Alguém que me escreveu no YouTube:
Uma dúvida, se o novo nascimento é somente pela vontade de Deus, como podemos ser responsabilizados pelo não nascer de novo? Se, após nascer de novo, somos novas criaturas, como o homem pode rejeitar? Ninguém pode se recusar a nascer.
Minha Resposta:
A dúvida levantada é compreensível e toca num ponto sensível da doutrina do novo nascimento. Ela surge, em geral, quando se tenta explicar essa verdade bíblica usando apenas categorias humanas ou lógicas naturais, sem considerar o conjunto do ensino das Escrituras.
Em primeiro lugar, é preciso afirmar claramente duas verdades bíblicas que caminham juntas, e não se contradizem:
1. O novo nascimento é, de fato, uma obra soberana de Deus.
2. O homem é plenamente responsável por crer ou rejeitar o testemunho que Deus lhe dá.
O erro surge quando se tenta separar essas duas verdades ou colocá-las em oposição.
O novo nascimento procede da vontade de Deus, mas Deus decidiu operar essa obra por meios definidos, e não de forma arbitrária ou independente da resposta humana. As Escrituras não dizem apenas que o homem “nasce de novo”, mas explicam como isso acontece.
O Senhor Jesus declarou a Nicodemos que “aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus” (Evangelho segundo João 3:3). Mais adiante, Ele esclarece que esse novo nascimento ocorre “da água e do Espírito” (Evangelho segundo João 3:5). A “água”, no contexto do ensino bíblico, está ligada à Palavra de Deus, enquanto o Espírito é o agente que aplica essa Palavra ao coração.
O apóstolo Pedro confirma isso ao dizer que fomos regenerados “pela Palavra de Deus, viva e que permanece para sempre” (Primeira Epístola de Pedro 1:23). Da mesma forma, Tiago afirma que Deus “nos gerou pela Palavra da verdade” (Epístola de Tiago 1:18). Portanto, o novo nascimento não acontece à margem da Palavra, mas por meio dela.
Aqui entra a responsabilidade humana. Deus chama, Deus fala, Deus testemunha por meio da Sua Palavra. O homem, ao ouvir, é confrontado com a verdade e chamado a responder. É por isso que o Senhor Jesus diz: “Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida” (Evangelho segundo João 3:36). Note que a condenação não é atribuída ao fato de não ter sido regenerado, mas ao fato de não crer.
A Escritura nunca apresenta o homem como alguém passivo diante do Evangelho. Pelo contrário, ela afirma repetidamente que o homem “resiste”, “rejeita”, “não quer vir” e “endurece o coração”. O próprio Senhor Jesus lamenta sobre Jerusalém: “Quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos… e tu não quiseste” (Evangelho segundo Mateus 23:37). A vontade do homem é claramente mencionada.
A objeção “ninguém pode recusar nascer” só faria sentido se o novo nascimento fosse um ato imposto, automático e independente da fé. Mas a Bíblia não ensina isso. Ela ensina que ninguém pode produzir a vida nova por si mesmo, mas também ensina que essa vida é concedida àquele que crê. “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome” (Evangelho segundo João 1:12). Receber e crer são atos conscientes e responsáveis.
Quando alguém rejeita o Evangelho, essa pessoa não está a rejeitar o novo nascimento em si, mas está a rejeitar o testemunho de Deus acerca do Seu Filho. E ao rejeitar o Filho, rejeita também a vida que está n’Ele. O apóstolo João é claro: “Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida” (Primeira Epístola de João 5:12).
Portanto, o homem não é responsabilizado por “não nascer de novo” como se isso fosse um evento imposto que lhe foi negado arbitrariamente. Ele é responsabilizado por rejeitar a luz que lhe foi apresentada. “E a condenação é esta: que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz” (Evangelho segundo João 3:19).
Quando alguém nasce de novo, torna-se, de fato, uma nova criatura (Segunda Epístola aos Coríntios 5:17). Mas essa nova condição não elimina a realidade de que, antes disso, o homem foi confrontado com a verdade e chamado a crer. A regeneração não anula a fé; ela é o resultado da fé produzida pela Palavra, sob a ação do Espírito Santo.
Assim, a harmonia bíblica permanece intacta: Deus é soberano na salvação, o Espírito Santo é o agente do novo nascimento, a Palavra é o meio, e o homem é responsável por crer ou rejeitar. Não há injustiça em Deus, nem violência à responsabilidade humana. Há, sim, graça oferecida, verdade proclamada e uma resposta exigida.
Josué Matos
