A paternidade de Deus

Introdução

A paternidade de Deus é um das grandes doutrinas fundamentais da Bíblia. É uma verdade preciosa que permeia todas as Escrituras, é abrangente e atrativa na amplitude da sua apresentação, e uma compreensão completa do seu ensino é essencial para uma apreciação de tudo o que o povo de Deus desfruta através das “abundantes riquezas da sua graça pela sua benignidade para conosco em Cristo Jesus” (Ef 2:7). Da mesma forma, é básica para endossar a verdade da filiação eterna do Senhor Jesus, um fato que está constantemente sob ataque e é repetidamente questionado. Este é um assunto que abrange toda a eternidade, é vital para tudo que a Palavra de Deus apresenta, tanto doutrinariamente como em relação às dispensações, e é muito desafiante e ao mesmo tempo confortador na sua aplicação prática. Em vista da abrangência e amplitude do assunto, devemos considerá-lo sob seus aspectos principais e variados.

Doutrinariamente

Deus tem muitos títulos. Por exemplo, o primeiro título usado na Bíblia é Eloim (Gn 1:1), que ocorre cerca de duas mil e quinhentas vezes ao todo, e fala principalmente do Seu poder. Outro título é Adonai, que representa Deus como Soberano, Senhor, Mestre, e salienta Suas posses. Jeová e os títulos derivados refletem os atributos da Suapessoa e provisão. El Shaddai retrata o esplendor da Sua preeminência. O título usado em Efésios 1:17, “o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória”, revela a totalidade das Suas características paternas.

Quando Paulo entregou aquela impressionante mensagem “no meio do areópago” (At 17:22), ele declarou que “somos também sua geração” (v. 28). Naquela ocasião ele revelou que temos uma relação criatorial com Deus, mas fica claro que nem todos conhecem a Deus como “Pai”. Tal conhecimento só pode ser desfrutado através de um relacionamento com o Filho. João 1:18 deixa claro que “Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou”. Novamente João 14:6 ensina que “ninguém vem ao Pai, senão por mim”.

Igualdade

Quando o Senhor Jesus ensinou que Ele era o Filho de Deus, Ele estava fazendo uma declaração inconfundível de que Ele está em igualdade com o Pai; igualdade em todos os atributos de Divindade, tais como existência eterna, grandeza, poder, honra e glória. Na intimidade da sua oração sacerdotal, o Senhor Jesus orou para que os Seus fossem um, e depois acrescentou, de forma muito instrutiva: “como nós somos um” (Jo 17:22). O Senhor também confirmou a igualdade deles, quando na Sua resposta à pergunta de Filipe ele explicou: “Quem me vê a mim vê o Pai” (Jo 14:9).

Expressão

Deus tem comunicando com os homens desde os dias de Adão. Os versículos iniciais de Hebreus 1 mostram que Deus tem falado de muitas maneiras, em tempos diferentes, aos pais pelos profetas, mas “falou-nos nestes últimos dias pelo Filho” (v. 1). Aprendemos que o “Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou” (Jo 1:18). Quando o Senhor declarou: “Eu sou o Alfa e o Ômega” (Ap 1:8), Ele estava indicando que Ele era o alfabeto de Deus aos homens — Aquele que revelava a Deus plena e perfeitamente. O relacionamento eterno entre o Pai e o Filho, baseado na absoluta e perfeita igualdade, deveria encher o coração de cada cristão com adoração, embora reconheçamos que vai muito além da nossa compreensão entender plenamente a maravilha da igualdade e glória que nunca conheceu princípio.

Aparecimento

O Senhor Jesus era consistente no Seu ensino de que Ele vinha do Pai. Isto era algo que os judeus achavam difícil de aceitar, e era a razão da hostilidade contra Ele, como refletido na ocasião registrada em João 10:31, quando “os judeus pegaram então outra vez em pedras para o apedrejar”. Assim como Ele ensinava que vinha do Pai, Ele deixou igualmente claro (Jo 16:28) que quando Ele deixasse este mundo Ele estaria voltando para o Pai.

