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A Dificuldade em Conciliar “O Mundo” na Bíblia e a Responsabilidade de Ensinar Doutrina

 Alguém que me escreveu no WhatsApp:

Alguém entrou em contacto para tirar dúvidas sobre os “vasos de desonra” e, ao estudar de madrugada, percebeu uma aparente tensão bíblica: Deus amou o mundo, mas o Senhor Jesus disse que não rogava pelo mundo. Ele relacionou isso com as passagens do Evangelho de João (14:17; 15:19; 17:9), onde aparece o contraste entre o mundo e os discípulos, o ódio do mundo e a intercessão exclusiva pelos que pertencem ao Pai.

Citou também o Livro dos Salmos 58:3, entendendo que ali os ímpios se desviam desde a concepção, concluindo que isso indicaria uma incapacidade de crer. Ligou esse pensamento com o que o Senhor disse no Evangelho de João 10:26 (“vós não credes porque não sois das minhas ovelhas”) e com João 8:43, onde é dito que alguns são incapazes de ouvir a Palavra.

Depois de ler o devocional, disse que compreende que somente o Senhor conhece quem é trigo e quem é joio e que nós não podemos saber isso. Em seguida, afirmou que certas conversas e assuntos doutrinários mais profundos não devem ser expostos aos irmãos novos, citando o ensino do apóstolo Paulo sobre leite espiritual e alimento sólido. Para ele, o melhor é pregar apenas a fé em Cristo aos mais novos, evitando temas como a forma correta de congregar e o partir do pão, pois alguns não suportariam ouvir tais assuntos e isso poderia causar problemas.


Minha Resposta:

A questão que levantou é importante e merece ser tratada com calma, porque envolve textos que, à primeira vista, parecem conflitar, mas que, quando observados no seu contexto, mostram uma harmonia perfeita entre o amor de Deus, a responsabilidade humana e a distinção clara entre o mundo como sistema e as pessoas do mundo.

  1. Quando a Escritura diz que “Deus amou o mundo” (Evangelho de João 3:16), está a falar da humanidade perdida — todos os homens, sem exceção, objeto do amor e da oferta universal de salvação.

  2. Quando o Senhor afirma: “Eu não rogo pelo mundo” (Evangelho de João 17:9), Ele refere-se ao mundo como sistema moral e espiritual afastado de Deus: valores, princípios e caminhos que O rejeitam. Cristo intercede somente pelos que são Seus — mas isso não anula o Seu amor por todos, nem a oferta universal da vida eterna.

Essas duas verdades não se contradizem. Pelo contrário, completam-se. Deus ama o pecador, mas é contra o sistema rebelde em que o pecador está inserido. O amor de Deus nunca justificou o mundo; o mundo nunca aceitou esse amor.

A confusão também se desfaz quando consideramos a distinção entre o que Deus sabe e o que Ele manda pregar. O Senhor conhece perfeitamente quem é trigo e quem é joio (Evangelho de Mateus 13:24–30). Nós não sabemos, nem devemos tentar descobrir. O nosso dever é anunciar o evangelho a todos e aguardar que o Espírito Santo opere por meio da Palavra.

Quando o Senhor disse aos judeus: “Vós não credes porque não sois das minhas ovelhas” (Evangelho de João 10:26), não estava a falar de pessoas que nasceram predestinadas à perdição, mas de um povo que, naquele momento, rejeitava deliberadamente a Sua Palavra. As ovelhas são identificadas pela resposta à voz do Pastor. A incredulidade deles não era uma sentença imposta, mas um estado espiritual resultante da rejeição persistente.

O mesmo se aplica ao que citou no Livro dos Salmos 58:3 — é uma descrição moral do homem afastado de Deus desde cedo, não uma declaração de impossibilidade absoluta de crer. A Bíblia está repleta de exemplos de pessoas profundamente afastadas que se converteram ao Senhor. O ponto do texto é mostrar a natureza decaída do homem, não colocar um selo de condenação inevitável.

Quanto à ideia de que certos temas devem ser evitados com crentes novos, concordo consigo: há assuntos que são alimento sólido e que exigem maturidade (1 Coríntios 3:1–3; Epístola aos Hebreus 5:12–14). Mas aquilo que é fundamental — o evangelho, a clareza sobre a salvação, a segurança eterna, a simplicidade da congregação ao Nome do Senhor — nunca deve ser escondido. Ensina-se com graça, no tempo certo, mas sempre com fidelidade.

O mais importante é isto: a porta permanece aberta, a chamada é universal, a responsabilidade do homem é real, e a certeza de quem pertence ao Senhor está segura nas mãos d’Aquele que “conhece os que são seus” (2 Timóteo 2:19). A nossa tarefa é anunciar Cristo, com clareza e amor. O resultado é obra do Espírito através da Palavra.

Se quiser aprofundar algum ponto específico que mencionou, estou à disposição.

Josué Matos