraste, então, quando o evangelho é ouvido pela primeira vez. Quão bendito é quando o Senhor abre os olhos do cego.

Pregando em Llandudno

Havia, com frequência, muita bênção naquele tempo quando pregava em lugares à beira-mar. Em Llandudno houve um notável interesse durante vinte e um dias. Eu nem tinha que anunciar; bastava subir a Orme’s Head e o povo me seguia, e tínhamos uma pregação na colina. Houve muita confusão certa noite quando um clérigo ritualista contratou uma banda para tocar e abafar o som do evangelho. Houve um grande ressentimento por parte das pessoas. Vários clérigos e autoridades ficaram do meu lado naquela noite. Avisaram-me que entrasse numa casa enquanto acalmavam o povo que, com dificuldade, foi impedido de atirar os instrumentos no mar. Depois de algum tempo tudo ficou tranquilo de novo, e continuei a pregar. Aquela foi uma época extraordinária, quando não podia sair de casa sem que encontrasse almas ansiosas. E houve muitos que passaram da morte para a vida (Jo 5:24).

Diagrama da Vinda do Senhor

Houve também um considerável avivamento acerca da vinda do Senhor. Foi naquela época que, com a ajuda do Coronel B., desenhei o diagrama sobre a vinda do Senhor. O dia vindouro mostrará a colheita daquelas três semanas de semeadura. “O Senhor conhece os que são Seus.” (2 Tm 2:19).

Foi assim que o diagrama teve origem: Eu estava falando acerca da vinda do Senhor e, por encontrar alguma dificuldade em explicar a diferença entre o atual período do evangelho e o milênio, que é o período do reinado de Cristo, peguei um giz e desenhei dois círculos sobre o portão do jardim, dizendo:

— Suponham agora que um destes círculos represente o período atual e, o outro, o milênio.

Li, então, as passagens que descrevem o presente período, durante o qual Jerusalém é esmigalhada e pisada, conforme Lc 21:24. Então, durante o milênio, o período do reino de Deus sobre a Terra, essa mesma Jerusalém será o centro de bênção para todo o mundo. Muitas outras passagens foram também lidas para mostrar o grande contraste entre estes dois períodos. Com as diferentes perguntas que surgiram, foi traçada uma linha indicando a história dos judeus e o ministério de Cristo antes do início do presente círculo de tempo. Então, outra linha, para mostrar a ascensão de Cristo ao céu, tendo os céus retido a Ele durante este período de graça, da parte de Deus, e de ímpia rejeição da mesma graça, por parte dos homens. Então outra linha foi marcada para mostrar a vinda do Senhor Jesus para buscar os Seus santos (1Ts 4). Depois, uma linha mais curta entre este período, após os santos serem levados para se encontrar com o Senhor: o tempo dos juízos descritos no livro de Apocalipse. Outra linha reta de cima para baixo, para mostrar a vinda de Cristo COM todos os Seus santos, a fim de executar juízo e dar início ao reino milenial. E, no final daquela bendita dispensação, uma linha curta foi assinalada para mostrar o curto período no qual Satanás estará solto — terminando com o julgamento dos mortos; e o início de um arco, um círculo sem fim, para mostrar o estado eterno. Tudo não passava de simples rabiscos sobre o portão do jardim, mas ajudaram maravilhosamente a audiência a compreender a verdade dispensacional. Como foi mencionado, o Coronel B. gentilmente desenhou tudo de forma correta em arte final. Foi esta, então, a origem simples do folheto com o diagrama sobre a vinda de Cristo. Deve ser do conhecimento de muitos leitores o modo como Deus tem Se agradado de usar aquele pequeno folheto. Assim Ele dá, e assim Ele usa aquilo que dá.

Devo omitir muitos dos incidentes daqueles dias, alguns dos quais estão relacionados com os “Folhetos Ferroviários”; e gostaria de observar aqui que aqueles poucos incidentes foram estritamente verídicos. Foram escritos naquela época, e cada palavra é exatamente aquilo que pôde ser lembrado.

O Reavivamento

Vamos passar agora à época que ficou conhecida como o tempo de reavivamento, em 1859. Eu tinha ouvido falar dos maravilhosos efeitos conseguidos com cem gramas de folhetos evangelísticos nas terras altas da Escócia. Creio que aquela onda de bênção rolou por toda a Escócia. Os folhetos eram de uma folha, “Pão Caído”, e apenas um foi deixado em cada povoado. Fui também profundamente tocado pela fé de um homem idoso que vivia na América. Ele tinha mais de setenta anos de idade e, de algum modo, uns poucos folhetos tinham chegado até ele; e ele viu o Senhor usando esses folhetos em graça para muitas almas. Aquele querido ancião pediu-nos que lhe enviássemos uma tonelada de folhetos iguais àqueles, prometendo enviá-los por todos os Estados. Ele não tinha dinheiro para pagar pelos folhetos, mas estava certo de que a fé poderia confiar no Senhor do outro lado do Atlântico e que ELE pagaria no dia vindouro. Só Deus sabe como a fé daquele querido e idoso H. foi honrada. Não enviamos uma tonelada, mas enviamos alguns quilos, e o idoso servo do Senhor os enviou por todos os Estados Unidos.

Bem, a onda de divino poder alcançou a Escócia. O querido W. T., agora já há muito com o Senhor — um homem que sempre deixou, e deixa até hoje, o precioso aroma de Cristo atrás de si — esteve em Glasgow e viu centenas de almas procurando por misericórdia e sendo levadas a Cristo. Ele veio me visitar e contou acerca dos maravilhosos feitos do Senhor. Um sentimento dos mais marcantes da presença do Senhor desceu sobre mim e senti-me impelido, pelo divino poder, a ir logo a Birmingham. Um fortalecimento da fé, tal como eu nunca havia antes experimentado, e a expectativa de que algumas almas seriam salvas, tomou conta da minha alma.

O grande salão na Broad Street ficou lotado uma noite após outra. Mesmo após as reuniões, quase todos permaneciam no local. Não havia excitação nas pregações. Não havia nem mesmo muitos convites ou pressão sobre os pecadores. Tratava-se mais da justiça de Deus em justificar o pecador e a perfeição daquela justificação no Cristo ressuscitado. No entanto, sempre observei que quanto mais Deus é revelado em Cristo nas pregações, mais duradouros são os resultados. Deve haver também uma inquestionável confiança na Palavra de Deus: de que todos os que são levados pelo Espírito Santo a crer em Deus, SÃO justificados de todas as coisas.

Respostas à Fé em Stafford

Enquanto aquelas reuniões aconteciam em Birmingham, um irmão em Cristo veio de Stafford. Ele estava cheio de fé de que Deus ali estava para abençoar as almas. Voltando a Stafford, pediu a alguns irmãos que se reunissem para rogar a Deus em oração, às seis horas da manhã seguinte. Um bom número se reuniu para rogar ao Senhor que abençoasse a Sua Palavra naquela noite. Porém, quando aquele irmão emprestou cadeiras e bancos a fim de dispor do máximo de lugares no grande salão de reuniões, alguns não sabiam o que fazer com tantos lugares. Quando faltavam quinze minutos para as sete, o grande salão ficou simplesmente lotado. Alguns estavam desmaiando, mas não podiam ser levados para fora. Um cavalheiro que estava presente levantou-se e disse que o perigo de superlotação era tão grande que ele, como diácono de uma grande capela próxima, a abriria sob sua total responsabilidade. Ela logo ficou cheia.

Lembro-me de ter visto um homem entrar embriagado. A solenidade da presença de Deus pareceu torná-lo são imediatamente. Ele professou ter se convertido, mas nunca mais fiquei sabendo se sua conversão foi genuína. Nunca tive dúvidas de que Deus estava operando de maneira marcante naquelas reuniões. Muitos professaram estar salvos. Alguns acabaram caindo depois, por serem seus corações como o solo pedregoso; mas naquele dia vindouro será revelado o que foi obra do Espírito de Deus.

Pregação em Leamington

Alguns dias depois, três de nós se sentiram guiados a ir a Leamington. Tínhamos alguns avisos impressos, do tamanho de um envelope pequeno, convidando os cristãos de Leamington a comparecerem no Salão de Concertos às três horas para, em oração, rogarmos ao Senhor para que abençoasse a Palavra a ser pregada à noite naquele salão. Cerca de duzentas pessoas se reuniram ali. E oh, que rogo de um desejo unido em oração subiu ao trono da graça. Como deve ter sido algo verdadeiramente bendito quando a assembleia esteve reunida na unidade do Espírito, como em Atos 4.

Às sete, o grande salão estava cheio. Naquela noite Deus respondeu às orações. Foi a noite do nascimento de muitas almas preciosas e da libertação de muitas outras. Comentou-se que algumas centenas de pessoas encontraram libertação e bênção ali. Às nove horas não havia nenhum sinal de que quisessem ir embora, e a reunião continuou até às onze. O povo não conseguia ir embora. Havia muitos profundamente preocupados acerca de sua salvação eterna, e todas as classes de pessoas foram igualmente tocadas pelo Espírito de Deus. Não foi tanto durante a pregação que isso aconteceu, mas pela simples citação das Escrituras depois que a pregação tinha se encerrado.

Uma Senhora Unitariana

O caso de certa senhora foi surpreendente e, ao mesmo tempo, ilustra muitos outros casos semelhantes. Ela havia sido criada com ideias Unitarianas* destrutivas à alma e acabou ficando cativada ao ouvir da justiça de Deus revelada na morte expiatória do Senhor Jesus. Mas isso foi enquanto eu citava aquelas benditas palavras de Jesus: “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a Minha palavra, e crê naquele que Me enviou, TEM a vida eterna, e não entrará em condenação (julgamento), mas, passou da morte para a vida”. (Jo 5:24) Ela exclamou, a ponto de ser ouvida por todos em redor:

[Nota: * Unitarianismo: doutrina herética que nega a Trindade.]

— TEM! Oh, será que Jesus diz TEM a vida eterna?

Li mais uma vez as palavras de Jesus e assegurei-lhe de que eram as palavras dele próprio. Portanto, aquele que crê em Jesus não pode ter nem sequer uma sombra de dúvida de que TEM a vida eterna e não entrará em juízo, mas passou da morte para a vida. Não sei qual foi o exercício de alma que ela teve antes disso, mas nunca antes havia entendido que Jesus era o Filho de Deus: o próprio Deus falando a ela; foi então que sentiu uma profunda convicção de seus pecados. Ela perguntou:

— E os meus pecados?

Disse-lhe que o sangue de Jesus, Aquele Ser infinito e bendito, a purificava de todo pecado. Não me recordo das palavras exatas, mas a ideia era esta. Foi uma luta difícil, mas será que há algo difícil demais para o Senhor? Ela passou da morte para a vida. Insistir em Jo 5:24 e Atos 13:38,39 foi o que lhe deu certeza de duas coisas. Ela soube que estava justificada de todas as coisas e que tinha a vida eterna. Ela creu em Deus. Esta é uma amostra do que aconteceu com muitos, das 9 às 11 horas daquela noite.

Sei que alguns podem duvidar da graça de Deus em tais conversões instantâneas. Uns dezoito anos depois daquela noite memorável, encontrei a mesma senhora em M., e ela me contou que tinha ido àquela pregação a pedido de sua mãe, juntamente com um grupo de jovens colegas da escola para moças. Havia ido com um estado de espírito totalmente despreparado, tendo acabado de voltar de um tipo de escola-convento na França. Se bem me recordo, ela e todas as jovens que estavam sentadas com ela naquele banco se converteram naquela mesma noite, e ela sabia que todas haviam demonstrado em suas vidas, no tempo que se passou depois, que aquela fora uma obra de Deus. Assim Ele Se compadece de quem quer.

CAPÍTULO 7

Pregando em Londres

Naquela época eu estava acostumado a pregar com frequência em Londres. Mencionei a alguns irmãos que tinha em meu coração usar o Myddelton Hall, em Islington, para uma semana de pregações. Alguns duvidaram que fosse possível, mas muitos corações elevaram-se a Deus em oração. Foi tudo feito em dependência de Deus. Eu não tinha nada organizado ou preparado e nem ideia dos temas que iria pregar. O salão ficou cheio todas as noites. Foram apresentados muitos pedidos escritos de oração para pessoas queridas.

Algo bem solene ocorreu certa noite. Assim que começamos, alguém chegou trazendo um pedido de oração a favor de uma senhora, de uma família mundana, que estava morrendo sem Cristo. O Sr. G., agora já com o Senhor, acompanhou o mensageiro, enquanto nos ajoelhávamos em solene e fervorosa oração. Ele encontrou a pobre senhora em meio ao maior luxo e extravagância que este mundo pode produzir. Mas não havia ninguém ali que conhecesse a Cristo, ou que pudesse falar alguma palavra a uma alma aflita prestes a passar da alta sociedade londrina para as trevas exteriores e o eterno padecer. Deus respondeu às orações. Ele abriu o coração daquela pobre senhora para receber a palavra da vida e ela foi salva eternamente.

Um sentimento extremamente solene desceu sobre a reunião. Pudemos todos sentir a eternidade bem perto de nós. Pedimos para aqueles que estivessem angustiados que passassem para uma antessala. Em poucos minutos ela estava lotada. Que cena maravilhosa aqueles jovens e velhos, ricos e pobres, com os olhos marejados e aparência ansiosa, perguntando o que deveriam fazer para serem salvos. Fomos obrigados a voltar ao salão principal e, enquanto alguns buscavam o Senhor em oração silenciosa, outros falavam às almas angustiadas. O interesse parecia se aprofundar a cada noite; o grande salão estava sempre bem cheio. Só o Senhor sabe quantos foram os que passaram da morte para a vida.

Pregando na John Street

Por volta dessa época fui convidado por B. N. para pregar na capela da John Street por três noites. O assunto era a justiça de Deus em justificar o pecador. Após a pregação, convidamos os que estavam angustiados para que se dirigissem à sala de aulas adjacente. Cerca de 200 pessoas entraram. Era impossível conversar com cada uma delas individualmente. Eu estava muito exausto para continuar falando e, por isso, o Sr. N. tomou a palavra, enfatizando o assunto com a mais doce simplicidade. Aquilo era algo notável, pois segundo me haviam dito, ele tinha uma opinião diferente sobre o assunto. No entanto ali explicava com grande clareza em como Deus era Justo em justificar, através da morte e ressurreição de Cristo, o pecador que nele crê.

Quero frisar um pouco isto para mostrar que a pregação não tinha, de modo algum, um caráter de reavivamento. Na verdade, como disse o Sr. N. a um amigo, tratava-se mais de estudos sobre a Divindade. Estou cada vez mais convencido de que é este o tipo de pregação necessária; não de excitação, mas de uma explanação clara do evangelho de Deus.