Endosso

Muito da base doutrinaria para o ensino em torno da “Paternidade de Deus” vem do Filho, e em especial das diversas maneiras como Ele se dirigia ao Pai. Estas formas de se dirigir ao Pai fornecem amplas evidências do relacionamento Pai/Filho que é tão precioso para os que, através da regeneração, pertencem à família de Deus. Vamos notar, especialmente, que o Senhor Jesus falou com o Pai como:

Pai

Em diversas ocasiões Ele falou com Ele como “Pai”. Isto salienta a intimidade do relacionamento entre Pai e Filho. Quão interessante que esta forma é a usada no jardim quando o Filho orou, como temos em Lucas 22:42: “Pai, se queres, passa de mim este cálice; todavia não se faça a minha vontade, mas a tua”. Ele também usa este termo precioso de carinho, “Pai”, em João 11:41; 12:27, 28; 17:1, 21, 24. Estas referências representam situações de grande intimidade, sensitividade e compaixão.

Meu Pai

Devemos notar o uso da expressão “Meu Pai”. O Senhor Jesus sempre tinha a atividade de Seu Pai diante de Si. Ele fala “dos negócios de meu Pai” em Lucas 2:49 e em João 5:17. Ele revelou: “Meu Pai trabalha até agora e eu trabalho também”. A autoridade do Pai era soberana para Ele, como ilustrado através da Sua declaração: “Este mandamento recebi de meu Pai” (Jo 10:18). Ele também usou este título para transmitir a garantia do Pai quanto à segurança do cristão, quando Ele informou os Seus que “ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai” (Jo 10:29). O Senhor Jesus usa esta expressão novamente para enfatizar a associação do Pai com Ele e com os Seus. João 14:23 declara: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele, e faremos nele morada”. Ao observarmos a realidade destas bênçãos totalmente imerecidas, olhamos para frente, com alegre antecipação, para a casa do Pai, lembrando que o próprio Senhor Jesus confortou os Seus ao lhes garantir: “Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito” (Jo 14:2).

O Pai

O uso do título “o Pai” traz mais uma dimensão importante às considerações da Paternidade de Deus. Isto revela, de maneira especial, o que o Pai é essencialmente em Si mesmo — Suas características essenciais. Vamos meditar sobre algumas características do Pai:

Revelação — Tal é a santidade e majestade de Deus que nenhum homem pode olhar para Deus. Moisés “temeu olhar para Deus” (Êx 3:6), e mais tarde só pôde observar a Deus da segurança da “fenda da penha” (Êx 33:22), e “me verás pelas costas; mas a minha face não se verá” (Êx 33:23). Quão maravilhosos é lermos: “Quem me vê a mim vê o Pai” (Jo 14:9).

Atração — O Senhor Jesus, em João 6:44, afirmou enfaticamente que “ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o trouxer”. Reconhecemos que o fato do Senhor Jesus ter sido levantado na cruz é fundamental para atrair os pecadores ao Salvador. Quão precioso ser atraído e trazido a um relacionamento vivo e duradouro com “o Pai”, por meio do Filho.

Adoração — No poço de Jacó o Salvador ensinou à mulher que o “Pai procura a tais que assim o adorem” (Jo 4:23). Que gozo poder nos aproximar do Pai através do Filho, e assim trazer adoração de corações redimidos.

Louvemos nosso Deus que assim o quis;

Louvemos o Cordeiro que morreu por nos;

Louvemos o Pai por meio do Filho,

Que tão vasta obra realizou. (J. Cennick)

Compaixão — “O Pai ama o Filho” (Jo 3:35). É bom meditar no amor do Pai pelo Filho. Isto é totalmente compreensível, mas quando lemos “o mesmo Pai vos ama” (Jo 16:27), isto é totalmente incompreensível, e ao meditarmos nisto, gratidão e adoração afluem para a Sua glória.

Comissão — O Senhor Jesus ensinou os Seus, quando Ele estava prestes a partir, que o Consolador viria. Ele falou acerca do “Espirito Santo, que o Pai enviará em Meu nome” (Jo 14:26). Com frequência refletimos no fato do Pai enviar o Filho ao mundo, mas não devemos subestimar tudo que estava incluído no enviar do Espírito Santo, quando o Filho retornou ao Pai.

Vosso Pai

Enquanto é precioso meditar em Deus como Pai, Meu Pai, e o Pai, há algo pessoal e confortante no título “vosso Pai”. Este título precioso traz a ideia de relacionamento e responsabilidade. Neste contexto especifico é vital observarmos a singularidade do relacionamento entre o Pai e o Filho; isto enche nossas almas de gozo e apreciação quando reconhecemos que Aquele que é o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo foi descrito pelo próprio Senhor como “vosso Pai”. Logo depois do Senhor ter sido ressuscitado dentre os mortos, Ele trouxe consolo e confirmação ao coração de Maria ao falar com ela pessoalmente e informá-la: “Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos, e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” (Jo 20:17). Este relacionamento não somente nos coloca na família de Deus, mas é essencial para revelar tudo o que está disponível através do afeto do coração do Pai e da abundância da Sua mão generosa. Esta verdade preciosa será desenvolvida mais adiante no capítulo, quando tratarmos das dimensões práticas da paternidade de Deus.

