O Espírito Santo em Romanos

A primeira das cartas apostólicas no Novo Testamento é, possivelmente, a mais importante. Tratando do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo (sua necessidade, seu caráter, seu resultado e suas exigências), a Epístola aos Romanos não tem paralelo no Cânon das Escrituras. Todas as outras cartas do Novo Testamento parecem ter razões locais por terem sido escritas e enviadas às igrejas ou aos indivíduos, mas as duas que tratam da doutrina do Evangelho, Romanos e Gálatas, são endereçadas a um grupo de leitores mais amplo. Reconhecemos que a carta aos Romanos foi originalmente dirigida a várias igrejas locais na cidade de Roma, e seu propósito era apresentar o Evangelho, como pregado por Paulo, aos santos que nunca haviam se encontrado com ele. Sendo que a verdade fundamental do Evangelho é o tema, não nos admira que o Espírito Santo seja tão frequentemente mencionado nesta carta: um total de vinte e sete vezes. Das treze cartas que levam o nome de Paulo, apenas a pequena carta pessoal a Filemon não traz nenhuma referência ao Espírito Santo. Sete das suas cartas têm uma ou duas menções do Espírito, mas as que se referem especialmente à Sua Pessoa e obra são Romanos, as duas epístolas aos Coríntios e a carta aos Efésios. Nestas o apóstolo apresenta o Espírito Santo em três relacionamentos específicos. Para o cristão individual em Romanos Ele é visto, sobretudo, como o “Espírito de Vida”; nas cartas aos Coríntios, em relação à igreja local, Ele é retratado como o “Espírito de Poder” (especialmente caps. 12-14); em Efésios, relacionado à “igreja que é o Seu corpo”, Ele é descrito como o “Espírito da Promessa”.

Talvez seria bom mencionar de passagem que há numerosas menções ao Espírito Santo na carta às igrejas da Galácia — veja o cap. 11 deste livro. Ali também, o Espírito é descrito de forma muito apropriada. Ele é chamado o “Espírito do Seu Filho” por quem o cristão, desfrutando de uma plena emancipação, pode clamar: “Aba, Pai” (Gl 4:6).

Duas coisas relacionadas com o Espírito se destacam em Romanos.
A primeira é o Seu caráter expresso nos diferentes títulos atribuídos a Ele. A segunda é a abrangência da Sua atividade no e a favor do cristão.
A epístola se divide em três partes bem-conhecidas: caps. 1-8: Justiça Exigida; caps. 9-11: Justiça Declarada; caps. 12-16: Justiça Demonstrada.
Acompanhando essas divisões, o Espírito Santo é retratado em três aspectos diferentes. Ligado à exigência feita à humanidade em
geral por uma justiça comensurável com a absoluta santidade do caráter do próprio Deus, Ele é chamado o “Espírito de santificação” (1:4). O título “Espírito de adoção”, dado a Ele em 8:15, é muito apto quando ligado à declaração da justiça que obtém para Israel um relacionamento imerecido com Deus, baseado nas promessas do concerto. O terceiro título significativo que Ele leva na epístola é o de “Espírito de vida” (8:2). Isto também é expressivo quando a demonstração prática da justiça é reconhecida como o tema dos caps. 12-16. É notável que a carta aos Romanos, ocupada com um assunto como este, tem como seu ponto focal o cap. 8, onde o Espírito Santo é mencionado mais frequentemente do que em qualquer outro capítulo da Bíblia. As dezenove vezes em que Ele é mencionado nessa parte fundamental da carta merecem a atenção de todos os leitores atentos da Palavra.

Capítulo 1
Muitas vezes não é fácil determinar se devemos usar o “e” maiúsculo ou minúsculo quando a palavra “espírito” aparece nas Sagradas Escrituras.
A primeira ocorrência em Romanos (1:4) é um exemplo. Entretanto, como geralmente é aceito que a frase “Espírito de santificação” se
refere a caráter, é melhor explicar o termo relacionado ao Espírito Santo do que aplicá-lo a alguma área indistinta onde a santidade é enfática.
Veja as notas de J. N. Darby sobre Romanos 1:3-4 em The Synopsis of the Bible (“A Sinopse da Bíblia”). Estes versículos formam uma grandiosa declaração Cristológica como um fato básico do Evangelho. Eles abrangem a jornada terrestre do Senhor, desde a Sua encarnação até a Sua gloriosa ressurreição dos mortos. Sua participação em humanidade impecável, Sua experiência na morte e subsequente ressurreição dentre os mortos pelo poder de Deus, foram totalmente compatíveis com o caráter Divino como revelado pelo “Espírito de santificação”.