O Velho “Filho Pródigo”

Após as palestras do Sr. N., conversamos com algumas pessoas e depois encerramos. Nunca me esquecerei de um caso; um idoso cavalheiro, alto e refinado, com cerca de setenta anos de idade, que há muito tempo estava aprisionado por trevas desesperadoras. Eu estava falando do profundo gozo de Deus em receber o filho pródigo. O trabalho do pastor já havia sido feito; Ele havia buscado e morrido pela ovelha. O Espírito já tinha descido do céu para buscar e encontrar o perdido, como fez a mulher, varrendo todo o chão em busca de sua moeda de prata que estava perdida. E agora o Pai em justiça e graça podia encontrar e receber; podia beijar e vestir o filho pródigo. Escutei um profundo suspiro vindo daquele velho nobre — ou que fora um nobre no passado. Ele falou:

— Gastei tudo. Gastei minha saúde, minha fortuna, todo conforto, esposa, filhos, tudo se foi; aqui estou, mergulhado em pecado e miséria.

É impossível descrever a agonia e tristeza daquele velho homem. Colocamos o evangelho diante dele e confiamos na graça de Deus, a qual resplandeceu em sua alma imersa em trevas. Onde estará ele agora?

Há muitos que professaram haver encontrado paz. Porém prefiro considerar que o Senhor usou aquelas três pregações especialmente para muitos que já eram filhos de Deus. Naquela época recebi convites para pregar nas grandes capelas de Londres, mas senti-me mais guiado a pregar em salões públicos, salas de reuniões, etc.

Nos Condados do Oeste

Tentarei agora descrever uma semana que passei nos condados do oeste. Fui hospedado por uma senhora cristã em Ipswich, após tê-la encontrado em Birmingham. Mal tive tempo de tomar uma xícara de chá após minha chegada de Londres, já que havia uma grande audiência esperando no salão de reuniões, às sete horas daquela noite de sábado. Dirigi-me ao salão, sugeri um hino, mas senti um branco total em minha mente. Não me ocorria nenhum versículo ou pensamento. Ajoelhei-me para orar e, no entanto, continuava um branco em minha memória. Quando me levantei, um versículo surgiu em minha mente, “Portanto agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”. (Rm 8:1) Murmurei: “Senhor, vou ter que falar sobre isto de um jeito ou de outro”. Li os versículos. Aquela noite jamais será esquecida. Anos depois, encontrei uma senhora que me contou que ela, seus irmãos e irmãs receberam bênção naquela noite. Eles eram bem jovens. E muitos outros, principalmente os jovens, foram levados a Deus.

No dia seguinte, dia do Senhor, estávamos pregando no mercado de Needham às duas e meia da tarde. Havia tanta gente que era impossível todos entrarem, e o poder de Deus podia ser sentido. À noite o salão de reuniões em Ipswich ficou lotado. Uma avalanche de pedidos, em favor de parentes, foi enviada para que fossem lidos. À medida que os lia, antes de elevarmos nossos corações em oração, notei um homem idoso perto de mim, com sua cabeça pendida em profunda tristeza. Ele estava cheio de remorso por não haver feito um pedido em favor de sua filha. Logo que acabei de ler os bilhetes com pedidos de oração, vi uma jovem alta tentando abrir caminho em meio à multidão, com o rosto rubro e olhos molhados de lágrimas. Ela aproximou-se do velho senhor e, caindo de joelhos ao seu lado, disse:

— Pai, você não vai orar por mim?

O dia vindouro, tão próximo, irá mostrar os resultados daquela noite. Já era tarde quando pudemos deixar aquelas muitas almas ansiosas. Na noite seguinte o interesse foi também muito grande.

Stowmarket, Norwich e St. Edmunds

na terça-feira, às quatro horas da tarde, tivemos uma reunião no Stowmarket, para oração e comunhão entre os irmãos. Lembro-me bem de uma oração. Um querido cristão de Bury disse:

— Senhor, o teu servo está aqui e não perguntamos a ele se vai a Bury, mas perguntamos a Ti se é para ele ir pregar a Tua Palavra ali.

Aquelas palavras estão tão vivas em minha memória que parece que escutei aquela oração ontem à noite. Usamos um grande galpão, recém-construído para venda de cereais, e às sete ele estava cheio de gente. Vieram de todos os lugares da vizinhança, em carroças, carruagens, charretes, etc. As horas se passaram e o profundo interesse continuava. Se encerrávamos a pregação, todos permaneciam esperando e tínhamos que recomeçar; até que, por fim, o gás da iluminação foi desligado às onze horas aproximadamente. Falei então sobre a vinda do Senhor, com aquela multidão ali no escuro. Era quase meia-noite quando fomos embora. Só Deus conhece os resultados. Muitos professaram haver recebido a salvação. Em muitos casos, não tenho dúvidas, a obra na alma já havia começado antes.

na quarta-feira, às duas horas, uma grande audiência estava reunida no Teatro, o Salão de Conferências de Norwich. E às sete a multidão era tão grande que o salão ficou logo cheio, ficando também dois outros salões completamente lotados. Por volta das nove horas, a multidão que esperava do lado de fora era tão grande que foi preciso que os que já tinham ouvido saíssem, para o salão ser novamente ocupado pelos que esperavam que fosse iniciada nova pregação. Um idoso ministro levantou-se e declarou que nunca havia encontrado paz até àquela noite. Aquilo produziu um sentimento profundo e solene. Podia-se sentir que Deus estava operando por meio do Espírito Santo. Muitos professaram haver sido levados a Cristo naquele dia.

No dia seguinte fui a Bury St. Edmunds. O irmão que havia orado em Stowmarket alugou o grande Salão de Conferências da cidade. No entanto, alguns cristãos queixaram-se de que seria desencorajador ver o grande espaço ocupado apenas pela metade. Às sete já era difícil encontrar um lugar vazio. Ali a Palavra pareceu ter sido especialmente abençoada para alguns, deixando marcas profundas. Havia muitos também que nunca tinham desfrutado da certeza dos pecados perdoados, dos pecados nunca mais levados em conta. Oh, quão bendito é que Deus seja Justo em nos reputar por justos diante dele.

A Direção do Senhor

Quando me lembro daquela semana, costumo dizer: Quem mais, além de Deus, poderia ter dado forças a um pobre e enfraquecido corpo, para atravessar aquela semana de trabalho com apenas um pulmão funcionando? Sem nenhum esforço, mas simplesmente obedecendo o guiar de Seu olhar e a direção do Espírito de Deus, portas de bênção que eu nem conhecia foram abertas de cima, e sempre de maneira diferente umas das outras.

Em outra ocasião, eu me encontrava em Ipswich e tinha em meu coração a forte convicção de que devia ir a Sudbury e pregar a Cristo ali. Mencionei isto a muitos irmãos, mas eles me desencorajaram, com exceção de um irmão. Eu só sabia o nome de uma pessoa naquela localidade. Escrevi-lhe dizendo que gostaria de ir e pregar em um dia determinado. Em minha viagem, passei por Bury e descobri que aquele irmão que havia orado em Stowmarket tinha estado orando por Sudbury por cerca de dois anos. Quanto tem a ver com a obra do Senhor esses irmãos que oram! O irmão disse-me que iria comigo. Darei este exemplo como uma amostra do que aconteceu em muitas cidades que visitei.

Chegamos à estação de Sudbury. Um jovem cavalheiro aproximou-se e perguntou-me se meu nome era Stanley. Respondi que sim. Ele disse-me que sua mãe ficaria contente em nos receber em sua casa, onde já havia alguns esperando pela leitura da Palavra. Encontramos um bom grupo às quatro horas e, evidentemente, eram todos estranhos para nós. Tivemos momentos maravilhosos meditando na Palavra.

Enquanto eu lia, um ministro enviou um recado dizendo que eu poderia usar sua capela para pregar. Respondi que não poderia aceitar tal oferta, a menos que entendesse que teria total liberdade para falar de qualquer coisa que o Senhor me dirigisse a falar. Ele não se opôs. Então avisei que seguiria para lá às sete horas. Fui e encontrei a capela bem cheia. Porém, senti que não deveria pregar nela e senti-me guiado a propor que devíamos sair e ter a pregação ao ar livre. Todos, de boa vontade, concordaram e saímos. Para minha surpresa, já havia um bom grupo reunido lá fora; pessoas que pertenciam à igreja da cidade e que não entrariam naquela capela por considerá-los dissidentes. Preguei ali, ao ar livre para aquela grande congregação, até às dez horas.

Alguém poderá perguntar: Como pôde acontecer aquilo? Como os outros ficaram sabendo? Eu direi. Foi-me contado depois (e tudo o que eu tinha de fazer naquela ocasião era obedecer ao Senhor), que o Sr. H. estivera pregando na igreja da cidade e dissera que eu estava sendo esperado para pregar em Sudbury durante a semana. Ele convidara sua congregação para ouvir-me pregar.

Resultados em Sudbury

Talvez alguém pergunte como é que me hospedava nas diferentes cidades para as quais viajava, embora sendo um estranho àquelas pessoas. Bem, no final da pregação, uma senhora procurou-me e disse-me que um cavalheiro, que não pôde estar ali presente por ter que acompanhar o funeral de um parente em uma cidade distante, havia enviado sua carruagem e rogava que aceitássemos sua hospitalidade, para a glória do Senhor. Viajamos alguns quilômetros e chegamos a uma mansão onde tivemos uma reunião até à meia-noite. De manhã tivemos outra reunião para os muitos empregados da propriedade, voltando depois para Sudbury, onde tivemos uma leitura que durou o dia todo.

Enquanto escrevo isto me vem à mente uma carta, da qual citarei um trecho:

 ”Você deve se recordar de haver pregado o evangelho das boas novas de Deus em um pedacinho de terra chamado Croft, em Sudbury. Eu estava no meio da multidão e, pela graça e amor do Senhor, fui levado à gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Posso agora bendizer e louvar o Senhor por Seu maravilhoso amor a mim demonstrado, ao entregar Aquele que tudo podia fazer — e que tudo fez — por um pobre pecador. Pelo Espírito de Deus você mostrou-me que tudo já havia sido feito pelo Senhor; que Ele havia satisfeito completamente a Deus e que a misericórdia de Deus tinha sido revelada em sua totalidade, quando entregou Seu próprio Filho. Senti-me como se estivesse sendo liberto das influências de Satanás e da escravidão dos homens, feliz por sair do ‘arraial’ e dirigir-me Àquele Ser tão bendito que está fora de todas as pretensões humanas”.

CAPÍTULO 8

Pregando em York, Bradford e Rochdale

Devo, porém, continuar voltando um pouco no tempo, para me deter na extraordinária obra de Deus em tantos lugares. Na cidade de York havia uma obra abençoada, embora houvesse alguma excitação misturada a isso e alguns casos tenham revelado não possuir raiz. O salão de reuniões estava tão lotado que havia pessoas até nas janelas. As reuniões às seis da manhã eram momentos de grande refrigério e comunhão. À noite os crentes saíam para as diversas partes da cidade e traziam os inconversos para escutar a Palavra. Certa senhora chegava a ir às partes mais baixas da cidade e quase os obrigava a vir. Ela os colocava em fila e, andando ao lado deles, os levava ao salão. O pequeno folheto “Desperta! Desperta!” expressa muito bem o caráter da pregação dessa época, o mesmo acontecendo com o folheto “Justificação no Cristo Ressuscitado”.

Cenas parecidas foram testemunhadas no Mechanics’ Hall, em Bradford e também em Rochdale. E foi neste último que João 5:24 começou a ser usado de maneira tão extraordinária. Preciosas palavras de Jesus que têm sido usadas pelo Senhor para dar certeza e descanso a milhares. Após certa reunião, havia uma jovem em aflição de alma que já há algum tempo ansiava saber, com certeza, se possuía a vida eterna. As muitas doutrinas que escutara, deixaram-na confusa, com dúvidas até se esta certeza da vida eterna era algo que podia ser experimentado. Ela perguntava:

— Como posso saber se estou salva?.

E as palavras de Jesus lhe foram repetidas:

— “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a Minha palavra, e crê naquele que Me enviou, TEM a vida eterna, e não entrará em condenação, mas, passou da morte para a vida”. (Jo 5:24)

O maravilhoso fato de ter sido Jesus Quem falou estas palavras de certeza irrompeu em seu coração e, então, ela perguntou:

— Mas, e meus pecados?

E foram lidas as palavras do Espírito Santo:

— “Seja-vos pois notório… que por Este se vos anuncia a remissão dos pecados. E… por Ele é justificado todo aquele que crê”. (Atos 13:38)

A transformação que teve lugar ficou patente em sua fisionomia. Ela acabava de passar das trevas da incredulidade para o brilho e gozo de simplesmente crer em Deus. Os mesmos preciosos versículos foram lidos para um grupo de almas ansiosas do outro lado do salão e uma mudança semelhante ocorreu nelas, como um brilhante raio de sol. Desde aquela noite memorável estes dois versículos têm sido usados por Deus onde quer que o evangelho de Sua graça seja pregado.

Uma Palavra às Almas Angustiadas

Se alguma alma angustiada estiver lendo estas linhas, permita-me que lhe pergunte: O que mais você pode desejar além da certeza das palavras de Jesus, de que crendo em Deus você tem a vida eterna? “E o testemunho é este, que Deus nos deu a vida eterna; e esta vida está no Seu Filho. Aquele que tem o Filho tem a vida; aquele que não tem o Filho de Deus não tem a vida. Estas cousas vos escrevi a fim de saberdes que tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus.” (Leia todo o contexto; 1 Jo 5:10-13).

Acaso você se encontra oprimido pelos pecados? A simples lembrança deles o aflige? Oh, volte-se para Jesus; olhe para Ele morrendo na cruz, a propiciação pelos pecados. Veja-O ressuscitado de entre os mortos para a justificação de todo aquele que crê em Deus. Pois Deus já aceitou o sacrifício expiatório de Cristo. E porventura agora Deus não anuncia a você, com toda a clareza, o perdão dos pecados? Acaso Ele não declara que TODO AQUELE que crê está justificado de todas as coisas? Portanto, se você crê nele, acaso não estará justificado, considerado como justo, diante de Deus? Irá você responder a estas perguntas na presença de Deus?

O Maior Pecador em Exeter

Gostaria de fazer aqui alguns comentários a respeito do que antecedia e o que se passava depois das reuniões que costumávamos promover naquela época. O que antecedia, ou seja, as reuniões da manhã, às seis horas, eram grandemente abençoadas. Meu próprio salão em Rotherham ficava lotado às seis horas de quase todas as manhãs. Havia oração contínua e fervorosa. Então, como consequência, o salão em Crofts, um antigo celeiro transformado em salão de reuniões, ficava lotado à noite e muitas almas angustiadas professavam haver encontrado paz com Deus.