Nacionalmente

O relacionamento entre o Pai e o Filho é singular e inquebrável. Tendo traçado a sua glória e grandeza, é apropriado considerar a paternidade de Deus em relação ao Seu povo terrestre — a nação de Israel. Na formação da nação, inicialmente pelo chamado de Abraão das trevas da idolatria, os princípios de graça e eleição estão claramente evidentes em ação. A nação escolhida por Deus e desenvolvida sob Sua supervisão proposital é descrita assim: “Israel é meu filho, meu primogênito” (Êx 4:22). A declaração inconfundível é que Deus é o Pai da nação, e isto é confirmado por Jeremias, que destaca o que a nação significava para Deus. Ele escreve: “Sou um pai para Israel , e Efraim é o meu primogênito” (Jr 31:9).

Uma meditação no relacionamento de Deus com o Seu povo terrestre irá magnificar a preciosidade da Sua: 

Escolha

Deus agiu em bondosa soberania ao fazer Israel o Seu tesouro peculiar. Era o desejo de Deus ter um povo santo ao Senhor Deus, e assim Ele os escolheu para que fossem “o seu povo especial, de todos os povos que há sobre a terra” (Dt 7:6).

Compaixão

A definição de tal escolha também precisa ser contemplada com o pano de fundo da compaixão incomparável de Deus. O amor divino não conhece motivo, está livre de toda condição, e é imutável nas suas características gloriosas. Raciocínio lógico não consegue encontrar nenhuma explicação humana ao considerarmos o fato que “o Senhor não tomou prazer em vós, nem vos escolheu, porque a vossa multidão era mais do que a de todos os outros povos, pois éreis menos em número do que todos os povos, mas porque o Senhor vos amava” (Dt 7:7-8a).

Cuidado

Os relacionamentos de Deus como Pai da nação demonstram que Ele é sempre fiel. Ele constantemente supriu as suas necessidades e agiu diante das dificuldades de toda situação, sem levar em conta os constantes fracassos do povo. Água da rocha fendida, suprimento diário de pão do céu, sandálias que não se gastavam com o uso constante, são apenas alguns exemplos que dão testemunho da fidelidade, do cuidado e da atenção infalível do Pai diante de circunstâncias específicas.

Consistência

Os relacionamentos de Deus com a nação demonstraram o Seu repúdio ao pecado e desobediência. O pecado precisa ser castigado, consequências de afastamento precisam ser encaradas, e as lições ensinadas sob a mão disciplinadora de Deus devem ser levadas em conta. Não confiar em Deus e entrar na terra fez com que eles peregrinassem no deserto, e muitos não foram permitidos entrar “por causa da sua incredulidade” (Hb 3:19).

Causa

Um dos grandes propósitos de Deus de ter um povo para Si era para que pudesse habitar “no meio deles” (Êx 25:8). Mais tarde, o Tabernáculo daria lugar ao Templo, mas o princípio de Deus habitar no meio do Seu povo tinha sido firmemente estabelecido.

Controle

Além de guiar os movimentos da nação, Deus regulamentou a sua maneira de viver por meio das exigências da Lei. Tudo isto estabeleceu que a nação deveria prestar contas Àquele que tinha o direito de exercer todo aspecto da disciplina e controle de um Pai.

Temos muito que aprender dos relacionamentos de Deus com o Seu povo, nacionalmente. “Porque tudo o que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança” (Rm 15:4). Muitas vezes a história se repete e deixamos de aprender com as lições do passado. Isto deve ser triste para nosso Pai.

Individualmente

Embora seja um grande incentivo olhar ao passado e observar tudo o que Israel desfrutou corporativamente, apesar de não o merecer, é importante que nós, como filhos de Deus da presente era da graça, comecemos a apreciar e desfrutar de tudo que é nosso, individualmente. Embora o relacionamento de Deus com Israel era corporativo e terrestre, o nosso é individual e celestial. Fazemos bem em meditar neste relacionamento tão privilegiado. Pedro, na sua primeira epístola, usa esta bendita realidade como uma grande fonte de incentivo aos cristãos individuais que eram alvos de tribulações diversas e severas. Deveria ser igualmente encorajador para nós no meio das dificuldades da vida.