Capítulo 5
A mesma ênfase é mantida na segunda passagem em que a palavra “espírito” é usada e, contextualmente, é fácil entender por que. Tendo mostrado a verdadeira natureza da condição pecadora do homem com suas terríveis consequências, e tendo traçado a eficácia do Evangelho até o ponto onde ele afirma: “tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo”, Paulo acrescenta em 5:5 que “o amor de Deus está derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado”. Numa epístola dedicada à exposição da justiça envolvida com a provisão da salvação para a humanidade culpada, ênfase é colocada na santidade do Espírito. Nada poderia estar mais distante do santo caráter de Deus do que promulgar um meio de reconciliação sobre uma base que não fosse justa e santa. A santidade do Espírito de Deus é salientada pelo relacionamento que Ele mantém com a ressurreição do Senhor e pelas atividades que Ele desempenha em favor daqueles que, tendo sido justificados pela fé, têm paz com Deus.

Capítulo 8
O cap. 8 diz muito sobre a obra do Espírito Santo no Seu relacionamento com o cristão, e muitos títulos significativos Lhe são atribuídos.
Entre as dezenove ocorrências da palavra “Espírito” encontradas neste capítulo, lemos duas vezes do “Espírito de Deus” (vs. 9, 14); uma vez Ele é chamado o “Espírito de vida” (v. 2); uma vez temos o “Espírito de Cristo” (v. 9), e em outra o “Espírito de adoção” (v. 15). Todos os demais usos da palavra têm a ver com os atributos, a obra e com o relacionamento que o Espírito mantém com o cristão.