Pregações matinais também, com frequência, eram honradas por Deus. Estávamos, certa vez, pregando às seis da manhã em Exeter, próximo ao castelo. Uma jovem passava e tão somente escutou a frase: “O maior pecador em Exeter é bem-vindo para o Senhor Jesus Cristo” . Foi uma mensagem de Deus dirigida ao seu coração. Ela foi para casa e, ajoelhando-se ao lado de sua cama, soluçou:

— Senhor, eu sou a maior pecadora em Exeter! Oh, será que sou benvinda para Ti?

Alguns meses depois, um irmão em Cristo foi chamado para atender a uma mulher que morria. Pelo tipo da casa e da vizinhança, ele esperava encontrar um triste caso de uma alma prestes a passar para a eternidade ainda sem salvação. Ficou surpreso ao ver uma face radiante de paz celestial. Era uma bela cena ver alguém prestes a partir para estar com o Senhor. Ele estava tão surpreso que mal podia falar. Por fim, disse:

— O que faz você tão feliz? Acaso alguém já veio aqui para vê-la? Ou será que você ganhou algum folheto?

— Oh, não — respondeu ela — Ninguém veio ver-me. Eu estava aqui sozinha com o Senhor Jesus.

Então ela contou o que havia escutado às seis horas de certa manhã; como ela havia chegado em casa e ajoelhado ao lado daquela cama; o que havia dito ao Senhor; e a eternas boas-vindas que havia encontrado em Seu infinito amor. Há muitos anos que ela já está com o Senhor. Oh, vocês, queridos servos do Senhor, que têm saúde e disposição; por que não experimentam fazer algumas reuniões às seis da manhã?

A Real Direção do Senhor

Mas não podemos nos esquecer dos momentos após as reuniões. Tais momentos foram, sem dúvida alguma, extremamente usados. E o que é que não foi? Que Deus Se agradava em trabalhar naquelas horas por meio do Espírito Santo é algo que não se pode questionar. Não era preciso pedir às pessoas que permanecessem no local. Eles não queriam sair. Deus estava agindo por meio do Espírito Santo e muitos encontraram paz durante aquelas reuniões. A incredulidade pode estar pronta a dizer que muitas daquelas aparentes operações do Espírito não passavam de ocorrências incidentais. Isto não poderia ser em muitos casos. Veja, por exemplo, este:

Certa ocasião senti um chamado bem claro para ir pregar em um lugar onde havia estado só uma vez em minha vida: uma cidade à esquerda de quem vai de Potteries para Derby. Eu não sabia o nome da cidade mas ela estava bem clara diante de meus olhos, e senti-me seguro de que deveria ir até lá e pregar a Cristo. Descrevi a cidade a uma pessoa de Staffordshire e ela logo me disse que o nome do lugar era Uttoxeter. Continuei a orar durante aquela semana e, na sexta-feira, recebi uma carta de Tenby, South Wales, que incluía uma carta da Sra. H., de Uttoxeter, perguntando àquela senhora de Tenby se ela sabia o meu endereço a fim de encaminhar-me aquela carta. E a carta era um sincero pedido para que eu fosse a Uttoxeter e pregasse ali o evangelho. Fui imediatamente; a Palavra foi recebida e um grupo foi reunido a Cristo.

Porventura teria sido um mero acidente eu ter sido chamado, naquele dia, para pregar em um lugar que me era desconhecido? Até mesmo uma cristã havia sido dirigida a escrever-me uma carta pedindo-me que fosse! Por que razão deveríamos duvidar da presença e direção do Espírito Santo agora, como quando esteve manifestadamente presente no princípio? Jesus disse: “E eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre.” (Jo 14:16) Sim, Ele habita conosco; e se fôssemos mais simples, conheceríamos muito mais de Sua divina direção em nossa senda de serviço. É na mesma proporção que a organização eclesiástica cresce, que a direção do Espírito é deixada de lado. Nem fazemos ideia do quanto perdemos com isso.

CAPÍTULO 9

Respostas Claras à Oração

Traz grande fortalecimento à fé receber respostas diretas à oração, mesmo nas pequenas coisas, e isto de uma maneira ainda mais especial no serviço para o Senhor. Você acaba pregando de uma maneira bem diferente se tiver a certeza de que Deus o enviou a um determinado lugar. Lembro-me de ter sido claramente guiado a ir a Leeds pregar, e fui imediatamente. Estava havendo uma reunião de oração quando cheguei. Ajoelhei-me sem que percebessem que eu estava ali, próximo à porta. Naquele momento estavam orando por mim, a fim de que eu pudesse ser enviado para ali pelo poder do Espírito, e que pudesse haver bênção no dia seguinte. Acho que era um sábado à noite; e se recordo bem, foi naquela ocasião que minha vida foi ameaçada, enquanto pregava para uma grande multidão no lugar conhecido como “Vicar’s Croft” . Um grupo de homens ímpios parecia dominado por um furor satânico, mas o Senhor me guardou e o resultado foi que, naquela noite, o salão ficou cheio para escutarem a Palavra.

Também escapei por pouco enquanto pregava ao ar livre em Sheffield, junto à bomba d’água, em Gibraltar. Notei um bom número de irlandeses católicos romanos que, pouco a pouco, se aproximavam de mim. Então, dois homens, um de cada lado, vieram por trás de mim e prenderam meus braços enquanto eu falava. Naquele momento senti a ponta de algum instrumento afiado em minhas costas. Imediatamente falei:

— Em nome do Senhor Jesus Cristo, ordeno que abram alas para eu sair desta aglomeração; estou sofrendo um atentado contra minha vida!

Foi uma cena estranha de se ver: o povo caindo de ambos os lados, até que, quase de imediato, abriu-se uma passagem. Foi a mão de Deus. Caminhei com firmeza os primeiros dois metros e então minhas pernas pareceram faltar-me, mal podendo voltar para casa.

A Igreja de Roma no Ano 60

Seria, no entanto, uma injustiça minha deixar esta impressão, ou seja, de que eu costumasse receber tal tipo de tratamento por parte dos católicos romanos. Geralmente eles me escutavam ao ar livre com respeitosa atenção, já que eu estava acostumado a pregar o evangelho e não a atacá-los. Darei um exemplo:

Estava caminhando com um amigo numa certa manhã do dia do Senhor, em Newcastle, próximo às olarias. Meu amigo falou:

— O homem que vamos encontrar é um fervoroso e devoto católico romano.

Virei-me para ele e disse:

— Olhe, quero que me faça um favor para esta tarde; quero que você providencie para que os católicos fiquem sabendo que pretendo pregar no Mercado, hoje às três horas, e certifique-se de fazer com que saibam que pretendo provar que a doutrina da igreja católica romana no ano 60 é a única verdadeira.

— Já entendi — disse ele.

— E — continuei — providencie para que todos eles fiquem o mais perto de mim que puderem, e que não deixem que ninguém atrapalhe ou me impeça de ir até o fim de meu discurso.

Era espantoso ver quantos deles estavam lá por volta das três horas; e ficaram tão juntos e próximos que ninguém podia chegar até mim. Então dei início e demonstrei que não tínhamos quaisquer dúvidas quanto a qual era a verdadeira igreja em Roma, no ano 60. Continuei:

— Era composta de todos os crentes em Roma; a única igreja, a única verdadeira igreja em Roma. Não fomos abandonados à incerteza, sem meios de saber quais eram as doutrinas da igreja em Roma no ano 60. Temos um relato inspirado dessas doutrinas e é para este documento (a epístola de Paulo aos Romanos) que vamos voltar nossa atenção. Do capítulo 1 ao 3 encontramos a afirmação quanto à total ruína do homem por causa do pecado. Sejam judeus ou gentios, todos pecaram, todos culpados, todos totalmente incapazes de obter justiça pelas obras da lei. E isto cada homem também conclui por experiência própria. E assim deve ser, pois esta era a verdadeira doutrina da igreja de Roma do ano 60 acerca deste assunto; e ela era a única igreja verdadeira no ano 60, em Roma. Não havia outra.

Segui demonstrando a justiça de Deus revelada no glorioso plano da redenção. Mostrei como Ele é Justo em justificar, por meio da morte expiatória de Jesus, a todos os que nele creem. A fé deles lhes é imputada como justiça (Rm 4). Aqueles que creem em Deus, “que dos mortos ressuscitou a Jesus nosso Senhor; O qual por nossos pecados foi entregue, e ressuscitou para nossa justificação”, são assim reputados como justos — justificados. (Rm 4:24,25) Dei exemplos disso para mostrar que a tremenda dívida de nossos pecados havia sido paga; e a eterna prova foi Jesus ter sido ressuscitado dentre os mortos. Ele é nossa justiça eterna. Sendo assim, havia uma notável peculiaridade na igreja de Roma, ou nos crentes em Roma; uma marca da verdadeira doutrina: eles não esperavam ser salvos; Eles não esperavam fazer a paz com Deus. Eles TINHAM paz com Deus. “Sendo pois justificados pela fé, TEMOS paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo.” (Rm 5:1) Aqui está a verdadeira doutrina da igreja em Roma no ano 60. Toda doutrina contrária a esta é heresia e falsidade. A total corrupção da natureza humana; todos culpados. O remédio para a total corrupção da natureza humana — em que todos são culpados — é a redenção pelo sangue de Cristo, não por obras vindas do homem. Todos os que creem em Deus são justificados, e têm paz com Ele — e não estão esperando fazer sua paz com Deus. Jesus completou a obra sobre a cruz. Eles creem nisto e têm paz com Deus por Jesus Cristo.

Bem, a aplicação começou a ser demasiado direta para meus amigos. Eles olharam uns para os outros quando perguntei se esta era a doutrina daqueles que estavam ao meu redor ali. Teriam eles já descoberto que eram pecadores completamente perdidos e que, por mais que tentassem, não poderiam obter justiça ou paz por meio das obras da lei? Teriam eles aceitado esta plena salvação por Jesus Cristo? Criam eles realmente em Deus? Estariam eles esperando obter paz, ou será que poderiam dizer, com os crentes romanos do ano 60, “Temos paz com Deus”? Assegurei-lhes que não havia salvação fora da doutrina da igreja de Roma, conforme foi revelada na epístola no ano 60.

A essa altura, alguns de meus ouvintes mais próximos já haviam passado a ouvintes mais distantes, e outros já haviam desaparecido, mas muitos escutaram até o fim; e não proferi nenhuma palavra que os insultasse. Oh, que aquele dia vindouro possa declarar que almas tenham sido então levadas ao descanso em Cristo, e crido na Palavra de Deus.

Pregando aos Católicos em Glasgow

Isto me faz lembrar a maneira extraordinária como os católicos romanos me defenderam no Mercado do Sal, em Glasgow. Aconteceu mais ou menos da seguinte maneira. Certo dia, ao chegar a Glasgow, vindo de Birmingham, um amado amigo cristão caminhava junto comigo indo ao Mercado de Sal, um grande espaço aberto onde, naquela época, eram frequentes as pregações e palestras de todo tipo. Um idoso ministro escocês estava pregando. Ele estava suplicando às pessoas que se apressassem em abandonar seus pecados, tornando-se boas, religiosas e sóbrias; e finalmente pediu a todos que frequentassem a igreja escocesa e, até mesmo, que o acompanhassem à tal igreja.

Quando terminou, levantei-me dizendo que havia viajado quase 500 quilômetros e que gostaria de acrescentar algumas palavras; eu deveras tinha o desejo de dizer algo a eles. Não creio que alguém tenha saído dali para ir à igreja indicada pelo outro pregador, mas todos escutaram com viva atenção; e a multidão começou a se ajuntar vinda de todas as direções. Não achei que seria sábio dizer-lhes o que pensava da pregação que tinham acabado de ouvir, mas preferi abordar o assunto da seguinte maneira, dizendo-lhes:

— Vocês acabaram de ouvir o que este idoso pregador disse a vocês; e agora, será que vocês não seriam mais felizes se fizessem conforme ele lhes disse? Não seria muito melhor para cada um de vocês se abandonassem seus pecados e se tornassem pessoas sóbrias, santas e religiosas? Acaso vocês não sabem que seria muitíssimo melhor para vocês se fossem santos; sim, tão santos que estivessem prontos para o céu, tendo a certeza de estar indo para lá? Será que existiria algo que pudesse fazer vocês mais felizes do que a certeza absoluta de irem para o céu?

Foram muitas as expressões de afirmação.

Mas — continuei — digam-me: Acaso muitos de vocês já não tentaram fazer isso que o pregador disse que fizessem? Vocês tentaram abandonar todos os pecados e tentaram tornarem-se santos. Vocês almejaram estar prontos para o céu e fracassaram completamente. Alguns de vocês têm se sentido como se não valesse mais a pena tentar. Vocês se sentem como se ficassem cada vez pior. Vocês vão à igreja e tentam ser religiosos, mas não saem de lá nem um pouquinho melhor. Vocês anseiam fazer o que aquele pregador lhes disse, mas vocês fracassam ao tentar. Porventura não é esta a pura verdade?

As pessoas pareciam ter sido imediatamente convencidas. Então eu disse (dou aqui a essência na medida do que posso me recordar):

— Viajei quase 500 quilômetros para dizer-lhes isto: Deus sabe de nossa total incapacidade; de nossa condição culpada. Sim, Ele nos viu não somente culpados, mas sem forças para melhorar, assim como vocês mesmos já experimentaram. Ele nos viu perdidos, e não era para estarmos perdidos se pudéssemos nos auxiliar a nós mesmos. Um navio em meio às ondas que correm velozes em direção aos recifes não se encontra perdido se a tripulação tiver a mínima esperança de alcançar o porto. Mas vejam: toda a esperança se foi; o navio chegou aos recifes; ele vai se despedaçar. Então, se for para alguém ser salvo ali, terá que ser pelo barco salva-vidas. Vocês estão perdidos! Cada esforço que fazem para tentarem se salvar apenas prova que vocês estão perdidos , PERDIDOS! Oh, para vocês JESUS é o barco salva-vidas que foi enviado! Sim, Deus enviou Seu Filho para “buscar e salvar o perdido”.

Abri, então, as Escrituras, e mostrei-lhes como Deus os amou de tal maneira, perdidos em seus pecados, sem esperanças, e enviou Seu Filho para fazer propiciação pelo pecado. E se eles já tivessem aprendido que não poderiam alcançar santidade ou justiça por suas obras ou por seus próprios esforços, eu tinha agora uma gloriosa mensagem para lhes declarar: o perdão gratuito de seus pecados, por meio de Jesus Cristo o Senhor. Então encerrei, já que estava ficando tarde, todavia não houve uma pessoa que se movesse, e rogaram-me que continuasse falando mais dessas benditas novas. Tive que pregar novamente, devo dizer, por mais uma hora inteira.