A bênção individual do cristão é uma verdade que é apresentada na carta aos Efésios. De acordo com o Seu caráter celestial, precisamos lembrar que tudo que desfrutamos é atribuído ao “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais no lugares celestiais em Cristo” (Ef 1:3). Estas bênçãos são ampliadas no cap. 1 da epístola, e notamos que Deus “nos abençoou” (v. 3), “nos elegeu” (v. 4); “nos predestinou” (v. 5); “nos fez agradáveis a si no amado” (v. 6); “fez abundar para conosco” (v. 8); “descobrindo-nos o mistério” (v. 9).

Todas estas bênçãos são dadas aos que, como indivíduos, primeiramente creram em Cristo depois que ouviram a palavra da verdade, o Evangelho da salvação (Ef 1:12-13). Quão confortante lembrar que cada indivíduo, depois de crer, foi “selado com o Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da nossa herança, para redenção da possessão adquirida, para louvor da sua glória” (Ef 1:13-14).

Além do esboço dado, na epístola aos Efésios, de todas as bênçãos que o cristão recebe, a segunda carta aos Coríntios tem como alvo apresentar o conforto e a consolação que cada um desfruta. Paulo atribui estes ao nosso conhecimento de Deus como Pai quando ele declara: “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação; que nos consola em toda a nossa tribulação, para que também possamos consolar os que estiverem em alguma tribulação, com a consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus” (II Co 1:3-4). Talvez nossa falta de apreciação do Deus de toda consolação como o Pai das misericórdias nos priva da capacidade de verdadeiramente sermos um conforto real aos nossos irmãos cristãos em tempos de dificuldade e tribulação.

A mesma expressão (“Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”) é usada por Pedro para assegurar os cristãos sofredores que eles foram trazidos à bênção de uma viva esperança, e para lembrá-los, quando tentados a contemplar o que poderiam ter perdido por causa do seu relacionamento com Cristo, de “uma herança incorruptível, incontaminável e que não pode murchar, guardada no céu para vós, que mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para salvação, já prestes para se revelar no último tempo” (I Pe 1:4-5). Não é à toa que cantamos;

Nosso Deus e nosso Pai!

Bendizemos Teu santo nome; 

Tuas promessas a nós cumpridas,

Tua fidelidade proclamam! (A Midlane)

Conhecer Deus como Pai é verdadeiramente um relacionamento novo, mas permanente. Antes, pertencíamos a nosso “pai o diabo” (Jo 8:44), mas agora “nossa comunhão é com o Pai” (I Jo 1:3). Comunhão com o Pai traz comunhão íntima, e nos permite oferecer louvor e apreciação apropriados. Também significa que temos acesso ao Pai em tempos de dificuldade, sabendo que podemos contar a Ele coisas que não contaríamos a qualquer outro. Não somente podemos vir ao Pai em tempos de dificuldade, mas nosso relacionamento com Ele é tal que temos sido feitos participantes em tudo o que Ele propõe e providencia para Seus filhos.

Ocupar um lugar de tamanha intimidade é realmente precioso. Ter certeza disto, e saber que nada pode nos deslocar desta intimidade, é igualmente precioso. Tal segurança vem através do ministério bondoso do Espírito Santo. Em Gálatas 4:6 lemos: “Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai”, e esta mesma verdade é confirmada pela afirmação de Romanos 8:14: “Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus”.

Esta posição privilegiada traz grandes responsabilidades. “Se invocais por Pai” (I Pe 1:17), muitas responsabilidades repousam sobre nós, particularmente com relação à obediência. Nossa experiência espiritual começou por obedecermos o Evangelho. O Salvador ensinou aos Seus: “Se me amais, guardai os meus andamentos” (Jo 14:15). É trágico quando a conduta de cristãos não endossa a sua posição como filhos da família de Deus. Há uma dignidade associada com filiação, e o reconhecimento disto deveria controlar nossas vidas para vivermos de uma maneira que traga glória ao nosso Pai. Devemos sempre ter em mente a exortação do Salvador: “Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras, e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus” (Mt 5:16); e novamente: “Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus” (Mt 5:48).