Capítulo 8:1-4
O cenário de Romanos 8 é muito significativo. O argumento de Paulo, relacionado com a “justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo”
(3:22), atinge seu clímax neste capítulo. A morte do pecador é exigida e não se pode escapar dela. O “Evangelho de Deus” indica que um Substituto para o pecador condenado foi encontrado na Pessoa do Filho de Deus. O ponto central para uma vida cristã se encontra no cap. 6: “Sabendo isto, que o nosso homem velho foi com Ele [Cristo] crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao pecado. Porque aquele que está morto está justificado do pecado” Cap. 9 — O Espírito Santo em Romanos 141
(vs. 6-7). Ao progredir espiritualmente, o cristão vem a ter a mesma compreensão de Paulo, que disse: “Mas vejo nos meus membros outra lei que batalha contra a lei do meu entendimento” (7:23). Libertado para sempre da pena do pecado, o cristão fica arrasado ao descobrir que é “carnal”, isto é, sujeito a todas as fraquezas da carne e, em si mesmo, incapaz de enfrentar o inimigo com esperanças de vitória. Pensar nestas coisas, como ele certamente faz, o leva quase ao desespero. A constante introversão vista no cap. 7 leva ao clamor: “Miserável homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (v. 24). Graças a Deus, Paulo sabe que há socorro disponível. Ele retorna à sua conclusão anterior, de que o cristão morreu com Cristo e não é mais sujeito à pena do pecado. “Portanto agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (8:1). Ligado a Cristo numa união permanente, o cristão está livre, não somente da condenação do pecado, como também da influência do pecado, porque uma nova “lei” opera no seu interior, chamada a “lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus” (8:2). É uma lei de emancipação e poder, enquanto que a Lei mosaica não podia livrar da penalidade do pecado, nem dar poder para superá-la, por estar enfraquecida pelo meio que precisaria usar, isto é, a carne. “A lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus,” não conhece tal limitação. Ao cristão é assegurada libertação pelo Espírito que nos foi dado, e assim somos capacitados a andar, não mais sob os ditames da carne, mas no poder do Espírito Santo.
Falar sobre “o Espírito de Deus” e “o Espírito de Cristo” em absoluta igualdade, define a relação íntima desfrutada pelas Pessoas Divinas.
Como o “Espírito de Vida”, Ele é o poder regenerador pelo qual o cristão nasce de cima (Jo 3:5-8), e como o “Espírito de Adoção”, entre
outras bênçãos, o Espírito Santo capacita o filho de Deus a dizer: “Aba, Pai” ao se aproximar de Deus (8:15). Infidelidade, quer seja eclesiástica ou de culto, é um charco impenetrável onde as pessoas se afundam no seu desejo de negar a divindade e a personalidade do Espírito Santo.
Mas o vasto conjunto de ensino em mais de duzentas e trinta referências através de toda a Sagrada Escritura não lhes permite distorcer a Palavra de Deus a ponto de negar o que é tão claro. Há muitos bons ensinadores que omitem as palavras “que não andam
segundo a carne, mas segundo o Espírito” do v. 1. A razão que dão é que a frase “nenhuma condenação há” é absolutamente incondicional, não dependendo de nada que o cristão faça, mas somente em virtude dele estar “em Cristo”. As palavras, de fato, encaixam bem no final do v. 4, mas certamente se aplicam bem aqui também, se aceitarmos a tradução de J. N. Darby: “Não há nenhuma condenação para aqueles que, em Cristo Jesus, não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito”, mesmo embora ele omita as palavras na sua tradução. O sentido permanece o mesmo em ambos os versículos. Aqueles que estão em Cristo
Jesus não devem mais andar segundo os ditames da carne, mas segundo o poder regenerador do Espírito Santo de Deus.
A Lei no Sinai condenava, e a lei do pecado trouxe escravidão e miséria. Mas agora uma lei inteiramente diferente é apresentada, chamada a “lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus”. Esta lei é a do Espírito vivificador que habita no cristão, por cujo poder ele foi libertado da escravidão do pecado e suas consequências finais. Concordando com o que foi deixado bem claro no capítulo anterior, vemos que isso não é resultado de guardar a Lei no poder próprio, mas pela operação em graça do grande propósito de Deus de que “a justiça da lei se cumprisse em nós”. Ele enviou Seu Filho, que veio “em semelhança da carne do pecado”, e pela Sua morte sacrificial no madeiro desfez o pecado e a morte para aqueles que estão ligados a Ele pela fé. O que caracteriza aqueles que estão associados com Ele, judicialmente fora do alcance do pecado e da morte, é que eles “não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito”. Isso não descreve meramente um contraste aparente entre os que estão associados com Cristo e os que não estão. O descrente é caracterizado por uma mente em inimizade com Deus, voltada para as coisas desta vida e os impulsos carnais. O cristão agora é caracterizado por coisas que agradam a Deus e sua mentalidade corresponde à região “espiritual” na qual ele habita. Novamente uma consulta a JND vai mostrar que as palavras “segundo a carne” e “segundo o Espírito” são substantivos, e seriam melhor traduzidas “mente da carne” e “mente do Espirito”, indicando respectivamente que a mente é entregue aos interesses carnais e espirituais. Ter uma mente espiritual é ter todos os pensamentos controlados pelo Espírito. É impossível agradar a Deus a menos que essa seja a experiência contínua do cristão.