“Éreis Trevas”

Muitos dos que leem isto podem ter escutado o evangelho de sua salvação naquela noite. Havia muitos católicos romanos no Mercado do Sal em Glasgow. Muitos foram ouvir e ninguém prestou mais atenção do que eles. Alguns anos depois fui até lá outra vez e, tão logo comecei a caminhar pelo local, fui reconhecido, e isto principalmente pelos católicos irlandeses que vieram e permaneceram do princípio ao fim da pregação, a qual mais uma vez teve que ser prolongada até mais tarde. Cheguei até mesmo a ouvir que eram eles os maiores interessados naquelas pregações. Menciono isto para mostrar a importância de se pregar a graça de Deus, tão necessária a cada alma, em lugar de se ficar atacando as pessoas. Não há nada que exponha mais nossos erros humanos do que a verdade de Deus. E deixe-me lembrar de que um homem em seu estado natural, seja ele católico romano ou protestante, é “trevas” ; não apenas está em trevas, mas é todo ele “trevas”. “Porque noutro tempo éreis trevas , mas agora sois luz no Senhor.” (Ef 5:8) Não existe conhecimento verdadeiro de Deus, não existe luz fora de Cristo: fora dele tudo não passa de trevas morais.

Como no caso que relatei, era bem extraordinária a maneira como o Senhor reunia grandes multidões para escutar a Palavra pregada, sem que houvesse qualquer propaganda como anúncios e coisas do tipo. Quando falei pela primeira vez no Mercado do Sal em Glasgow, conhecia apenas quatro cristãos que moravam ao norte de Scarborough.

CAPÍTULO 10

Yorkshire

Às vezes a fé era provada quando ia a lugares estranhos e ermos. Eu tinha ouvido falar de alguns cristãos pobres, em um vilarejo a uns quinze quilômetros de Penistone, às margens dos pântanos de Yorkshire. Não conhecia nenhum deles, mas um querido irmão, também obreiro, os havia visitado. Num certo dia do Senhor, saí cedo e caminhei quinze quilômetros por uma região de muitos morros. Quando cheguei, eles estavam tendo uma reunião matinal de oração. Encontrei a casa e ajoelhei-me com eles diante do Senhor. Após a reunião, disse-lhes que havia vindo para falar por meu Mestre. Eles pareceram ser bastante acanhados e sem nenhuma pressa em dar as boas-vindas a um estranho. De qualquer modo, ficou combinado que eu pregaria numa casa da vizinhança às três da tarde. Ninguém me convidou para comer, para o que eu estava bem disposto, já que havia tomado meu desjejum às sete e caminhado quinze quilômetros, depois de ter viajado de trem por um trecho. Creio que a razão era a pobreza, e aquelas pobres pessoas estavam envergonhadas de me oferecer do pouco que tinham. Caminhei pelo vilarejo até às duas e então um homem disse-me que, se eu não me importasse de comer o que ele podia me oferecer, ficaria contente em me receber. Entrei em sua casa e sentei-me à mesa. Em uma vasilha escura havia uma espécie de pudim de arroz bem cozido. Acho que estava meio aguado. Bebemos água que foi servida em uma caneca amarela. Aquela foi nossa refeição e, devo dizer, estava grato por ela.

Mas meus novos amigos ainda continuavam envergonhados. Dirigi-me à casa para pregar. Havia uma cadeira de madeira com laterais altas e, sentando-me nela, cantei um hino:

— “Lá há Alguém que é sobre todos, Oh! Quanto nos ama!”

Ninguém entrou para cantar, orar ou escutar. Alguns poucos ficaram à porta ouvindo dali. Com toda certeza, se naquele dia eu estivesse andando por vista, teria me levantado daquela cadeira e ido embora direto para Penistone. Com frequência tenho observado que, quanto maior a dificuldade, maior a bênção. Saí da casa e encontrei alguns de meus acanhados amigos parados ali. O Espírito de Deus levou-me a apontar para uma árvore que havia no pasto. Disse ao homem que estava perto de mim:

— Vê aquela árvore? Se Deus me enviar a pregar ali à hora tal , você verá um grupo de pessoas debaixo daquela árvore.

Não me lembro se disse quatro ou seis da tarde, mas, na hora mencionada, havia um tamanho grupo de pessoas reunidas ali como provavelmente nunca houvera antes naquelas cercanias. O Espírito de Deus deu-me muita liberdade para falar de Sua bondade, como é ilustrada pela história de Mefibosete. E o interesse foi tão grande que as reuniões, tanto fora como dentro da casa, continuaram até à meia-noite. Dormi em um quartinho e, às quatro da manhã, vieram me acordar para outra reunião, antes que eu fosse embora às sete, com destino à estação de Penistone. Como as notícias se espalharam e as pessoas foram reunidas, nunca cheguei a saber. E aquele foi um dos muitos lugares onde nunca mais voltei. Jesus diz: “Tudo o que o Pai me dá virá a mim”, (Jo 6:37) e do mesmo modo como Davi mandou que buscassem Mefibosete, assim também o Espírito Santo pode buscar a quem Ele quer, para que ouça a Palavra e seja salvo. E já que depende dele, não deveríamos deixar que as circunstâncias nos desencorajassem.

os Morávios

Às vezes não podemos, em nenhuma medida, dar conta dos Seus Atos soberanos ou da maneira pela qual Ele cumpre os Seus propósitos. Recebi uma carta do ministro da colônia dos Morávios* em Fulneck, perto de Leeds, dizendo que, de algum modo, havia sido espalhada a notícia de que eu pregaria naquela colônia na noite do próximo dia do Senhor. A ideia de que aquilo se realizaria era de tal modo tida por certa pelos moradores que seria infrutífero qualquer esforço para alterá-la. Deduzi daquilo que a mão do Senhor estava sobre o assunto, e fui. Eu e mais alguns passamos algum tempo em oração na sacristia da capela e, quando saímos, tivemos a maior dificuldade em alcançar o púlpito, tamanha era a concentração de pessoas. Tinham vindo de todas as partes daquela região para aquele grande salão. Fiquei triste ao saber que muitos dos Morávios não tinham podido entrar. Eu estava sendo guiado a falar sobre a “Paz com Deus”, e que nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. (Rm 5:1; 8:1)

[Nota: * A comunidade dos seguidores de John Huss era conhecida como “irmãos Morávios” . Huss nasceu em 1369 e foi queimado vivo em 1415, tendo sido um dos precursores da Reforma.]

Evidentemente era este o assunto de que mais necessitavam, pois, conforme me disse depois o velho ministro, era difícil encontrar uma só pessoa naquela colônia que possuísse a certeza de ter paz com Deus. Não é triste que tão poucos daqueles que são cristãos desfrutem desta bendita certeza? Quantos dos que leem estas linhas talvez não desfrutem deste gozo! E ainda assim, com toda a certeza, Jesus, pelo sangue de Sua cruz, fez a paz para todos os que creem. Foi um tempo verdadeiramente abençoado e não tenho dúvidas de que voltarei a encontrar, na presença do Senhor, muitos daqueles que lá estavam e que naquela noite passaram da morte para a vida.

A Velha Senhora

Porém nem sempre é na pregação pública que Deus expõe Sua graça soberana. Talvez não haja nada que demonstre tal graça de forma mais extraordinária do que no chamado dos idosos; e nas muitas e peculiares maneiras que Ele pode usar para chamá-los por Sua graça. Eu e alguns cristãos tínhamos no coração o desejo de fazer uma longa viagem de carruagem passando pelos povoados de Yorkshire, nos arredores de meu povoado natal, Brookhouse, deixando um folheto em cada casa e pregando o evangelho conforme o Senhor nos dirigisse. Algum tempo depois de passarmos por Whiston, chegamos ao ponto onde uma estrada segue em direção a Laughton e a outra desce a Brookhouse. Senti profundamente que o Senhor tinha algo especial para eu tratar em Brookhouse. Chamei o cocheiro, que também era cristão, e disse-lhe:

— Você deve descer a Brookhouse e parar assim que eu disser.

— Não podemos dar a volta passando por lá — respondeu ele.

— Devemos ir — disse eu — e você pode seguir até Hooton e então voltar.

Descemos para o vilarejo. Eu estava orando ao Senhor para que me guiasse à pessoa certa; aquela que Ele tivesse em mente. Em dado momento senti segurança.

— É aqui! — disse, pedindo ao irmão que parasse a carruagem. Desci e vi que estava exatamente do lado oposto à pequena ponte sobre o ribeiro. Eu conhecia bem aquela ponte de meu tempo de infância e, quando criança, tinha atravessado por ela várias vezes para comprar doces em uma pequena mercearia não longe dali, a qual era cuidada por uma pessoa conhecida como Becky F. Senti-me guiado a ir até lá. Bati à porta. Uma mulher de meia-idade veio atender. Disse-lhe:

— Permita-me perguntar se a Sra. F. ainda vive?

— Sim — respondeu-me ela — ela ainda vive; entre, por favor.

Ela levou-me para a pequena sala de visitas e ali, deitada numa cama, estava a velha senhora, Becky F., à beira da morte. Nem parecia que havia já quarenta anos que não a via. Foi um momento solene. Ela estava perfeitamente lúcida e reconheceu-me. Disse-me:

— É Charles Stanley? Então foi o Senhor Quem o enviou. Estou morrendo; e não tenho ninguém que me diga como posso ser salva e ir para o céu. Oh, diga-me, como posso ser salva?

Assegurei-lhe que Deus havia me enviado para apresentar-lhe, por meio da morte expiatória de Jesus, o gratuito, pleno e eterno perdão dos pecados (Atos 13:38,39). Mostrei-lhe nas Escrituras que a morte expiatória de Cristo estava consumada; que Deus havia ressuscitado a Jesus dentre os mortos; e deixei claro a ela que, por meio dele, todos os que creem estão justificados, e têm paz com Ele.

Como sempre, era a bendita Pessoa de Cristo falando aqueles versículos que têm sido de bênção para tantos; e que ainda serão de bênção para muitos que lerem estas linhas, até que Jesus venha. O Espírito havia preparado aquela mulher bem idosa, que se encontrava à beira da morte, para escutar as palavras de Jesus. Disse a ela:

— Agora é Jesus Quem lhe diz: “na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a Minha palavra, e crê naquele que Me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida”. (Jo 5:24)

Oh, foi algo bendito ver como ela bebeu daquelas palavras vivificantes. Disse-lhe:

— Você ouve estas palavras de Jesus?

— Ouço — respondeu ela.

— E você crê que Deus O enviou; que Deus amou de tal maneira?

— Creio.

— Ele diz que, então, você não entrará em condenação, ou juízo. Você crê nele?

— Creio.

Sim, e isto é totalmente verdade, pois Ele carregou o juízo que era devido a todos os que nele creem.

— Então Ele diz que você passou da morte para a vida. Você crê nele?

— Sim.

Sim, pela graça ela creu nas palavras de Jesus, e passou, tranquila, da morte para a vida. Então lhe disse:

— Vamos agora dar graças.

Ajoelhei-me e dei graças a Deus. Quando me levantei, escutei a carruagem que voltava. Deixei-a, então, como nova criatura prestes a estar para sempre com o Senhor; um abençoado troféu de infinita graça. Em quão variadas formas Deus será glorificado!

Uma Parente em Laughton

Não foi o único caso naquele dia. Dirigimo-nos, então, a Laughton. Descemos, com folhetos, e os distribuímos em cada casa e também às crianças na escola onde eu, quando ainda menino, havia estudado muitos anos antes. Tivemos também uma pregação em frente à capela onde pela primeira vez o Senhor tinha aberto a minha boca para pregar, quando tinha pouco mais de quatorze anos de idade. Fomos então para Firbeck.

Lembrei-me, então, que alguns de meus ancestrais ainda viviam naquele povoado. Bati à porta de uma casa e perguntei se ainda havia alguém com aquele sobrenome vivendo no povoado. Logo me indicaram a casa da cunhada de meu avô, a bem idosa viúva de seu irmão. Ela estava sentada em sua casa, com a porta aberta, cercada por seus filhos, e pelos filhos de seus filhos, que tinham ido visitá-la naquele dia. Ela nunca mais havia me visto desde quando eu tinha oito anos de idade. E ainda assim, por estranho que pareça, reconheceu-me, e sentiu que eu era um mensageiro enviado por Deus. Ela estava ansiosa para ser salva e não tinha ninguém que lhe mostrasse o caminho da vida. Tenho razões para acreditar que Deus fez com que Sua Palavra fosse uma bênção para ela naquele dia. Após aquela ocasião criei o hábito de visitá-la até o dia de sua partida. Apesar de tão idosa, ela foi capaz de caminhar quase dois quilômetros até Roche Abbey, onde tivemos uma pregação do evangelho. Um numeroso grupo de alunos da excelente escola de Worksop estava ali naquele dia e os meninos desejavam nos escutar pregar. Os professores, de bom grado, deram seu consentimento. Os meninos, e também minha idosa parente, escutaram com a mais profunda atenção. Foi um dia feliz de serviço ao Senhor, pois foi gasto em comunhão com Cristo, anunciando o amor de Deus pelos pecadores perdidos. Trata-se de algo muito solene pensar que até mesmo o serviço, se não for feito em comunhão, de nada vale. Não é até mesmo pecado o que é feito sem comunhão com o Senhor?

CAPÍTULO 11

Encorajamento a Jovens Evangelistas

Vou relatar aqui um caso para o encorajamento dos jovens evangelistas que talvez não tenham visto, até o momento, qualquer fruto de seu trabalho no evangelho. Uma velha senhora, chamada Hanna F., viajou oito milhas para escutar um estudo sobre a vinda do Senhor, no Mechanics’ Hall, em Rotherham. Ela estava quase cega, mas Deus Se agradou em lhe abrir os olhos espirituais, e foram duas as coisas que ela aprendeu, pelo poder do Espírito Santo. Deus deu a ela a certeza da salvação eterna e também fez com que conhecesse a bendita esperança do retorno do Senhor para buscar os Seus santos. Estas duas coisas eram completamente novas para ela; nunca tinha ouvido falar nelas antes. Ela voltou para sua casa em Anston, cheia da “paz de Deus, que excede todo o entendimento”. (Fp 4:7) Ela contou ao seu idoso marido, que era cerca de um ano mais velho que ela, as benditas novas que tinha aprendido. O Senhor abriu o coração dele para também receber as boas novas e ambos passaram um bom tempo em adoração e ações de graças.