Praticamente

Tendo notado nossa obrigação de refletir o caráter de nosso Pai, é uma grande consolação apreciar tudo o que desfrutamos através de um relacionamento indestrutível com Ele no nosso caminhar cristão, um caminho imprevisível num mundo difícil e tenebroso. Embora apreciemos e valorizemos a função e os recursos dados por um pai natural, isto nos dá somente uma indicação fraca de tudo o que Deus é para os seus, paternalmente. É muito confortante perceber que Deus, como Pai, está constantementeciente das necessidades de Seus filhos. Em Mateus 6:8 o Senhor Jesus ensinou que “vosso Pai sabe o que vos é necessário, antes de vós lho pedirdes”. Ele também ensinou que o mesmo Pai é acessível, e deu instruções claras sobre como e quando orar. Em Mateus 6:6 lemos: “Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e, fechando a tua porta, ora a teu Pai”. O Salvador também salienta a capacidade do Pai de suprir as necessidades de todos, e frisa que os Seus deveriam estar livres de ansiedade acerca das necessidades recorrentes do viver diário, como o que vestiremos e o que comeremos, baseados no fato que nosso “Pai celestial” (Mt 6:26) dá alimento às aves do Céu e veste “a erva do campo” (Mt 6:30). Além disto, é de grande ajuda observarmos a atenção do Pai aos detalhes: “Não se vendem dois passarinhos por um ceitil? E nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai. E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não temais, pois; mais valeis vós do que muitos passarinhos” (Mt 10:29-31). Muitas vezes ficamos preocupados sem necessidade. Se nós entendêssemos a atitude e a autoridade de nosso Pai, isto regularia muito a nossa atitude em relação à nossa maneira de viver, e reduziria muito a preocupação e os cuidados que carregamos desnecessariamente.

Minha vida está em Tuas mãos,

Por que temer ou duvidar?

Uma mão paterna nunca irá trazer

Ao seu filho uma lágrima desnecessária. (W. F. Lloyd)

Se vamos desfrutar totalmente do benefício e descanso que fluem do nosso relacionamento com o Pai, é vital cultivarmos o habito de comunhão íntima e constante com Ele. Temos todo incentivo para orar e desenvolver uma atitude de dependência no Pai. O Senhor Jesus ofereceu tal incentivo quando Ele novamente fez um paralelo com um pai terrestre, e perguntou: “Pedindo-lhe pão o seu filho, lhe dará uma pedra? E pedindo-lhe peixe, lhe dará uma serpente?” (Mt 7:9-10). Ele continua afirmando que se um pai terrestre sabe “dar boas coisas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará bens aos que lhe pedirem?” (Mt 7:11). Talvez nós falhamos em pedir, mas isto nos dá grande incentivo para orar, sabendo que a resposta será para o nosso bem, na bondosa onisciência de nosso Pai. A glória do Pai será a grande consideração, e isto foi reforçado pelo Senhor quando Ele instruiu os Seus: “E tudo quanto pedirdes em meu nome eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho. Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei” (Jo 14:13-14).

Ó! Que paz muitas vezes perdemos,

Ó! Quanta dor desnecessária suportamos.

Tudo porque não levamos,

Tudo a Deus em oração. (J. M. Scriven)

Devocionalmente

Todos os quatro Evangelhos apresentam o Pai. Temos notado vários dos encorajamentos práticos salientados por Mateus, mas ao compararmos os Evangelhos, notamos que João dá muito mais atenção à apresentação do Pai do que os outros. Isto não nos surpreende, se lembrarmos que a apresentação do Senhor Jesus como Filho de Deus é o tema central do seu Evangelho. Seria impossível tratar deste assunto sem magnificar o Pai. Há cerca de cento e cinquenta e cinco referências ao Pai no Evangelho de João, e ao mesmo tempo em que seria muito proveitoso considerá-las detalhadamente, limites no tamanho deste capítulo exigem que escolhamos apenas algumas.

João apresenta as muitas e variadas possessões do Pai. Ele escreve sobre “o seio do Pai” (Jo 1:18), e isto salienta Suas afeições, primeiramente em relação ao Senhor Jesus. Ele também se refere à “casa de Meu Pai” (Jo 2:16; 14:2), e isto salienta a bem aventurança da Sua habitação. Em João 5:26 aprendemos que o Pai “tem a vida em si mesmo”, e em João 5:30 sobre “a vontade do Pai que me enviou”, destacando assim somente alguns dos atributos do Pai. O Senhor Jesus salientou a autoridade do Pai quando Ele declarou: “Eu vim em nome de Meu Pai” (Jo 5:43), e destacou a capacidade do Pai quando Ele mencionou “as obras de Meu Pai” (Jo 10:37).

