A igreja local e sua conduta

Parece apropriado iniciar um capítulo sobre o comportamento correto numa igreja local com uma referência à primeira igreja em Atos 2. Assim fazendo, o leitor logo se depara com uma característica raramente vista em tempos modernos, mas evidentemente considerada fundamental nos dias dos Atos dos Apóstolos. Refiro-me ao temor de Deus e à sua influência sobre cada membro.

A primeira igreja 

(Atos cap. 2)

Logo que as práticas básicas da igreja em Jerusalém se iniciaram, lemos que “em toda a alma havia temor” (v. 43). Esta observação ocorre antes da relação mais detalhada de suas atividades nos vs. 44-47. Parece ser a intenção clara do Espírito Santo destacar aquele temor piedoso tão evidente. Não encontramos, neste capítulo, nenhuma exortação aos cristãos para andarem cuidadosamente no temor de Deus ao se reunirem.

Esta exortação não era necessária. Este temor santo era a reação espontânea à presença e poder do Espírito Santo. Aqueles em quem Ele habitava não tinham nenhuma inclinação a agir de outra maneira.

Até mesmo na era neotestamentária parece que houve certo afastamento deste alto padrão de reverência, mas o padrão divino para aqueles que pertencem às Suas igrejas locais jamais mudou. O escritor se lembra de ouvir o estimado irmão Thomas McKelvey (1896-1983), da Irlanda do Norte, falar sobre a primeira ocasião quando participou dos emblemas na Ceia do Senhor. Ele disse que pegou os emblemas com mão trêmula. Quem o conhecia pôde perceber, durante toda a sua longa vida, que ele jamais se afastou desta atitude reverente e cautelosa. Ao se levantar para adorar na Ceia, ele falava do “temor reverencial de Deus enchendo o nosso ser”. A presença de Deus entre o Seu povo na igreja requer este temor santo, e é necessário mantê-lo para preservar o ambiente naquele nível elevado que convém a tal ajuntamento.

Um acontecimento solene e grave surgiu naqueles primeiros dias da igreja, quando Ananias e Safira concordaram em mentir aos apóstolos, fazendo-os crer que a quantia que entregaram pela venda da sua piedade era o valor total que receberam (At 5:1-11). Parece que não entenderam que o assunto não era só com os apóstolos, mas sim com o Espírito Santo. Assim a gravidade do seu pecado foi manifestada. A morte dos dois produziu uma intensificação do temor já mencionado, e o leitor atento verá que agora é descrito como um grande temor (vs. 5, 11). Nenhuma leviandade poderia existir naquela igreja. Era bom estar lá, pois Deus estava lá, e todos devem ter aprendido a andar cuidadosamente para não entristecer o Espírito Santo.

O Espírito ainda habita no ajuntamento do Seu povo (I Co 3:16), e assim é uma responsabilidade solene pertencer a este ajuntamento.

Com que responsabilidade para a alma lemos as palavras de I Coríntios 3.17: “Se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá; porque o templo de Deus, que sois vós, é santo!” O saudoso irmão William Trew (1902-1971), de Cardiff, certa vez procurou um irmão idoso, conhecido pela sua piedade e percepção espiritual, sobre um problema sério que ele estava enfrentando com certos irmãos. O idoso sugeriu diversos possíveis procedimentos. Mas a cada sugestão, o irmão Trew dizia que já havia feito aquilo, mas sem sucesso. Ao ouvir isso, o velho experiente disse, com grande impacto: “Neste caso eles terão que tratar com o Espírito Santo!” Quão solene é pertencer a uma igreja bíblica!

O comportamento na igreja em Corinto

O comportamento da igreja dos coríntios estava em pleno desacordo com a intenção de Deus para o Seu povo. Sem dúvida a referência à chamada “para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo nosso Senhor” (I Co 1:9) visava promover a união. Onde há um reconhecimento verdadeiro do senhorio de Cristo, a união não será facilmente comprometida.

Onde há uma verdadeira apreciação da “comunhão de Seu Filho”, todos que participam dela terão uma afinidade uns com os outros. A carnalidade que conduzia à criação de partidos ao redor do nome de certos servos de Deus indicava que os crentes não estavam apreciando esta comunhão sublime (1:12). Tal atividade criou um espírito de rivalidade, e provavelmente também de amargura, na igreja local.

Ninguém deve deixar de considerar a solene importância do cap. 5, e sua referência ao comportamento de todos em comunhão numa igreja local. Quando o v. 8 diz: “Pelo que façamos festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os asmos da sinceridade e da verdade”, a referência é à Festa dos Pães Asmos (Lv 23:6). Esta festa seguia a Páscoa, e sugere a nova vida que a redenção produz. A maldade e a malícia devem ser consideradas como coisas do passado, e a sinceridade e a verdade devem caracterizar o cristão, a partir do dia da sua salvação e até o fim da vida. Vemos a profunda solenidade de tudo isto na parte final do capítulo, onde certos pecados maliciosos e perversos exigem a exclusão de quem os cometeu. Todos, que já presenciaram a exclusão de um membro, reconhecem que este acontecimento é um dos momentos mais penosos na vida de uma igreja.

No cap. 6 vemos que irmãos não hesitavam em levar seus irmãos ao tribunal. Eles, certamente, devem ter-se sentido repreendidos pelas palavras do apóstolo no v. 6: “O irmão vai a juízo com o seu irmão, e isto perante infiéis”. Mais uma vez vemos que muitos não estavam apreciando a “comunhão com Seu Filho”. Isto também é evidente na sua indiferença à consciência do irmão fraco, no cap. 8. Parece que ele era desprezado como alguém com quem não valia a pena se preocupar, nem ele nem os seus escrúpulos, mas a Palavra de Deus diz que ele é um “pelo qual Cristo morreu” (v. 11). Estas palavras são enfatizadas ainda mais pelas palavras: “pecando assim contra os irmãos, e ferindo a sua fraca consciência, pecais contra Cristo” (v. 12). Paulo está decidido a elevá-los ao nível mais elevado do v. 13: “Por isso, se a comida escandaliza a meu irmão, nunca mais comerei carne, para que meu irmão não se escandalize”.