Capítulo 8:9-17
No curto espaço desses nove versículos o Espírito Santo é mencionado dez vezes. No v. 9 Ele aparece três vezes e é chamado “o Espírito”, “o Espírito de Deus” e “o Espírito de Cristo”. Aqui, imediatamente, surgem duas características importantes. Uma é que a Divindade existe como uma Trindade. Assim como o Senhor Jesus disse à mulher junto ao poço de Samaria que “Deus é Espírito” (Jo 4:24), também o Espírito Santo, quanto à Sua própria personalidade é “Espírito”, e é Ele quem o Pai envia em nome do Filho. Este versículo, juntamente com muitos outros, declara a verdade das palavras formuladas há muitos anos como parte de uma declaração de fé: “O Espírito Santo, procedendo do Pai e do Filho, é da mesma substância, majestade e glória do Pai e do Filho, Deus verdadeiro e eterno”.
Ser chamado o “Espírito de Deus” enfatiza a afirmação incondicional feita pelo Senhor Jesus, em João 15:26, de que Ele enviaria o Consolador, “aquele Espírito de verdade, que procede do Pai”. Assim, Ele é descrito como procedendo, ou emanando, do Pai. A palavra “emanar” também traz a ideia de “exalar” como ao respirar. Essa nuança é dada em Jó 33:4, onde Eliú diz: “O Espírito do Senhor me fez; e a inspiração do Todo-Poderoso me deu vida”. Essa mesma palavra, descrevendo o “Espírito de Deus”, é encontrada em muitas outras passagens também.
Poderíamos dizer que no processo natural de respirar, o “fôlego da vida” emana do homem, mas nunca existe como uma entidade separada do homem; assim o Espírito Santo procede e é enviado pelo Pai para testificar de Cristo. O Pai envia o Espírito Santo e assim é afirmado que Ele procede do Pai, e é corretamente chamado de “o Espírito de Deus”.
Da mesma forma, Ele é enviado pelo Filho e é chamado “o Espírito de Cristo”. O Pai, o Filho e o Espírito são da mesma natureza, mas,
enquanto é dito que o Espírito procede tanto do Pai quanto do Filho, nunca lemos que o Pai ou o Filho procedem do Espírito Santo.
O Espírito de Deus habita no cristão como o Espírito de Cristo e isso pelo poder do Espírito Santo. Somos aqui lembrados que não é possível pertencer a Cristo se o Espírito de Cristo não habitar na pessoa (v. 9). A união eterna e espiritual formada por Deus habitando no cristão é enfatizada aqui. O corpo do cristão é sujeito à morte e um dia, se a vinda do Senhor Jesus não se der, seremos levados por ela, mas nesse meio tempo, Deus o Pai é a fonte interna de vida; nosso Senhor Jesus é o canal e o Espírito Santo o elemento místico da sua concessão. O cristão foi trasladado da esfera onde a morte reina, e agora é habitado pelo Espírito de Deus na plenitude dos Seus santos atributos. Sendo assim habitado por Deus, através do Espírito, o cristão possui uma mente que pode agradar, e de fato agrada, a Deus. Na prática, o cristão deve então “andar segundo o Espírito” e tendo a “mente do Espírito”, deve “aplicar  a mente às coisas do Espírito”.
Os muitos relatos da proclamação do Evangelho no livro de Atos dos Apóstolos continuamente enfatizam o fato que “a esse Jesus Deus
ressuscitou” (veja, por exemplo, 2:24; 3:15; 4:10; 5:30; etc.). As epístolas também não são negligentes em apresentar este fato básico do Evangelho (veja I Co 6:14; Gl 1:1; etc.). Aqui em Romanos lemos de Deus que ressuscitou a Jesus dentre os mortos (4:24). O Espírito Santo é chamado “o Espírito de Vida” (Rm 8:2). A descrição do Espírito Santo como “o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus” (8:11) é muito apropriada, pois está relacionada com a vida Divina sendo manifestada no cristão. Esta declaração singular também está associada com aquela obra da graça que, sem a Lei, será revelada na vida ressurrecta manifestada no poder do Espírito.
Em qualquer estudo relacionado com o Espírito Santo, o capítulo 8:9-11 é de grande importância; ainda mais, visto que o ensino apresentado é dado de forma indireta. Paulo não está defendendo a Trindade, mas os versículos em questão são inexplicáveis se não reconhecemos que a pluralidade da Divindade é expressa como uma Trindade. Note que no v. 9 aquele que é chamado de “o Espírito” é também chamado “o Espírito de Deus” e “o Espírito de Cristo”. Da mesma forma o v. 11 fala do “Espírito”, “o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus”; e “aquele que dentre os mortos ressuscitou a Cristo”. Em ambos os casos todas as três Pessoas da Divindade são claramente identificadas.
Aquilo que é declarado do Espírito Santo, aqui e em muitas outras Escrituras, mostra que Ele está em perfeita igualdade com o Pai e com o nosso Senhor Jesus Cristo. Ele é descrito ainda como sendo o Espírito vivificante pelo qual o corpo mortal do cristão será, num dia futuro, ressuscitado dentre os mortos. Isso será realizado “pelo Seu [de Deus] Espírito que em vós habita”.
Outro aspecto da habitação do Espírito Santo no cristão é o fato de ser esse cristão guiado pelo Espírito. Uma má compreensão contextual do v. 14 tem produzido aplicações muito distantes do seu significado correto aqui, e na única outra menção direta sobre ser guiado pelo Espírito, em Gálatas 5:18. Em nenhuma das duas referências é mencionada a ideia de participação inteligente nas atividades das reuniões públicas da igreja. Temos que entender que onde a direção do Espírito é reconhecida, isso será evidente nas reuniões dos santos. Entretanto, a “direção do Espírito” é muito mais importante e mais abrangente do que isso.