É muito confortante apreciar que este Pai tem um papel importante na proteção e segurança dos Seus. Isto é uma verdade apresentada de forma maravilhosa no Evangelho de João. Ao ensinar sobre a segurança eterna das ovelhas, o Bom Pastor mostra que elas estão seguras na Sua mão e na mão de Seu Pai, e Ele afirma: “Ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai. Eu e o Pai somos um” (Jo 10:29-30). Tal verdade preciosa é desenvolvida ainda mais quando, na Sua oração sacerdotal, Ele orou: “Pai santo, guarda em Teu nome aqueles que Me destes, para que sejam um, assim como Nós” (Jo 17:11).

Uma posição segura e íntima como esta traz grandes responsabilidades. As expectativas do Pai são desafiadoras e perscrutadoras. Isto foi confirmado pelo Senhor quando Ele falou sobre “os mandamentos de meu Pai”, e em seguida deu Suas próprias instruções: “Isto vos mando: Que vos ameis uns aos outros” (Jo 15:17). Isto faz pesar sobre nós os preceitos do Pai, governando nossos relacionamentos uns com os outros.

Obediência combinada com devoção ao Senhor Jesus representam um caminho de bênção. O Salvador, prestes a deixar os Seus, deixou claro que “Se alguém Me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele, e faremos nele morada” (Jo 14:23). Isto está revelando claramente que é possível para um cristão individual conhecer e desfrutar da intimidade da presença do Pai. Provar esta bênção na Terra é desfrutar do Céu na Terra, antecipando nossa habitação eterna na casa do Pai (Jo 14:2). Tudo isto deveria atrair nossa afeição ao Pai enquanto desfrutarmos da abundância do Seu coração e mão, através da glória do Seu Filho.

Educacionalmente

Ao meditarmos no nosso amor para com o Pai devemos também meditar no Seu amor por nós. Isto se manifesta no fato que somos Seus filhos, e por isso desfrutamos do Seu cuidado e provisão. Entretanto, nosso relacionamento vai além do de crianças; se estende à posição digna de filhos. Nosso relacionamento com o Pai como filhos introduz o assunto importante da disciplina do Pai e nos traz à escola de Deus, onde o Seu propósito é moldar e formar aqueles que são Seus para que possam refletir a Sua glória. “Filho meu, não rejeites a correção do Senhor, nem te enjoes da Sua repreensão. Porque o Senhor repreende aquele a quem ama, assim como o pai ao filho a quem quer bem” (Pv 3:11-12). Este princípio é desenvolvido em Hb 12:4-13, onde é claramente afirmado que é a prerrogativa do Pai lidar com e treinar Seus filhos, e prepará-los para a Sua glória. Tal correção é de acordo com a Sua soberania, sabedoria e amor, e é permitida para o benefício daqueles que são genuinamente Seus. Ser um filho verdadeiramente nascido significa que a correção é inevitável, e assim também a sua falta é uma indicação clara de que não há um verdadeiro relacionamento com o Pai.

Embora o castigo não seja agradável, reconhecer que é permitido pelo Pai por amor, e para o desenvolvimento espiritual dos que pertencem a Ele, será uma fonte de poder e nos preservará de cair no perigo de tratar a correção levianamente. Estas considerações devem regular a nossa atitude às circunstâncias da vida, reconhecendo que “toda a correção, ao presente, não parece ser de gozo, senão de tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça” (Hb 12:11). Que possamos desfrutar da graça e do discernimento espiritual para sermos estudantes dispostos e submissos na escola de disciplina e correção do Pai.

Eternamente

Qualquer artigo sobre a Paternidade de Deus seria incompleto sem algo, mesmo que breve e de forma resumida, sobre o aspecto da sua imensidão eterna. Um dos títulos interessantes dado profeticamente por Isaías ao Senhor Jesus é “Pai da Eternidade” (Is 9:6). No mesmo contexto Aquele que viria é mencionado como “um Filho se nos deu” assim confirmando a eternidade e igualdade do Pai e do Filho. Também, obviamente, confirma a distinção entre as personalidades na Divindade.