Três Santos Idosos

Eles tinham um vizinho, um fazendeiro, tão idoso quanto eles. Certo dia, quando estavam ajoelhados dando, juntos, graças por terem sido ambos lavados de todo pecado no sangue do Cordeiro; e por estarem aguardando e ansiando pela vinda do Senhor nos ares para levá-los para Si, o idoso fazendeiro entrou, como de costume, para visitá-los. Mas ambos eram um pouco surdos e encontravam-se tão absortos em ações de graças que não escutaram o vizinho entrar. Este ficou ouvindo maravilhado aquelas palavras que nunca antes tinha escutado; aquele gozo como nunca antes tinha testemunhado. Não se tratava de oração, embora eles estivessem dando graças Àquele que os tinha salvado com uma salvação eterna; que os havia tornado aptos para a Sua santa presença, em pureza e glória. Estavam, em espírito, no céu, não em Anston; falavam com Alguém a Quem conheciam bem, e não se cansavam de falar com Ele. Falavam acerca da Sua vinda a fim de levá-los para Ele. O velho fazendeiro estava completamente perdido em meio ao seu espanto. Finalmente, o idoso casal levantou-se. O visitante disse:

— O que é que significa isso tudo? Tenho ido à igreja por setenta anos e tenho repetido minhas orações; todavia não posso nem dizer que esteja salvo, quanto mais salvo para sempre e salvo perfeitamente! Não, eu certamente não posso dizê-lo. E vocês estavam falando com Deus como se O conhecessem. E o que queriam dizer com a vinda de Cristo para levá-los?

Então a velha senhora Hannah repetiu o evangelho que havia escutado: como Deus amou; como Ele enviou Seu Filho; como Cristo ofertou-Se a Si mesmo, o infinito sacrifício pelos pecados; como Deus declarou que todos os que creem estão justificados de todas as coisas e que Deus não irá jamais Se lembrar de seus pecados e de suas iniquidades. Sim, como foi que, por uma só oferenda, todos os que creem foram para sempre aperfeiçoados. E Jesus assegurou a todos os que ouviram Suas palavras, e creram em Deus que O enviou, que eles TÊM A VIDA ETERNA e que não entrarão em condenação, mas que passaram da morte para a vida. E que Jesus disse-lhes que não temessem; Ele tinha ido preparar um lugar para eles e voltaria para buscá-los. Ela falou do profundo gozo que Cristo dava à sua alma.

Deus fez com que as palavras dela fossem de bênção para o velho amigo fazendeiro. Apesar de ter mais de 80 anos, ele também foi levado a desfrutar da paz com Deus. Como uma criancinha ele recebeu a verdade dos lábios de Hannah. Era celestial a comunhão desses três idosos peregrinos, quando um amigo os encontrou alguns meses depois. Grande parte de seu tempo era gasto juntos em adoração e comunhão, esperando por Jesus vindo do céu. Assim que o fazendeiro via sair fumaça da chaminé da casa vizinha, logo estava com eles, ocupando-se em doce louvor e ações de graças.

Foi, porém, necessário que o idoso casal recebesse cuidados. Hannah já estava cega, e um filho amável os levou à sua casa, a vinte quilômetros dali. Mas como pôde ser separado esse pequeno grupo tão feliz? Como pôde aquele lar ser assim desfeito? Bem, não contaram a eles o que iam fazer. Eles foram levados no que, a princípio, parecia apenas uma visita, e só quando lá chegaram é que foram avisados. Manhã após manhã o querido e velho fazendeiro olhava para ver se saía fumaça da chaminé. Nunca mais saiu e, depois de algumas poucas manhãs, o Senhor disse ao fazendeiro, “Levante-se e venha para cá” . E por mais doce que fosse a comunhão aqui, lá com Ele foi “ainda muito melhor”. (Fp 1:23)

Só encontrei uma vez essa idosa santa, Hannah. Encontrei-a na casa do amigo que pela primeira vez falou-me sobre eles, e sinto meu coração derreter-se dentro em mim quando me recordo de nossa conversa. Ela estava então já bem cega, mas podia verdadeiramente dizer: eu era cega e agora vejo. Um idoso templo do Espírito Santo, adequado a Ele. É impossível dar qualquer ideia de Hannah, santa e aguardando o Senhor; tão plena de Cristo. Por isso, meus queridos irmãos, não fiquem desencorajados, pois pode ser que não vejam o fruto durante um bom tempo. Bendita verdade: “Terei misericórdia de quem Eu tiver misericórdia”. (Rm 9:15) Oh, as riquezas da graça de Deus em encontrar e chamar o idoso! Ele será glorificado por cada um dentre aquelas miríades que cantarão Seu louvor Àquele que é digno: “o Cordeiro, que foi morto”. (Ap 5:12)

O Velho do Casaco Cinza

Enquanto pregava no Salão de Reuniões em Bournemouth, fiquei muito interessado em um velho senhor vestido com um longo casaco cinza e roto. Eu já havia conversado com ele várias vezes. Ele era como alguém que já tivesse chegado diante do Senhor à porta do tabernáculo, mas que nunca tivesse colocado sua mão sobre a cabeça da oferta pelo pecado (Lv 4). Nunca pareceu existir nele o vínculo de uma fé verdadeira no sacrifício do Filho de Deus. Eu estava falando sobre Rm 7:1-3 e explicando a base sobre a qual não pode haver condenação para o crente que está EM Cristo. Expliquei que Jesus não somente tomou nossas iniquidades e as levou para longe, e que Deus O ressuscitou de entre os mortos, sem pecado, para nossa justificação; mas também que o pecado, a própria raiz de todos os pecados, tinha sido totalmente, e para sempre, julgada. “Deus, enviando o Seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado (ou por um sacrifício pelo pecado) condenou o pecado na carne”. (Rm 8:3) Portanto nada ficou para ser julgado. Após a pregação o idoso senhor aproximou-se, e disse:

— Agora vejo tudo. Agora tenho paz com Deus. Tudo já foi feito; meus pecados foram julgados e o próprio pecado de minha natureza foi julgado, condenado; e tudo está terminado. Nenhuma condenação.

Ele foi embora para o albergue onde morava, um humilde barraco. Sua vida tinha sido reduzida a nada; todos os seus filhos haviam morrido e ele perdera suas propriedades. Tinha chegado ali com sua última filha e abrira uma loja para ela com os últimos recursos de que dispunha. Mas os negócios fracassaram e a filha morreu. Ele já não tinha um centavo, mas naquela noite voltou para o albergue justificado de todas as coisas; e ele sabia disso e tinha paz com Deus. Sentou-se numa poltrona e contou às pessoas que moravam com ele que agora tinha paz com Deus; agora estava pronto para partir. Sua cabeça pendeu para trás e, calmamente, seu espírito partiu. Partia para estar para sempre com o Senhor.

O Segredo do Sucesso

Não devemos nos esquecer de um grande segredo do sucesso na pregação do evangelho. Trata-se de algo que tem chamado minha atenção por toda a vida, e hoje mais do que nunca, quando já se passaram mais de 53 anos que, em meio a muita fraqueza, venho pregando a palavra de Deus. Há muito que notei o cuidado do apóstolo Paulo em demonstrar que ele não era servo de nenhum partido e que não tinha autoridade delegada por qualquer fonte humana, nem mesmo pelos apóstolos em Jerusalém . Ele podia dizer, “Paulo apóstolo, não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que O ressuscitou dos mortos”. (Gl 1:1-24) Sem dúvida o Espírito Santo já previa que, também neste aspecto, os homens iriam usurpar a autoridade que pertence a Cristo.

Mas porventura não é tão importante, para o mais débil servo de Cristo, ser o servo de Jesus Cristo agora , como era para Paulo no início? Pense só no que é receber a comissão do próprio Cristo e ser Seu servo somente, não importando qual seja o estado atual da igreja. “Procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando a homens, não seria servo de Cristo.” (Gl 1:10) São palavras que mexem conosco. Quem as pode falar com sinceridade de coração? Certamente tais palavras não colocam de lado algo tão abençoado como é a comunhão dos santos. Mas a igreja não dá autoridade ao servo do Senhor para pregar a Palavra, como é claramente visto nas passagens acima. Bem, então se eu sou servo de Cristo, o que desejaria Ele que Seu servo fizesse em qualquer lugar aonde fosse por Ele enviado? Qual é o profundo desejo de Cristo para todos os que são Seus em qualquer lugar? Qual é o desejo de Deus para todo o mundo, ou para os inconversos em determinada região? Vamos dar um exemplo.

No Distrito Escocês

Recebi duas cartas anônimas do centro de um grande distrito escocês, para que fosse lá e pregasse o evangelho completo, inclusive a vinda do Senhor Jesus. A última carta trazia tanta urgência que deduzi ser da vontade do Senhor que fosse ajudá-los. Usamos o Auditório Municipal e demos quatro palestras sobre a segunda vinda de Cristo, com um profundo sentimento do amor de Cristo para os Seus santos naquela região. Não tinha nenhuma intenção de formar um partido, ou de servir a um partido, mas, como servo de Cristo, servir a todos os que pertenciam a Ele.

O salão ficou cheio e muitos cristãos, em um raio de muitos quilômetros, vieram para escutar. Eles estavam profundamente interessados, mas depois de uma conversa com eles, ficou evidente que não compreendiam algo que lhes era completamente novo. Conseguimos, então, uma sala onde cabiam umas quarenta pessoas. A princípio ela ficou cheia com os pregadores locais, líderes, etc., todos com liberdade para perguntar ou fazer observações. Logo a sala ficou tão cheia que fomos obrigados a voltar a usar o Auditório Municipal, e também a pregar o evangelho nas noites do dia do Senhor. O número de pessoas cresceu tanto que as leituras passaram a ser mais como palestras.

Por todo um ano essas reuniões tiveram continuidade e a maioria, se não todos os cristãos daquele distrito, ouviram a Palavra. Creio ter sido um dos anos mais felizes de meu serviço para Cristo. Tinha que viajar 30 quilômetros duas vezes por semana, mas tratava-se de algo peculiarmente abençoado seguir em frente na certeza da presença de Cristo, e no pleno e desimpedido gozo da simpatia expressada em Seu amor para com todos aqueles que o Pai Lhe havia dado, não tendo nenhum outro objetivo senão o de servi-Lo e agradá-Lo.

Muitos dos pregadores locais ficaram bastante surpresos quando aprenderam a verdade de Hb 9:27,28. Até então, eles tinham estado a pregar um julgamento geral, de todos e para todos — o dia do juízo final. A verdade que pareceu ser a primeira que surpreendeu a todos foi a de que Cristo sofreu o juízo pelos que Lhe pertencem, os quais, por esta razão, nunca mais poderão entrar em julgamento por seus pecados. Antes eles liam a passagem de Hb 9:27,28 como se ela se referisse a todos os homens que morressem, vindo, depois da morte, o juízo. Nunca haviam notado não ser este o seu significado e nem tinham percebido o contraste com o versículo seguinte: “Assim também Cristo, oferecendo-Se uma vez, para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que O esperam para salvação”. (Hb 9:28) Tampouco eles haviam jamais percebido que Jesus assegura aos crentes que estes não entrarão em julgamento , que é a maneira como a palavra deveria ser traduzida em Jo 5:24. O valor infinito do único sacrifício de Cristo foi também compreendido então, e verdadeiramente fez com que a paz fluísse para eles como um rio. E a vida eterna, como algo presente, o que antes consideravam um grande erro, passou a ser para eles motivo do mais profundo gozo. A redenção eterna também os introduziu em um perfeito descanso em Deus.

Muitas Perguntas

Se alguém pudesse se lembrar de todas as perguntas que foram feitas naquelas reuniões, daria para encher um livro. Vamos apenas mencionar uma delas. Estava falando sobre Romanos 3, principalmente sobre a justiça de Deus, quando o homem havia provado não possuir nenhuma justiça de si próprio, sendo ele, não apenas culpado, mas estando na condição de completamente perdido, e sendo incapaz de guardar a lei e basear-se nela para ser justo. Um pregador local levantou-se de repente, no meio do salão lotado, e disse:

— Sr. Stanley, quero fazer-lhe uma pergunta: Se um pai desse a seu filho um dever a cumprir, que bem sabia não ser ele capaz, e então, por seu filho não ser capaz de cumpri-lo, seu pai o açoitasse, seria isso justo?

Todos se voltaram para mim esperando por uma resposta.

— Sr. B., você tem sido um pregador aqui por quarenta anos.

— Sim — ele respondeu — é verdade.

— Você já encontrou algo mais difícil do que convencer um homem de que ele é um pecador perdido?

— Não, creio que não.

— Muito bem, então vou tão somente supor que você é o capitão de um barco salva-vidas. Você foi enviado para resgatar a tripulação de um navio que vai se despedaçar contra os recifes. Você sabe que não existe esperança para eles, que não poderão levar o navio até o porto. As leis de navegação são coisas boas em si mesmas, mas não podem ajudar essa tripulação; tais leis não têm poder algum para exercer sobre o navio. Você vê que eles estão obstinados, mas que nada podem fazer. Você não iria parar a cem metros de distância para discutir as leis de navegação. Você não iria dizer a eles que fizessem a parte deles e que viessem se encontrar com você a cem metros de onde estavam. Não, você iria até eles e os abordaria, e, assegurando-lhes ser impossível que se salvassem a si próprios, você os tiraria do navio condenado e os levaria ao porto. Agora, Sr. B., será que você seria censurado por estar agindo assim?

A esta altura o Sr. B. já tinha se esquecido de sua pergunta quase infiel, e respondeu:

— Não, não acho que seria.

Procurei explicar a eles como Cristo era o barco salva-vidas, enviado para salvar aqueles que estavam perdidos e que não poderiam salvar-se a si próprios. E porventura não é assim, querido leitor? A lei de Moisés, ou melhor, a lei de Deus, não seria de maior proveito para a salvação de uma alma, perecendo nos recifes da culpa e do pecado e sem poder para escapar, do que as leis de navegação, para ajudar a salvar a tripulação de um navio que estivesse se despedaçando nas rochas. Ainda assim o homem é cego para não enxergar a graça de Deus, que enviou o barco salva-vidas depois de haver dado primeiramente a lei para convencer o homem de sua condição perdida e sem esperanças. Seria justo aqui perguntar se qualquer que levanta tais sofismas reconheceu-se, algum dia, verdadeiramente perdido. Quantos há por aí que ainda precisam conhecer a completa ruína do homem caído!

O Espírito Santo

A presença do Espírito Santo sobre a terra, e o fato de ser Ele uma Pessoa verdadeira e real, era também uma novidade para aquelas pessoas, o mesmo acontecendo com a bendita verdade de que todos os crentes são batizados por um Espírito em um só corpo (1 Co 12:13). E também que, conforme a Palavra de Deus, há “um só corpo”, assim como há “um só Senhor”. Tudo isso os surpreendeu grandemente, quando posto em contraste com os muitos corpos religiosos criados pelos homens. Pois o Senhor me deu grande liberdade, uma vez que eu considerava a todos os cristãos daquele distrito igualmente como membros do corpo de Cristo; e pela graça de Deus procurei apresentar a eles todo o conselho de Deus. E o gozo com que estas verdades foram ouvidas e recebidas nunca poderá ser esquecido.