Os muitos exemplos dados nas Escrituras de como o Senhor Jesus foi conduzido pelo Espírito Santo devem nos esclarecer quanto ao significado da palavra. Bem no início do Seu ministério público, e tendo sido plenamente reconhecido pelo Céu como “Meu amado Filho”, o Senhor Jesus imediatamente “foi conduzido pelo Espírito ao deserto” (Mt 4:1). Na expressão da Sua humanidade irrepreensível, nosso Senhor Jesus é o exemplo perfeito ao Seu povo de ser guiado pelo Espírito. Assim como o clamor do salmista no Salmo 25:5 pode ser aplicado às palavras ditas pelo Senhor Jesus, assim também devem encontrar um forte ecoar no coração do cristão: “Guia-Me na Tua verdade, e ensin-Me, pois Tu és o Deus da Minha salvação; por Ti estou esperando todo o dia”.
A lei do pecado e da morte permanece ativa no cristão, mas o “Espírito de Cristo”, que é “o Espírito de vida”, também habita nele, portanto, diz Paulo: “De maneira que, irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne” (v. 12), mas temos a obrigação de “pelo Espírito mortificar as obras do corpo” (v. 13), dando assim evidência da vida que possuímos. “Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses [e somente esses] são filhos [maduros] de Deus” (v. 14). Maturidade nas coisas espirituais só pode ser manifestada por uma vida de completa sujeição à direção do Espírito Santo em amor, sabedoria e poder. Devemos nos lembrar do que Jeremias disse: “Não é do homem o seu caminho” (Jr 10:23). Aquilo que a Lei não pode fazer por causa da fraqueza
da carne, e aquilo que o homem não pode fazer por si mesmo no poder da carne, é efetuado pelo Espírito de vida que nele habita, de sorte que os que são nascidos na família de Deus recebem o desejo e a capacidade de agradar a Deus no entendimento maduro da Sua vontade.
Novamente um contraste é apresentado no v. 15: “o espírito de escravidão” é justaposto com o “Espírito de adoção” ou o “Espírito de
filiação”. Em eras passadas os crentes estavam sob a Lei e, na medida da sua compreensão disso, “com medo da morte estavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2:15). Ter medo da morte é temer as conseqüências da Lei, daí o termo “a lei da servidão”. Pelo poder regenerador do Espírito Santo, o cristão foi libertado e não está mais sob o domínio da Lei. Cada cristão já recebeu o “Espírito de adoção”. O uso da palavra adoção, nesta versão, não deve nos deixar confusos por causa do processo moderno de adoção de órfãos na família. A palavra aqui é exatamente a mesma que em “adoção de filhos” ou “filiação”, que encontramos em Gálatas 4:5. Ela se refere a uma “condição adotada, uma posição conferida a alguém para quem não é natural”. Este é o título maravilhoso que descreve aquilo que o cristão desfruta em relação a Deus, o Pai. Somos então capacitados pelo Espírito a dizer: “Aba, Pai”. Essas palavras, embora dando um sentido muito íntimo à invocação, nunca deveriam ser usadas para criar uma familiaridade exagerada quando falamos com Deus em oração. Note como, em Lucas 11:2, o Senhor Jesus ensinou os Seus a orarem: “Pai nosso … santificado seja o Teu nome”. Aba Pai! Te adoramos, prestando humilde homenagem; É a alegria dos Teus filhos conhecer-Te, recebidos pelo caminho vivo; Esta grande honra nós herdamos, Tua dádiva pelo sangue de Jesus; Deus o Espírito, com nosso espírito, testifica que somos filhos de Deus.*
A última das dez referências ao Espírito Santo nesta pequena porção de Romanos 8 tem a ver com Seu testemunho da realidade da posição do cristão na família de Deus. O testemunho ao espírito do próprio cristão, produzido pelo poder do Espírito que nele habita, é triplo. Primeiro, temos a garantia inegável de que somos nascidos de Deus como Seus verdadeiros filhos. Segundo, somos assim constituídos “herdeiros de Deus” (v. 17). Pedro nos lembra de que o “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo … nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar …” (I Pe 1:3-4).
Em terceiro lugar, também nos foi conferido o título maravilhoso de “coerdeiros de Cristo”.
Segundo o pensamento de alguns, o uso do pronome impessoal para o Espírito Santo† apresenta um problema. Não deveria. As palavras aqui seguem uma regra gramatical simples no grego: um substantivo de gênero neutro exige um pronome que também o seja. Esse uso de forma alguma anula as muitas Escrituras que falam do Espírito Santo com um pronome masculino. De fato, no Evangelho segundo João existem alguns casos que os especialistas em Gramática Bíblica chamam “o fenômeno da gramática”, onde a palavra “Espírito” no modo neutro está ligada ao pronome masculino “Ele” (veja, por exemplo, João 14:16- 17).
Assim, na margem da tradução de Newberry lemos: “O Espírito, Ele mesmo testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (v. 16).
* Tradução livre. O original diz: “Abba Father! We adore Thee, humbly now our homage pay;/Tis Thy children’s bliss to know Thee, welcomed through the living way,/ This high honour we inherit, Thy free gift through Jesus' blood;/God the Spirit, with our spirit, witnesseth we’re sons of God".
† Nas versões em inglês; o problema mencionado pelo autor não existe nas versões em Português (N. do E.).