Ao meditarmos na existência eterna do Pai nossas mentes se voltam a I Pedro 1:2, onde somos apresentados à “presciência de Deus Pai”, especificamente no contexto de Deus escolhendo os Seus, que estavam sendo perseguidos; isto mostra que Deus irá, a todo tempo, realizar o Seu propósito eterno no Seu próprio tempo.

Enquanto isto é verdade em relação ao Seu povo, é principalmente verdade em relação ao Seu Filho. Em Hebreus 1:5 lemos: “Porque, a qual dos anjos disse jamais: Tu és meu Filho, hoje te gerei? E outra vez: Eu lhe serei por Pai e ele me será por Filho?” Isso está ligado ao Salmo 2:7: “Proclamarei o decreto: o Senhor me disse: Tu és meu Filho; eu hoje te gerei”. A palavra “gerei” (Strong 03205) é usada primeiramente em Gênesis 3:16: “Com dores darás à luz filhos”, e claramente significa o nascimento. Quando aplicado ao Senhor Jesus nos faz recordar da maravilha da encarnação. Não que Ele se tornou Filho na encarnação; isto Ele era eternamente, mas Ele foi “gerado” como Homem, algo que Ele nunca foi antes. O comentário de J. N. Darby no seu livro Collected Writings, Vol. 25 (“Coletânia de Escritos”) é o seguinte:

Foi o Filho quem criou em Hebreus 1, e em Colossenses 1; e quanto a ser Filho no estado eterno, Ele diz: “Saí do Pai, e vim ao mundo”, e novamente: “Outra vez deixo o mundo e vou para o Pai”; se não há Pai não há Filho. Se não o reconheço como Filho quando Ele veio ao mundo, não tenho nenhuma missão de Deus. Temos também, o Pai enviando o Filho. “Filho do Pai” e “Filho de Deus” são essencialmente a mesma coisa, só que um é relacionamento pessoal, e o outro natural. Existem pessoas que consideram que Cristo somente se tornou Filho quando veio ao mundo. A resposta a isto é dada em Hebreus e Colossenses, que por Ele, o Filho, o mundo foi criado. Ele também é chamado de Filho como nascido no mundo. Temos a expressão “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” no Salmo 2. Isto não é exatamente a mesma coisa, embora é a mesma Pessoa, é claro. Ele foi gerado em tempo, isto é verdade quando ao Seu estado humano.

A palavra “unigênito” que, a não ser por Hebreus 11:17, é exclusividade dos escritos de João, frisa a singularidade e o relacionamento sem origem do Filho com o Pai. Sendo que o Filho tem um relacionamento eterno com o Pai, fica evidente que o Pai igualmente é eterno. Nenhum anjo poderia desfrutar de tal relacionamento. As Escrituras nos mostram que é possível para anjos caírem, mas quanto ao Filho do Pai eterno, alegra as nossas almas quando lemos: “Mas do Filho diz: Ó Deus, o teu trono subsiste pelos séculos dos séculos”, ou como temos na ARA: “Mas acerca do Filho, o teu trono, ó Deus, é para todo o sempre” (Hb 1:8).

É difícil para nós, presos ao tempo, compreendermos a vastidão da eternidade. Entretanto, mesmo levando em conta a nossa apreciação limitada, podemos desfrutar até certo ponto o fato que temos sido nascidos na família de Deus, e que nosso relacionamento com Ele é interminável e inquebrável. Quão precioso é poder cantar com confiança:

Redimido, como amo o proclamar!

Redimido pelo sangue do Cordeiro,

Redimido pela Sua infinita misericórdia

Filho de Deus, e para sempre, eu sou. (F. J. Crosby)

Olhando ao passados temos muito que agradecer. É com igual gratidão que meditamos no futuro, à luz do ensino da Palavra de Deus sobre um programa de acontecimentos ainda por vir, que se iniciarão com a vinda do Senhor aos ares para buscar os Seus. Muitos estágios do programa profético de Deus acontecerão, mas Paulo olha através do telescópio divino, ao escrever em I Coríntios 15:24: “Depois virá o fim, quando tiver entregado o reino a Deus, ao Pai, e quando houver aniquilado todo o império, e toda potestade e força”. Mesmo então, quando o tempo não mais existirá e o estado eterno tiver sido estabelecido, Deus nunca será despido da glória, majestade e singularidade da Sua Paternidade eterna.

 - Por Jack Palmer, Irlanda do Norte

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