Houve uma pessoa que deu uma viva descrição das reuniões. Ela disse-me:

— Deve ser muito fácil falar em reuniões assim.

— Por quê? — perguntei.

— Bem — disse ela — eles são como um ninho de passarinhos cheio de filhotes, e todos eles com suas bocas abertas.

E era exatamente assim. Foi maravilhoso ver tanto homens como mulheres vindos de longas distâncias, no rigor do inverno para beber da Palavra da vida.

Partindo o Pão

Após doze meses, eles sentiram as palavras do Senhor Jesus acerca do partimento do pão: “Fazei isto em memória de mim”. (Lc 22:19) Disseram que havia chegado a hora de obedecerem ao Senhor. Disse a eles:

— Se forem fazer isso, deverá ser algo vindo de vocês para o Senhor somente . Durante doze meses procurei declarar todo o conselho de Deus; e todos podem testemunhar que nunca levantei um dedo, ou falei uma palavra sequer, para pedir que saíssem de suas capelas ou igrejas. Se vocês agora forem se reunir para partir o pão, não estarei com vocês se isso tiver a mínima aparência de eu estar liderando para que me sigam. Deve ser algo feito para o Senhor.

No dia do Senhor que se seguiu, cerca de vinte e cinco se reuniram para comemorar a morte do Senhor. Contaram-me depois ter sido uma ocasião de grande bênção, e tiveram tal sensação da presença do Senhor como nunca antes haviam experimentado. Logo muitos outros se reuniram com eles para o Senhor. Assim era no princípio: Pedro pregava e o Senhor reunia (Atos 2).

Amados companheiros e servos de Cristo, não fiquemos desencorajados. “A noite é passada, e o dia é chegado.” (Rm 13:12) Nossa esperança não é que a igreja seja restaurada à sua ordem e à unidade visível aqui neste mundo. Não. O apóstolo podia dizer, bem no começo da obra de Deus na Europa: “Pois qual é a nossa esperança, ou gozo, ou coroa de glória? Porventura não o sois vós também diante de nosso Senhor Jesus Cristo EM SUA VINDA?“. (1 Ts 2:19) Entretanto, é certo que somos responsáveis em procurar guardar a unidade do Espírito.

Hoje muitos deixaram aquele povoado; alguns estão com o Senhor, aguardando junto com Ele; outros estão aqui ou acolá. O que é de Deus permanece para sempre. Todos aqueles que o Pai deu a Jesus logo irão se encontrar, onde não haverá mais dispersão.

Estendemo-nos um pouco mais na história da obra de Deus naquela localidade pois ela ilustra a experiência de quase uma vida toda no serviço de Cristo. Seja escrevendo ou pregando, sempre encontrei bênçãos e resultados proporcionalmente à comunhão com Cristo em Seu amor para com toda a igreja; e nenhum cristão poderá prosperar em sua alma a menos que esteja buscando o bem-estar de outros. Ele deve ir a Cristo e beber, e então “rios d’água viva correrão do seu ventre”. (Jo 7:38) Possamos servir assim ao Senhor em harmonia com Seu próprio coração. Eu poderia acrescentar página após página de coisas que aconteceram no Seu abençoado serviço, mas espero não ter ainda esgotado a paciência de meus leitores.

Após uma ausência de quatro anos voltei àquele mesmo lugar, e encontrei muito frescor e bênção. A Deus seja dada toda a glória.

CAPÍTULO 12

A Experiência de Uma Vida

Com aquilo que provém da experiência de toda uma vida, procurarei agora dar alguma ajuda àqueles que desejam ser servos de Cristo, e falar mais acerca de como Deus abriu as Escrituras da verdade à minha alma.

Já contei como fui levado a estudar a epístola aos Romanos. Não se tratou de um trabalho de alguns meses, mas de uma vida — sempre descobrindo o quão pouco eu conhecia daquela maravilhosa epístola que apresenta as verdades que são um verdadeiro fundamento. A pedido de um companheiro na obra, o resultado daquelas meditações foi posteriormente publicado. Nada menos do que a revelação da justiça de Deus em justificar o pecador pode dar sustento à alma, seja quando está passando pelo temporal da tentação, do mundo, da carne ou do diabo; ou quando está fielmente pregando o evangelho a outros. Gostaria de insistir enfaticamente, a todos os jovens pregadores do evangelho, para que estudem Romanos em oração, como o alicerce e a revelação da justiça de Deus.

Não há dúvida de que é de grande bênção pregar o amor de Deus, porém você descobrirá que isto só não irá manter sua própria alma em paz, e nem dar provas de serem duradouras as boas novas aos seus convertidos. O amor de uma mãe é muito precioso; mas se uma filha caiu em pecado e em desgraça precisou fugir de casa, quando estiver caminhando nas ruas de uma cidade distante, na desventura do pecado, acaso que a lembrança das lágrimas e do inabalável amor daquela mãe irão fazer a filha feliz? De modo nenhum. Porém, se alguém puder dirigir-se àquela criatura caída e dizer-lhe que o amor de sua mãe encontrou uma maneira de restaurá-la ao lar e às afeições dela, com todo o seu pecado e a sua vergonha para sempre dissipados, para nunca mais serem lembrados — estas sim serão as boas novas para aquele coração partido. Oh, fale primeiro de como o Pastor morreu pelas ovelhas; então diga como o Espírito Santo veio buscar e achar o perdido; então diga como o Pai tem Seu próprio gozo em receber o pródigo perdido. Sim, se Deus amou este mundo de tal maneira, foi para dar Seu filho para ser levantado na cruz.

Mantenha sempre em mente Deus revelado em Cristo. Não se tratou do homem reconciliando a si próprio com Deus, mas de Deus reconciliando Consigo o mundo. O evangelho é o que Deus é e o que Ele fez enviando Seu Filho para morrer por nós e ressuscitar. Como a filha distante de sua mãe, na desventura do pecado, assim nós também estávamos distantes — Oh! E quão distantes de Deus! — em indizível desventura do pecado. E quanto fez Deus para nos redimir para Si próprio! Sim! Cantem, oh céus, pois o Senhor fez isto!

Dependência do Espírito Santo

Outra coisa em que gostaria de insistir é numa sincera dependência do Espírito Santo, seja para uma vida santa ou para a pregação do evangelho. Quanto à primeira, devemos aprender que “em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum”. (Rm 7:18) Oh, quão difícil é esta lição para a maioria de nós! Procurar qualquer esperança no aperfeiçoamento da carne sempre acaba em fracasso. Fazer isso é buscar fazer a vontade de Deus e, ainda assim, quando menos se espera, fracassar apenas para descobrir a vileza do coração humano. Sim, o eu deve ser completamente posto de lado e Cristo ser tudo. Devemos clamar com Ezequias: “Ó Senhor, ando oprimido! Fica por meu fiador!” E então, com profundo e indizível gozo no coração, sermos capazes de dizer: “Que direi? Como mo prometeu, assim o fez”. (Is 38:14,15) Ou então, devemos exclamar como alguém sob a lei, “Miserável homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte? Dou graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor”. (Rm 7:24,25)

Podem passar anos antes de realmente apreendermos as riquezas de Sua graça e as profundidades da Sua misericórdia. Quando nos chamou, Ele conhecia tudo o que nós éramos e tudo o que faríamos, mas nós não. Mas Ele prometeu, e cumpriu! Todas as nossas iniquidades foram lançadas sobre Ele. Deus cumpriu, “enviando o Seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne; para que a justiça da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o espírito”. (Rm 8:3,4) O modo do livramento torna-se claro desta maneira: Aprendemos que o velho “EU” , meu velho ser, foi completamente julgado e condenado na santa Pessoa de meu Substituto. Tudo o que sou está julgado e colocado fora da vista de Deus, não sendo mais reputado a mim ou considerado como sendo eu. O Espírito Santo torna isto verdadeiramente conhecido em minha alma. Sou agora de um mesmo parecer e de uma mesma opinião com Deus acerca da carne, isto é, acerca de mim mesmo como descendência de Adão. Portanto desisto de qualquer esperança de andar na carne. Desisto de meu velho eu que é ruim em sua totalidade.

A Liberdade do Espírito

E o que vem então? Será que isso tudo me leva a andar em pecado, ou na carne? Não! Mas a andar no Espírito. Assim é que “a lei do espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei do pecado e da morte.” (Rm 8:2). Se eu quiser andar na carne, e nessa condição buscar guardar os mandamentos, estarei sujeito a cair na mais profunda impiedade transgredindo-os; pois acabarei descobrindo que a lei do pecado em meus membros é demais para mim. Mas se desisto de tudo o que sou, reconhecendo-o como algo ruim, perdido e incapaz de melhorar, a nova lei do Espírito de vida ocupa completamente o lugar do eu . Então, oh quão bendito é, passo a desfrutar da atuante liberdade do Espírito de vida.

Às vezes esta libertação é compreendida na conversão, mas raramente isso acontece quando Deus nos chama na infância. Em tempos de fraqueza e tentação aprendemos a considerar os outros superiores a nós mesmos (Fl 2:3). E, oh, o quanto aprendemos das riquezas de Sua graça! Mas é quando conhecemos como somos conhecidos que passamos a aprender a dizer na sua totalidade: “Digno és, oh Cordeiro de Deus”. É aí que também aprendemos o quanto necessitamos do Todo-suficiente sacerdócio de Cristo, para nos ajudar sempre que precisamos, e de Sua intercessão como Advogado, para nos restaurar quando falhamos. Passaremos por uma triste experiência se negligenciarmos a leitura da Palavra. Precisamos do lavar contínuo, não mais do sangue de Jesus, mas do lavar da Palavra. A marca característica de uma alma que não está em trevas, mas andando na luz, é que “o sangue de Jesus Cristo, Seu Filho, nos purifica de todo o pecado”. (1 Jo 1:7) Sem esta luz para a alma, não há poder para um andar santo.

Portanto, para um andar assim, deve haver completa dependência no Espírito Santo. E não pode haver menos do que isso para se pregar a Palavra a outros. Por estar ativamente envolvido em negócios, com frequência tinha que ir pregar após haver passado por um dia difícil de trabalho, em viagens comerciais ou nas responsabilidades e dificuldades da fábrica, dispondo de apenas um pouco de tempo para buscar o Senhor em oração, às vezes sem saber, até o último momento, qual passagem das Escrituras iria usar. Ainda assim posso dizer, para o encorajamento de outros, que aqueles foram com frequência meus dias mais felizes no refrigério da alma e na percepção da presença do Espírito Santo, sem o que toda pregação é totalmente em vão. Posso dizer o mesmo que disse alguém que agora já partiu para seu descanso: “A melhor maneira é nunca permitir-se o pensamento de que você vai pregar acerca de determinada passagem das Escrituras. Estude as Escrituras para as necessidades e o proveito de sua própria alma, mas sem qualquer compromisso de estar se preparando para pregar. Então, fale daquela ou de qualquer outra passagem, conforme o Espírito o dirigir” .

A Segunda Vinda de Cristo

É também algo da maior importância que o servo de Cristo examine as Escrituras que falam da segunda vinda do Senhor Jesus. O apóstolo Paulo sempre teve esta bendita esperança diante de si; e posso até dizer que sem isto o evangelho não está completo. O efeito da pregação de Paulo era de converter os homens a Deus para esperar a Seu Filho vindo do céu. Não há dúvida de que esta bendita esperança traz uma reviravolta e acrescenta novas cores a cada pensamento em seu coração. Como acontece com muitos que descobrem que o ensino dos Milleritas* é muito carnal e terreno, fui levado a examinar as Escrituras livre de toda a literatura e opiniões dos homens; e fiquei fortemente abalado pelo fato de que a verdade, como me era revelada na Palavra, era exatamente a mesma que estava sendo revelada a muitos outros em diferentes partes do mundo, os quais, naquela época, nem se conheciam. Pois foi extraordinário como em muitos lugares, e pelos mais variados meios, os cristãos foram guiados à mesma bendita expectativa da vinda do Senhor Jesus para levar a Sua Igreja antes das tribulações que virão sobre esta terra.

[Nota: *os seguidores de William Miller (1782-1849) eram conhecidos como Milleritas , dos quais se originou o Adventismo do Sétimo Dia.]

Em certo lugar que visitei, um garotinho de oito anos de idade havia lido um versículo das Escrituras que falava dos mortos em Cristo; que iriam ressuscitar primeiro quando Jesus viesse. A criança não era capaz de encontrar outra vez o versículo e pediu a seus pais que o procurassem. Eles nada sabiam acerca de tal ideia, mas examinaram as Escrituras até que, não apenas encontraram 1Ts 4:14-18, como também ficaram muito interessados e, logo, bem informados sobre o assunto da segunda vinda de Cristo. E muitos outros foram escutar e abraçaram a bendita esperança. Creio que milhares foram assim ensinados pelo Espírito na Palavra; e então, quando acabaram entrando em contato uns com os outros, descobriram que tinham exatamente a mesma compreensão. E, acima de tudo, essas não eram meras especulações, mas tratava-se da Pessoa e da vinda do próprio Senhor como o objeto de uma esperança próxima. Onde a verdade da vinda do Senhor foi recebida diretamente das Escrituras, teve, invariavelmente, um efeito de separação. Era, como muitos diziam, uma segunda conversão.

Devo acrescentar que atualmente é da mais extrema importância examinar as Escrituras, e não meramente ler livros, já que muitos não passam de devaneios da mente humana. Eu poderia muito bem especificar a que livros me refiro, porém prefiro aconselhar: examinem as Escrituras. Os folhetos que escrevi sobre este bendito assunto estão exatamente como os escrevi há anos — eles são simplesmente o resultado da leitura da Palavra. Se algum leitor desejasse ter uma simples referência das passagens sobre o assunto da vinda do Senhor, poderia achar o livreto “Diagram Tract” útil para este propósito; todavia rogo a cada um que examine as Escrituras no temor do Senhor.

CAPÍTULO 13

A Igreja, O Corpo de Cristo

Há outro assunto com o qual o leitor humilde da Palavra irá com certeza se deparar, e que no início poderá lhe causar certa surpresa, se comparar o que encontra nas Escrituras com o que vê ao seu redor. Refiro-me à Igreja, o corpo de Cristo. Ele encontrará palavras como “um só corpo”, “um só Espírito”, “um só Senhor”. (Ef 4:1-5) Irá encontrar também palavras como, “Todos nós fomos batizados em um Espírito formando um corpo” (1 Co 12:13), e muitas passagens assim. Ficará cada vez mais claro para o leitor que, no princípio, todos os cristãos formavam o único corpo de Cristo. Havia um só corpo, tanto quanto verdadeiramente havia um só Senhor.