Capítulo 8:18-28
As últimas quatro referências no cap. 8 são interessantes e contém instrução valiosa relacionada às atividades do Espírito. A garantia de
pertencer à família de Deus na qualidade de filhos é dada a todos os cristãos pelo Espírito. No entanto, isso não isenta os cristãos das provações e dificuldades da sua presente condição humana pois, diz Paulo, a Criação foi sujeita à vaidade pela vontade de Deus como resultado do pecado do homem e, até o presente momento, geme aguardando a redenção desta servidão sob a corrupção para a liberdade da glória dos filhos de Deus (vs. 20-22). Em vista daquilo para o qual o cristão foi selado, os sofrimentos presentes não são para comparar com a glória que há de ser revelada a nós e em nós (v. 18). Contudo, o cristão ainda geme juntamente com a Criação, esperando a manifestação pública da sua filiação, ou seja, a redenção do corpo (v. 23). Em meio à Criação que geme e aos sofrimentos presentes, o cristão já possui o Espírito Santo como as primícias da glória, que é uma certeza inabalável da glória que nos será revelada. O cristão é capaz, no poder do Espírito que nele habita, de aguardar com esperança o refulgir daquela glória que tem sido,
desde a fundação do mundo, o propósito imutável de Deus. Outra necessidade do cristão é atendida pelo trabalho, em graça, do
Espírito. Frequentemente o filho de Deus se encontra perplexo quanto à vontade de Deus em relação ao que deve fazer e, mais especificamente, como neste contexto, quanto ao panorama geral do propósito de Deus.
Surgem ocasiões quando “não sabemos o que havemos de pedir como convém” (v. 26). Complicações surgem no caminho do cristão, quando mal sabemos para que lado ir. Em virtude disso nossas orações se tornam, indubitavelmente, menos definidas. A palavra expressiva usada aqui (“ajuda”, e também em Lc 10:40) é melhor descrita por uma cena bem comum nas terras do Extremo Oriente: dois homens carregando entre si, um fardo numa longa vara. Poderíamos dizer que um ou o outro está “ajudando”. Em graça, o Espírito Santo que conhece a nossa incapacidade de orar como devemos nos ajuda ao fazer intercessão por nós. Ao assim fazer, nossas preces são elevadas àquele nível de inteligência espiritual característico da mente do Espírito, que é também a mente do Pai.
Habitados pelo “Espírito de Deus”, o “Espírito de Cristo”, e o “Espírito de vida”, somos emancipados e recebemos o direito de clamar, como filhos de Deus: “Aba, Pai”. Olhamos com ousadia para o fulgor da glória no final do túnel escuro, pois já temos o Espírito que é as “primícias” de tudo que Deus se comprometeu a nos dar, e nas nossas orações, apesar da fraqueza pessoal, o Espírito Santo nos faz aptos a estar em sintonia com a mente do Céu. Não nos admira que Paulo pudesse escrever: “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o Seu propósito” (8:28).