Ele então perguntará: Como pode ser isso, se hoje há muitos corpos formados por cristãos? Logo irá perceber que não são a esses corpos que se refere o “um só corpo”, e nem tampouco são todos esses corpos que formam o “um só corpo”, pois 1 Co 12 lhe ensinará que o corpo é composto por membros individuais . Se o leitor for simples como uma criança, logo aprenderá que o corpo de Cristo, a Igreja, é composto de todos os verdadeiros crentes agora sobre a terra. Todavia, ele descobrirá as divisões se multiplicando. O que deve fazer? Antes de terminar, vou dizer ao leitor um pouco acerca de como o Senhor tratou comigo neste assunto. São questões muito tristes que, com certeza, criam obstáculos à caminhada do servo de Cristo.

Você Permanece Nesta Verdade?

A primeira questão é esta: Será que reconheço a verdade do único corpo? A verdade de que todos os crentes, desde o dia de Pentecostes, são membros desse único corpo? Que todos os crentes agora formam esse único corpo aos olhos de Deus ? A questão seguinte é: Desejo eu, particularmente, agir em conformidade com esta verdade; amar a todos os que são do Senhor e procurar servi-los? Não importa o que os outros façam, será que desejo realmente traçar meus caminhos em conformidade com esta grande verdade — a verdade do “um só corpo”? Sei que há outros que fazem o mesmo. Não que assumam, por um momento sequer, ser eles o “um só corpo”, mas buscam não reconhecer qualquer outro corpo que não seja o “um só corpo” de Cristo, composto por todos os que pertencem a Ele. Se encontro outros que desejem andar em conformidade com a Palavra de Deus, então seguramente posso ter comunhão com eles. Mas se os lobos se introduzem e dispersam, e se homens se levantam falando coisas pervertidas para arrastar discípulos após si, então existe a necessidade de separação do mal. Quando a realidade é esta, será que o cristão que deseja andar no temor do Senhor deve desistir de tudo, sem ter esperanças? Ou, se o mal for generalizado, deve o cristão permiti-lo e seguir adiante juntamente com o mal? O cristão encontrará estas perguntas claramente respondidas na Palavra de Deus. Em meio a todo o mal dos últimos dias, ele ouvirá das Escrituras: “Qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade”. “Segue a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro, invocam o Senhor.” (2Tm 2:19-22) Desistir de tudo?! Não! “Tu porém PERMANECE naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido.” (Leia 2 Tm capítulos 2 e 3:)

A Direção das Escrituras

— Mas — você poderá dizer — como vou saber quem está certo, em tempos de tanta confusão?

Você já notou qual é o primeiro preceito que aparece em Efésios, a epístola que, mais que qualquer outra, revela a Igreja? “Pelo que deixai a mentira, e falai a verdade cada um com o seu próximo; porque somos membros uns dos outros.” (Ef 4:25) E leia cuidadosamente cada palavra até ao final do capítulo. Se todos os crentes andassem em conformidade com estes preceitos, seria impossível haver divisões. Tampouco será muito difícil descobrir quem age, e quem não, em conformidade com estes abençoados princípios. Ah, é a condição da alma a raiz de toda divisão . Falsa aparência, amargura, más conversações, orgulho espiritual, vaidade, mundanismo, desejo de se obter honra . Se andamos no temor do Senhor não teremos dificuldade em discernir o que vem do diabo.

Ainda assim há muitos jovens, ah, e também velhos cristãos, que estão em grande tristeza pelo estado de ruína que prevalece na igreja professa; e muitos evangelistas sendo dolorosamente impedidos em seu trabalho. Gostaria de poder ajudar essas pessoas. Será que você tem, diante de si, a esperança certa? Será que a sua esperança é que a igreja seja apresentada gloriosa na vinda do Senhor? Bem, esta esperança não mudou e está mais perto do que quando cremos. Ou será que você tem acalentado alguma esperança indefinida da igreja sendo restaurada aqui na terra? Se assim for, não há dúvida de que ficará bem desapontado. Ou será que você, sem perceber, acabou deixando que escorregasse para dentro de seu pensamento a ideia de que a igreja tenha sido restaurada, e que algum determinado grupo de cristãos é a igreja restaurada? Não se espante se descobrir seu erro.

Bem, mesmo que você esteja na plena posse do privilégio que o cristão tem, de guardar tudo o que aprendeu da Palavra de Deus concernente à Igreja de Deus, ainda assim gostaria de trazer um assunto que tem sido de grande conforto à minha própria alma nestes dias de tanta perplexidade. Muitos irmãos ainda se lembram de quase todas as últimas palavras de alguém que agora já se encontra com o Senhor, quando tivemos uma última reunião de leitura com ele: “Irmãos, não negligenciem o ministério de João” .

O Ministério de João

Que lugar tem, na Palavra, o ministério de João em seus escritos inspirados? Posso aqui tão somente chamar sua atenção para esta importante indagação. Você deve ter notado a extraordinária ordem, ou o desenrolar, da revelação no Antigo Testamento, desde Gênesis até Malaquias. Mas será que você estudou cuidadosamente a ordem em que foi deixado o Novo Testamento, pelo menos no que concerne às datas que conhecemos? Estaria fora do propósito deste livro entrar em detalhes, mas observe apenas que a igreja é vista em ordem até cerca do ano 65 D.C. Isto está assinalado em 1 Tm e Tito. Bispos ou anciãos, e diáconos, são ali oficialmente reconhecidos. A mudança que aconteceu em cerca de um ano pode ser vista lendo-se 2 Timóteo, 2 Pedro e Judas. A igreja fracassou como testemunho para Deus sobre a terra. Enganadores e corruptores introduziram-se dissimuladamente nela, e por um tempo a inspiração cessou; sim, como se costuma reconhecer, isso permaneceu assim por um período de 25 anos. Não devemos nos esquecer de que, por todos aqueles anos, a igreja foi vítima do declínio e fracasso.

Então o Espírito Santo, por intermédio de João, falou da igreja como algo que tão somente havia fracassado na terra e que devia ser julgado (Apocalipse 2 e 3). Dentre as assembleias daquela época, foi escolhida uma e seu estado descrito nas epístolas de João; todavia, uma ordem completamente diferente tinha sido estabelecida ali, com um só homem assumindo a autoridade. E era algo tão contrário aos verdadeiros princípios da igreja de Deus que esse homem recusava-se a receber até mesmo o próprio apóstolo João! Não é deixada nenhuma dúvida quanto a se Deus, por meio de seu idoso servo João, aprovava ou não essa nova ordem que, não tenho dúvidas quanto a isso, acabou se tornando algo generalizado (2 João).

Se, por meio de João (nas epístolas e no Apocalipse), o Espírito estava colocando a igreja diante de nós para julgar suas falhas (embora recomendasse um fraco remanescente em Filadélfia); e se a imagem mostrada seria o último aspecto da igreja, com profusão de anticristos; e se aquele último aspecto iria continuar durante o tempo da paciência de Deus desde então, o que é que o Espírito nos apresentaria como aquilo que iria permanecer até a última hora? Se a igreja fracassaria como um testemunho, o que é que não iria fracassar? A Pessoa e as glórias de Cristo . Na primeira epístola João escreve: “O que era desde o princípio…“. Em Apocalipse começa, “Revelação de Jesus Cristo”. No evangelho está: “No princípio era o Verbo”. Quando tudo fracassou, foram reveladas as glórias e o parentesco eterno do Filho, que nunca falham. Deus é revelado no Filho, “o Filho Unigênito, que está no seio do Pai, este O fez conhecer.” (Jo 1:18)

Então, quando somos tristemente provados pela ruína do homem, pela ruína da igreja enquanto ainda na terra, sim, pelo triste pecado e a dor de tudo o que é do homem, quão bendito é nos voltarmos para a última revelação plena de Deus em Cristo. Isto será cada vez mais importante à medida que as trevas descerem sobre este pobre mundo e sobre a igreja professa.

Instruções Para Tempos Difíceis

Repito que devemos guardar toda a Palavra inspirada de Deus. Mas será que aquela plena revelação do Filho de Deus, a Fiel Testemunha de Deus, que foi dada tantos anos depois das outras, não tem um lugar todo peculiar? Uma coisa é certa: mesmo durante a presente cena de ruína, Ele mantém para conosco os mesmos cuidados e afeições de Seu relacionamento com o Pai. Se tudo o que é eclesiástico se desmorona, ainda assim temos as mais urgentes instruções para os filhos de Deus .

No evangelho de João é o Pai Quem é revelado em Cristo; o infinito amor de Deus para com o mundo, Jesus, o Cordeiro de Deus, levantado na cruz, para que todo aquele que nele crê possa ter vida eterna. Este evangelho fala das boas novas a toda criatura, embora assinale a soberania divina em quase cada uma de suas páginas. Ele diz: “Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora”. (Jo 6:37) Não se esqueça disso. Então repare como Deus, em Cristo, foi rejeitado pelos homens religiosos, os judeus. “Veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam.” (Jo 1:11) Eles O rejeitaram, e neste evangelho são deixados de lado. A graça soberana reserva um remanescente. A salvação não era pela encarnação; Ele devia morrer, ou então ficar só (Jo 12:24).

Veja então o quanto temos no evangelho de João que é omitido nos outros evangelhos. Veja do capítulo 13 ao 17. Se os nossos olhos estiverem abertos veremos tudo isso como uma resposta aos erros e desvios daquela que tem sido chamada de igreja neste, e deste, mundo. Vamos citar apenas alguns? Quanto à ceia do Senhor, o grande erro cometido durante séculos foi o de transformá-la num sacrifício pelos pecados. O Senhor diz aos crentes nascidos de Deus: “Vós estais limpos”. (Jo 13:10) Então Ele toma da água, e não do sangue, para lavar os pés dos discípulos. A obra do altar de bronze está consumada; e agora é a vez da pia, a lavagem da água pela Palavra (compare com Ef 5:26). Jesus ocupa o lugar do cordeiro pascal da redenção, e Sua redenção é eterna. É possível que até mesmo quando o evangelho de João foi dado, já estivesse havendo um abuso da ceia do Senhor. O Espírito bem sabia como ela acabaria sendo colocada no lugar de Cristo; e ela, a saber, a ceia do Senhor, mal é mencionada neste evangelho. O capítulo 13 mal passa da ceia da Páscoa. Em meio a tudo isso, é O PRÓPRIO SENHOR Quem é colocado diante de nós. Quando pensamos no que é feito da eucaristia*, é notável que João, o último escritor inspirado, nunca a mencione!

[Nota: * Ou eucharistia , palavra derivada do grego eucharistô , que significa “dar graças”, e é celebrada, como um sacramento, por alguns segmentos da cristandade que acreditam que o pão e o vinho se transformam no corpo, sangue, alma e divindade de Cristo, conservando a aparência de pão e vinho.]

Além disso, quão universal tem sido o erro de que verdadeiros cristãos deveriam entrar em juízo naquele grande dia! Isso tudo estava previsto. Jesus nos assegurou que não seria assim (Jo 5:24). Não; Ele diz: “Não se turbe o vosso coração… virei outra vez e vos levarei para Mim mesmo”. (Jo 14:1-3)

E qual é o remédio para todas as conflitantes formas eclesiásticas de governo na igreja? Simplesmente a presença do Espírito Santo na Terra, conforme prometido nos capítulos 14, 15e 16. Que esteio, conforto e segurança para todos os crentes, se realmente cressem que o Espírito Santo, como uma Pessoa, está tão verdadeiramente sobre a terra agora como Jesus estava naquela época com Seus discípulos. Porventura não teria você naquela época confiado em Cristo? E não confiará você agora no Espírito Santo, aconteça o que acontecer?

 ”Porém” , diz o evangelista, “quanta tristeza tenho em meu coração quando vejo almas convertidas e não sei para onde guiá-las. Vejo que aquilo que leva o nome de igreja está imerso em contendas e também, com frequência, em amargas divisões; algumas arrogando para si mesmas o título de ‘a igreja’; e querendo ser reconhecidas como tal” . E a muitos outros ocorre a ideia de que temos a liberdade de fazer conforme o nosso pensamento. Não gosto disso. Se você deseja conhecer a vontade de Cristo, irá encontrá-la revelada e pronta para suprir o que você necessita para esta situação. Você descobrirá que um dos objetivos de Sua morte expiatória foi o de “reunir em um corpo os filhos de Deus, que andavam dispersos”. (Jo 11:52) E repare bem que foi depois de haver começado essa última hora de ruína, com sua abundância de anticristos, que os anseios de Seu coração em Sua oração foram registrados pela inspiração (Leia Jo 17). Acaso não orou Ele por todos os que nele cressem, “para que todos sejam UM, como Tu, ó Pai, o És em Mim, e Eu em Ti”? Sim, não importa qual possa ser o estado daquilo que é chamado igreja, certamente cada verdadeiro crente buscará corresponder ao desejo do coração de Cristo. Demos apenas algumas poucas sugestões para o estudo dessa última manifestação inspirada do Espírito Santo — os escritos de João.

O Que é de Deus?

Quão grande é o interesse que isso nos dá nestas últimas epístolas. Então, como é que sabemos o que é de Deus e o que é do diabo? Nada pode ser mais simples e certo. “Quem comete pecado é do diabo”; “qualquer que é nascido de Deus não comete pecado.” (1 Jo 3:8,9) Estas duas coisas caracterizam os filhos de Deus e os filhos do diabo. “Nisto são manifestos os filhos de Deus, e os filhos do diabo. Qualquer que não pratica a justiça… não é de Deus.” (1 Jo 3:10) Nenhuma impiedade jamais foi superada sobre a Terra como a que começou a se desenvolver nos dias dos escritos de João, ou antes disso.

Alguém poderá perguntar: Será que esta instrução divina é um guia suficiente e seguro hoje? Não há dúvida quanto a isto. Se uma obra for de Satanás ela poderá vir tanto por intermédio de homens, como de anjos de luz; mas cedo, bem cedo, deixará as marcas descritas em 1 jo 3:6-15. O diabo é um mentiroso; e sua obra se revelará em falsidade e em um espírito de ódio contra os irmãos; do mesmo modo, aqueles mais usados por Deus serão certamente os alvos do ódio. Invariavelmente é isto o que acontece, sejam quais forem as pretensões de se praticar justiça. Olhe ao longo da história daquela que se denomina a si mesma “a igreja” , ou daqueles verdadeiros filhos de Deus nesta derradeira hora, e você encontrará que se aplica o que está descrito nesta epístola. Assim ocorre no presente momento; e se os filhos de Deus andarem na paciência de Cristo, e em Sua bondade e humildade, experimentarão isso.

Sim, queridos obreiros, guardemos firmes a justiça de Deus conforme é revelada em Romanos, e a proximidade da igreja a Cristo como está em Efésios; as instruções especiais em 2 Timóteo, quando o mal já se introduziu, e cada verdade revelada para nós em toda a Palavra de Deus. E não nos esqueçamos da instrução especial dada nos escritos de João para quando tudo tivesse falhado nas mãos do homem. Não falarei aqui do lugar especial que tem o Apocalipse de Jesus Cristo, já que escrevi um folheto sobre isso.

Amados companheiros obreiros, nosso tempo e oportunidade para o serviço logo estará terminado. Quão cedo iremos ver Sua face, e estaremos com Ele, e como Ele, para sempre. Ele diz: “Eis que venho sem demora; guarda o que tens, para que ninguém tome a tua coroa”. (Ap 3:11) Que possamos estar aguardando por Ele enquanto O servimos. Se estes poucos relatos, dentre os muitos que ocorreram por Sua bondade e misericórdia, forem usados para o encorajamento do coração de alguns, isto será o meu gozo. E a Ele seja o eterno louvor.

CAPÍTULO 14

Como Andar no Dia Mau

A publicação deste livro acabou sendo feita com alguns anos de atraso. É difícil escrever sobre aquilo que diz respeito a nós mesmos, a menos que seja para expor as riquezas da graça de Deus demonstrada para com o principal dos pecadores. O pleno desenvolvimento e o caráter blasfemo da má doutrina está chegando rapidamente ao seu ápice. Como iria o Senhor guiar Seus servos para andarem em tempos assim? Nem tanto atacando o mal, mas retendo a verdade, “a batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos”. (Jd 1:3) Isto só pode ser feito prestando-se atenção à Palavra de Deus. “Toda a Escritura divinamente inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, para instruir em justiça.” (2 Tm 3:16)

Vamos meditar um pouco nisto. Não quer dizer que as Escrituras tenham sido dadas por inspiração de homens. Não se tratava do que eles pensavam, mas única e tão somente do pensamento de Deus. Ele não nos deixou na incerteza, mas, com toda a certeza, nos falou, e Sua Palavra é verdade. Não é o que diz o homem. Não é o que diz a igreja. Possamos nós ter ouvidos para ouvir o que o Espírito diz às assembleias. Que tesouro inestimável são, portanto, as Sagradas Escrituras: Deus falando a nós. De nada valerá olharmos para elas através dos, por assim dizer, espetáculos criados pelos homens, ou escutá-las explicadas por autoridade humana. Devemos, individualmente, escutar o que Deus nos diz. Dizermos que só cremos no que Deus diz se meu ministro ou minha igreja assim afirmar, é colocar o homem entre minha alma e Deus; sim, é exaltar o homem acima de Deus. E, no entanto, com que frequência isto é feito.

Quão cheio de graça, quão coerente Consigo mesmo foi Ele em nos haver dado uma revelação divina e certa de Si próprio em Sua Palavra! Esta revelação é completa: não há uma continuação. Mas quão pouco a temos estudado e examinado! Quão pouco compreendemos de sua plenitude! Para muitos, o objeto distinto do Espírito em cada livro das Escrituras é muito pouco compreendido e, por esta razão, quanta confusão há! Passagens são com frequência citadas, as quais, se examinadas, mostrariam referir-se a assuntos totalmente diferentes.

A Justiça de Deus

Vamos dar um ou dois importantes exemplos: A justiça de Deus. Como é comum isto ser citado a partir de versículos como Romanos 3:21-26, como se significasse a justiça de Cristo. Acaso não é essa uma confusão grande e séria? Porventura não está tão claro quanto as próprias palavras podem expressar, que se trata da justiça de Deus em justificar o crente, tanto antes que Cristo viesse, como depois — a justiça de Deus sem a lei, ou totalmente aparte da lei? De maneira nenhuma baseada no princípio da lei, mas “sendo justificados gratuitamente pela Sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus, ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no Seu sangue, para demonstrar a Sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus; para demonstração da Sua justiça neste tempo presente, para que Ele seja Justo e justificador daquele que tem fé em Jesus”. Este grande fundamento da verdade, em como Deus é Justo em justificar, mal é ouvido, até mesmo na pregação evangélica.

Li cuidadosamente as pregações que foram feitas em Exeter Hall e em outros lugares em defesa do evangelho, quando este foi atacado por hostes de ministros infiéis; e agradeço a Deus pelo zelo de tantos que falaram. No entanto somos obrigados a dizer que, quanto ao assunto da justiça de Deus, a trombeta deu um som dos mais incertos. Nenhum indagador sincero poderia dizer, a partir daquelas pregações, o que significa a justiça de Deus. Ela é muito confundida com a justiça de Cristo. Longe de mim procurar me opor àqueles homens entendidos e dotados. Apenas gostaria de ajudar. Estou certo de que nada poderia ajudá-los mais, e à toda a igreja de Deus, do que uma compreensão mais clara sobre este assunto.

Então, o que é a justiça de Deus? E o que é a justiça de Cristo? Justiça, é a perfeita consistência de caráter e de ações, em conformidade com o relacionamento de um ser com outros ou consigo mesmo. Assim, a justiça de Deus é a perfeita harmonia de Seus atributos em Sua maneira de tratar com todos os seres criados — perfeita coerência Consigo mesmo, e isto em justificar o ímpio pecador. Como poderiam, o Seu perfeito amor para comigo, um pecador, e Seu infinito ódio por meus pecados, estar em absoluta harmonia? A obra da redenção e da infinita propiciação por meus pecados, e a substituição sobre a cruz, é a única resposta possível de Deus a esta terrível questão. Bendito seja Deus, Ele é Justo, e meu Justificador! Ponha-se o homem com toda a sinceridade diante de Deus como um pecador culpado, e então ele encontrará no evangelho a única revelação possível da justiça de Deus em justificá-lo. Assim, é “pela redenção que há em Cristo Jesus” (Rm 3:24) que Deus é Justo em justificar o pecador. As Escrituras não dizem que Deus justifica o ímpio pela justiça de Cristo imputada ao pecador para restaurá-lo diante de Deus, como se ele tivesse guardado a lei e nunca tivesse falhado em guardá-la. Trata-se de um evangelho bem diferente tentar restaurar o homem, sendo este um filho caído do primeiro Adão; e não existe um erro a que estejamos mais sujeitos do que este.

A Justiça de Cristo

Tendo em mente, portanto, que a justiça de Deus é o completo propósito de Deus de dar salvação ao homem culpado, do primeiro ao último, e que este propósito foi cumprido por Cristo na redenção, vamos então indagar: O que é a justiça de Cristo? E também, o que é a redenção que Ele consumou? O leitor pode não estar sabendo, mas não existe exatamente nas Escrituras uma expressão tal como a “justiça de Cristo” . 2 Pe 1:1 é a que mais se aproxima. Mas ali fala de Seu senhorio. Podemos dizer, no entanto, que os evangelhos apresentam o único Homem justo e perfeito que jamais pisou nesta terra: perfeito e em absoluta harmonia com a vontade e o pensamento de Deus; coerente em cada relacionamento Seu. Porém essa obediência tinha que acabar em morte na cruz. Ele devia morrer, ou ficar só, para que a obediência de Um pudesse suprir toda a necessidade do pecador, a fim de que muitos pudessem ser feitos justos (Rm 5:18,19). Para poder fazer isto, Ele tinha que ser a vítima sem mancha, sem pecado, como está escrito: “Àquele que não conheceu pecado, (Deus) O fez pecado por nós; para que NELE fôssemos feitos justiça de Deus”. (2 Co 5:21)

Assim, “o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que crê”. (Rm 10:4) Cada tipo e sombra, cada sacrifício, a mais alta exigência e a maior maldição da lei sobre o culpado (e é isto, culpados, o que certamente somos) puderam encontrar o seu fim exatamente em Cristo. Deus é glorificado nas alturas dos céus, em absoluta justiça em justificar o culpado. Sim, a justiça de Deus é exaltada acima dos mais altos céus, diante de todo o universo. Louvai ao Senhor!

Mas porventura será isto o mesmo que Cristo guardando a lei e depositando isto na conta do homem para restaurá-lo, tornando boa a sua situação perante Deus, como alguém que tivesse cumprido a lei? Será que a justiça viria assim pela lei? Se assim for, não existe nenhum significado na redenção. E devemos notar que, onde quer que este evangelho seja pregado, mesmo não se tratando de outro evangelho, a redenção não é compreendida e raramente se faz menção dela.

A Redenção

O que é redenção? Agora, antes de ler mais uma linha, pegue uma folha de papel e escreva o que você entende por redenção, principalmente se você tem professado que Cristo guardando a lei é metade de nossa salvação, e Sua morte expiatória é a outra metade.

Vamos usar um tipo dado pelo próprio Deus como ilustração: a redenção de Israel do Egito. Seria necessário ter acontecido uma história bem diferente para ilustrar esse evangelho diferente. Tome apenas um ponto em Êxodo 5. Eles encontram-se em amargas cadeias como escravos; não têm palha, e não podem fazer a quantidade de tijolos que lhes é exigida. Encontram-se em completa angústia. Será que Moisés, como uma figura de Cristo, faz os tijolos que faltam para eles? Será que os tijolos feitos por Moisés lhes são imputados para que completem a contagem que era legalmente exigida? Não existe tal pensamento em nenhuma figura do Antigo Testamento e nem em qualquer versículo do Novo.

A redenção não é a melhoria ou o aperfeiçoamento do homem como escravo do pecado e de Satanás; mas, como aconteceu no Egito, é a retirada do homem do lugar de escravidão e ao mesmo tempo a sua introdução em um novo lugar e em uma nova condição. E isto só podia acontecer pelo sangue do Cordeiro. E acaso não é a mesma coisa, seja quando falamos da atual redenção de nossas almas por Seu precioso sangue, ou da redenção ainda futura de nossos corpos na ressurreição? Trata-se de transportar aquilo que foi resgatado de um estado para outro. A redenção não é a melhoria ou aperfeiçoamento do velho homem. Quando Israel passou através das águas, uma figura da morte, eles estavam mortos para a lei da produção de tijolos no Egito. Eles saíram completamente daquela posição. Porventura não é exatamente este o segredo do poder do crente para uma vida santa e justa, mesmo enquanto ainda está aqui? Estando morto para o pecado (Rm 6:11), será que não é para ele considerar-se assim? E não está ele também morto para a lei? “Assim, meus irmãos, também vós estais mortos para a lei pelo corpo de Cristo, para que sejais doutro, daquele que ressuscitou de entre os mortos, a fim de que demos fruto para Deus.” (Rm 7:4)

Esta é a maneira de Deus. A maneira do homem é exatamente oposta. O homem diria: “Se você for nascido de Deus, deve estar casado com a lei para produzir fruto guardando-a; e nos pontos onde falhar, a obediência de Cristo à lei será colocada em sua conta para completar sua parte” . Será que alguma alma pode ter paz ou libertação deste modo? Leia todo o capítulo de Romanos 7. É exatamente esse o caso: um homem nascido de novo, mas ainda sob a lei, tentando achar algo de bom na carne, encontra-se naquela grande agonia que todos bem conhecemos: ele não pode completar sua quota de tijolos. Não é de um pouco mais de tijolos para completar sua quota, ou de um ajudante, que ele precisa. Ele descobre que não existe nada de bom na carne. Por ser nascido de Deus ele tem prazer na lei de Deus; mas, ah! aquela outra lei em seus membros…! Ele precisa da completa libertação, e a encontra em Cristo.

Em Cristo

— Bem — você poderá dizer — eu, pela graça de Deus, tenho crido no perdão gratuito dos pecados, pela morte expiatória de Cristo. Será que isso é tudo? Não me sinto satisfeito.

Devo dizer que é algo bendito escutar e crer, que “por Este se vos anuncia a remissão dos pecados”. (Atos 13:38) E mesmo quanto a esta parte do evangelho, é bom saber do bom testemunho que Deus deu. Jesus não somente foi entregue por nossas ofensas, mas Deus ressuscitou da morte a Jesus nosso Senhor, e o fez exatamente com este propósito, tendo em vista isto de que tanto necessitamos: “Ressuscitou para nossa justificação”. (Rm 4:24,25) Crendo nisto somos considerados justos. “Sendo pois justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo.” (Rm 5:1) Sim, somos justificados de todos os nossos pecados; contados como justos pelo que Cristo fez por nós sobre a cruz. Mas Paulo não somente pregou este perdão gratuito por meio de Jesus, mas disse também: “NELE é justificado todo aquele que crê”. (Atos 13:39 – tradução literal.) Se somos crentes, o que é que não temos em Cristo ? Será que você diz que quer ter a certeza de possuir justiça? “EM Jesus Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e JUSTIÇA, e santificação e redenção.” (1 Co 1:30) Você quer ter a certeza de que não existe condenação para você? “Portanto agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus .” (Rm 8:1)

Será que você diz: Quero que esta velha natureza pecaminosa seja melhorada e deixada boa para o céu? Ah, não existe tal pensamento nas Escrituras. Não; sobre a cruz o Santo de Deus foi enviado “em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne”. (Rm 8:3 e 2 Co 5:21) Não; a justiça de Deus é vista tanto condenando nossa natureza pecaminosa sobre a cruz, como em Jesus carregando nossos pecados; e assim, pela cruz, Ele colocou de lado, para sempre, o velho homem com os seus feitos, e dá ao crente um novo lugar em Cristo, o segundo ou último homem.

Oh, pense no que é estar em Cristo . Era este o propósito de Deus antes da fundação do mundo, que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor; porém sendo tudo isso “nele” (Leia Ef 1:3-7). E note que Deus nos tem considerado nele , em conformidade com Seu eterno propósito. Não; não se trata do velho homem restaurado e transformado num bom judeu debaixo da lei. Marque bem estas palavras: Nós não conhecemos a Cristo segundo a carne. Não se trata de Moisés fazendo os tijolos sob a lei, mas, “se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo. E tudo isto provém de Deus”. (2 Co 5:15-17)

De que pode o crente necessitar, ou o que pode desejar mais, além de graça para andar de modo digno desta elevada vocação em Cristo Jesus? Ele é, assim, nossa justiça, mas não para tornar bom o homem sob a lei, mas por Ele ser o que é agora; por ser o que foi feito para nós, como ressurreto dentre os mortos. Tal como Ele é assim somos nós, e tudo provém de Deus. Oh, que diferença é sentida e desfrutada, quando chegamos ao fim de toda a esperança na carne sob a lei e encontramos tudo em Cristo ressurreto! Não mais eu, mas Cristo. Oh Deus, nosso Pai, abençoa estas poucas observações para o livramento de muitas almas; e ao Teu nome seja todo o louvor!

Charles Stanley foi chamado para o lar celestial no dia 30 de março de 1890, após uma vida devotada ao serviço de Cristo.

 

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