Capítulos 9-11
Se, na primeira parte da epístola aos Romanos, o apóstolo Paulo focalizou no tema do Espírito Santo de forma doutrinária, ele não negligenciou a aplicação prática da verdade. Ele incentiva os santos em Roma a andar “não segundo a carne, mas segundo o Espírito”, e os lembra de que “a inclinação da carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz” (v. 6). Estas exortações são sérias e solenes. Os três capítulos que seguem se ocupam com a justiça de Deus e Seus caminhos para com Israel. A apresentação dos fatos deixa claro que não há injustiça em Deus ao colocar de lado ou, futuramente, restaurar a nação à bênção, mas que em todas as Suas ações para com eles as “profundidades das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus” são insondáveis e os Seus caminhos inescrutáveis (11:33). Nesses capítulos o Espírito Santo é mencionado somente uma vez, destacando a realidade da grande tristeza de Paulo por causa da infeliz condição presente de Israel. Falando disso ele diz que o Espírito Santo é testemunha (9:1). Ele mostra ainda, relacionado a isso, que sua confiança no cumprimento das promessas do concerto de Deus com Israel em nada diminuiu. Ele invoca o Espírito de Deus para dar testemunho do fato que aquilo que ele escreve é exatamente aquilo do qual ele tem certeza.

Capítulos 12-16
No final da carta Paulo está escrevendo aos santos romanos de maneira exortativa. O início do cap. 12 é decisivo nesse ponto. Se uma
posição de perfeita justiça me foi concedida a um custo tão infinito quanto a morte do Filho de Deus, minha resposta precisa ser à altura.
“Para que experimenteis [na prática] qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (12:2).
Em todas as épocas e em todos os lugares um perigo sutil ameaça  os filhos de Deus. É o de permitir que aquilo que é meramente externo e superficial seja considerado o verdadeiro valor espiritual na vida de alguém. Carnes puras ou imundas: comê-las ou abster-se delas: é disso que Paulo escreve no cap. 14, e da atitude de aceitar um ou o outro como o parâmetro verdadeiro de espiritualidade quando, na realidade, tais atitudes resultam em julgar, entristecer ou tropeçar nossos irmãos. Essas coisas, Paulo escreve, não são as características de um “andar em amor”. O reino de Deus consiste em muito mais do que aquilo que comemos e bebemos. Seus atributos são: “justiça, paz, e alegria no Espírito Santo” (14:17). Em Gálatas 5:22 o apóstolo nos diz que “gozo” é uma das facetas do nônuplo fruto do Espírito Santo. Quando o Senhor prometeu enviar o Seu Espírito, Ele também prometeu dar a “Sua paz” e o “Seu gozo” (Jo 14:7; 15:11, 26). Todas estas coisas são prometidas no contexto do Espírito Santo, e disso podemos reconhecer o Espírito Santo como o Agente através de quem essas bênçãos fluem. O gozo produzido pelo Espírito Santo é a característica inconfundível daqueles
que pertencem ao Reino de Deus e que não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito.
Romanos 16 é quase totalmente dedicado à saudação de diversos indivíduos e grupos de santos na cidade de Roma, sem nenhuma referência ao Espírito Santo, mas o cap. 15 ainda tem algo a dizer sobre Ele. Há quatro referências a Ele no capítulo, e três características dEle são mencionadas — poder, santificação e amor. É mencionada “a virtude [poder] do Espírito Santo” (v. 13); “santificada pelo Espírito Santo” (v. 16); “a virtude [poder] do Espírito de Deus ” (v. 19); e o “amor do Espírito” (v. 30). Estas palavras descrevem atributos ou atividades do Espírito que estão em completa harmonia com o contexto geral em que são encontradas.
Paulo, através dessa carta importante aos santos em Roma, apresenta, em linguagem inequívoca, o que ele chama de “o meu evangelho” (2:16). Ele usa um cenário jurídico em que a humanidade em geral está perante o tribunal Divino, indiciada, culpada, e sobre quem paira a sentença de morte. De uma maneira notável, um meio de perdão é planejado e anunciado pelo Próprio Juiz, e isto baseado em perfeita justiça.
O grande poder de Deus, abundando através do Espírito Santo, toma o desespero do acusado e convicto e o substitui por esperança, gozo e paz com base na fé. Além disso, pelo mesmo poder produzido pelo Espírito Santo, “sinais e prodígios” (15:19) são manifestados na pregação do Evangelho do apóstolo, para que os homens possam ser obedientes à Palavra de Deus. Acrescentando a tudo o que já foi dito até agora, poder também é atribuído ao Espírito Santo por causa destes benditos feitos (veja vs. 13, 19).
Notamos que Paulo está consciente de que há um aspecto de adoração envolvido no ministério do Evangelho. Seu desejo é que na “oferta” (v. 16), ou sacrifício dos gentios, o seu ministério seja aceitável a Deus pelas energias santificadoras do Espírito de Deus. Como o Espírito de santidade, o Espírito de Deus declarou a Divina Filiação do Senhor Jesus pela Sua ressurreição dentre os mortos. Semelhantemente, o Espírito, em poder santificador, constitui o corpo de gentios crentes uma oferta aceitável a Deus. Sabendo disso, Paulo se esforçou para chegar a lugares onde Cristo ainda não havia sido nomeado (vs. 19-20). Um último detalhe de interesse relacionado com o Espírito Santo na Epístola aos Romanos é a exortação final do apóstolo, encontrada em 15:30. A primeira menção ao Espírito na parte central da carta se encontra em 5:5. Notamos ali que, pelo Espírito Santo que nos foi dado, o amor de Deus inunda os corações de todos os cristãos. Essa efusão do amor Divino é demonstrado a nós “em que Cristo morreu por nós sendo nós ainda pecadores” (5:8). Ao final das partes prática e doutrinária da epístola, Paulo, pela segunda vez, apela intensamente aos seus leitores para que sejam caracterizados por um comportamento correspondente à sua profissão. No cap. 12 o apelo foi para que apresentassem os seus corpos como sacrifício vivo a Deus e isso, ele acrescenta, nada mais é do que serviço inteligente em vista daquilo em que eles vieram a crer. No cap. 15 ele se dirige a eles novamente com a mesma intensidade, dessa vez para que possam combater com ele em oração. Ele pede para ser o objeto dessas orações unidas, com um propósito triplo (vs. 31-32): • Para que ele fosse livre da ira dos incrédulos na Judeia;
• Para que o seu ministério de levar ajuda financeira dos gentios cristãos aos de Jerusalém fosse aceito por esses últimos;
• Para que, no tempo devido, ele pudesse visitar os santos em Roma com refrigério, pela vontade de Deus.
O fervor desse pedido é evidente nas palavras: “E rogo-vos, irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e pelo amor do Espírito, que combatais comigo” (v. 30). Inteligentemente, oração é feita a Deus, a autoridade desta oração está no Senhorio de Cristo, e a eficácia da oração está no vínculo de amor que flui do próprio Espírito Santo. Novamente, e de uma forma indireta, vemos a unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

Conclusão
Ele é o Espírito de Deus; o Espírito de Cristo; o Espírito de Santidade; o Espírito vivificante; o Espírito Santificador; e em grande poder, o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus.
Em Seus variados atributos e atividades o Espírito Santo é em Si mesmo a própria incorporação do Evangelho acerca do Filho de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo. É assim que Paulo apresenta o Espírito de Deus na sua carta aos cristãos romanos.
Pelo bendito Espírito Santo, enviado por Ti dos Céus, Te adoramos, Pai, por esta dádiva de amor. Igual e eterno contigo, no entanto em sublime graça veio Convencer-nos, pelo Seu poder, do pecado, culpa e vergonha.
Então mostrou-nos que o Salvador levara na cruz nosso pecado; E quando, pela fé, O recebemos, nos selou e agora habita em nós.
Agora Ele nos ensina e guia, através da Tua Santa Palavra; E nos dá poder para o serviço do nosso Salvador, Cristo o Senhor.
Não permita que O entristeçamos por descuido ou erro deliberado; Dá-nos a conhecer a plenitude do Teu Espírito no interior.
Pela presença do Espírito Santo, Confortador e Guia Divino De coração, unidos, Te louvamos por Teu dom benevolente.
Alfred Gibbs*

* Tradução livre. O original diz: “For the blessed Holy Spirit, sent by Thee from heaven above/We would join to praise Thee, Father, for this matchless gift of love./Equal and eternal with Thee, yet, in wondrous grace He came;/By His power to convict us of our sin and guilt and shame.//Then He showed us that the Saviour, on the cross had borne our sin;/And when we by faith received Him, sealed us and now dwells within./Now He seeks to teach and guide us, from Thy precious Holy Word;/And empower us for the service of our Saviour Christ the Lord.//O, forbid that we should grieve Him by neglect or willful sin;/Grant that we may know the fullness of Thy Spirit now within./For the Holy Spirit’s presence, Comforter and Guide Divine;/From our hearts we join to praise Thee for this gracious gift of Thine.”

 

Por James B. Currie, Japão

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