Uma grave falta de união se manifestou, de outra forma, no Partir do Pão. Que tristeza! Aquele santo encontro tinha sido profanado e tratado como se fosse uma refeição qualquer, com o agravo que alguns passavam fome por falta e outros estavam embriagados pelo excesso.

Certamente quando a carta estava sendo lida, e quando chegaram a como a Ceia fora instituída “na noite em que foi traído” (v. 23), um profundo sentimento de vergonha deve ter tomado conta de todos. Seu comportamento estava em pleno desacordo com o ambiente e a solenidade condizente com a lembrança da morte do Senhor.

“Ao contemplar a maravilhosa cruz

Na qual o Príncipe da Glória morreu,

Meu maior tesouro considero perda,

E lanço desprezo sobre todo meu orgulho.” (Isaac Watts)*

* Tradução literal. O original diz: “When I survey the wondrous cross/On which the Prince of Glory died,/My richest gain I count but loss,/And pour contempt on all my pride." (N. do E.)

I Coríntios 13, o grande tratado sobre o amor, teve uma aplicação muito apta às condições em Corinto. Vale a pena citar o comentário de William Rodgers: o cap. 13 […] não só produz o óleo para lubrificar o maquinário do cap. 12, antes deste entrar em ação no cap. 14, mas também fornece o verdadeiro antídoto a todos os males com os quais a igreja de Corinto foi assolada … A frase: “o amor não é invejoso” (v. 4) se opõe à inveja de 12:15-16, e “o amor não se ufana” (ARA) ao orgulho de 12:21. De maneira semelhante, podemos acrescentar que o amor que “não se ensoberbece” não teria dado lugar ao espírito partidário de 1:12, etc. O amor que “não folga com a injustiça” teria impedido a tolerância complacente do mal no cap. 5. O amor que “é sofredor, é benigno” teria sido um obstáculo aos processos contra seus irmãos do cap. 6. O amor que “não busca os seus interesses” teria evitado que os irmãos ferissem a consciência dos seus irmãos mais fracos no cap. 8; e o amor que “não se porta com indecência” teria sido um impedimento tanto à audácia de certas mulheres quanto a embriagues, no cap. 11.*

Os caps. 11-14 apresentam muitos assuntos importantes relacionados ao comportamento que Deus espera do Seu povo quando se reúne.

A primeira parte do cap. 11 apresenta a necessidade da mulher cristã cobrir a cabeça, pois é o sinal da sua sujeição, e também ter seu cabelo comprido, entendendo que assim seu cabelo está em pleno acordo com o simbolismo de cobrir-se. A passagem mostra que a intenção de Deus é que a distinção entre os sexos deve ser evidente na aparência de cada um, e que mulheres que temem a Deus manifestarão isso na sua maneira de vestir, tanto nas reuniões como no seu dia a dia.

A segunda parte do cap.11 já foi tratada quando falamos da desunião que manchava a igreja em Corinto. O uso do título “Senhor” nesta parte destaca a autoridade do Senhor Jesus. Respeitar Seu senhorio quando nos reunimos para nos lembrarmos dEle certamente fará com que cada um seja muito cuidadoso com o seu comportamento e atos.

* RODGERS, William. Bible Notes and Expositions. 1976: publicação particular.

No cap. 12 o apóstolo usa o corpo humano para ilustrar o funcionamento dos vários membros de uma igreja. A lição mais importante é a união, e como já vimos, isto se aplicava de uma maneira especial à igreja em Corinto. Já que o corpo é composto de muitos membros, deve haver cooperação (v. 14). Reclamar por não ocupar uma posição para a qual a pessoa não é idônea é indecoroso. Isto é o que Paulo está ensinando quando ele visualiza o pé como incapaz de dizer: “Por que não sou mão, não sou do corpo” (v. 15). Assim como haveria uma abundância de visão, mas mais nada, “se todo o corpo fosse olho” (v. 17), assim é errado uma pessoa assumir todas as funções numa igreja. Aqueles cuja função ou

dom lhes dá menos destaque não podem ser considerados menos importantes: “E o olho não pode dizer à mão: Não tenho necessidade de ti” (v. 21). O ideal é que “não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual cuidado uns dos outros” (v. 25).

O assunto em destaque no cap. 14 é a edificação. Este é o padrão divino para todas as reuniões da igreja. É a intenção de Deus que os membros sejam instruídos e edificados todas as vezes em que se reúnem. Isto aconteceria principalmente, mas não exclusivamente, através do uso do dom de profecia. É evidente que em nossos dias o ensinamento da Palavra de Deus substitui o dom de profecia dos primeiros dias.

Toda esta edificação espiritual deve acontecer num ambiente de consideração mútua e paz (vs. 20-33). Momentos de confusão ou perturbação não devem acontecer. O escritor se lembra da situação desagradável de ver um irmão sair apressadamente, durante a reunião da ceia, para atender seu telefone celular. Tais ocorrências devem ser evitadas ao máximo.

O cap. 14 oferece muita instrução e ajuda no que diz respeito à participação pública nas reuniões. “Faça-se tudo para edificação” (v. 26) indica a motivação por trás de toda participação pública. “Faça-se tudo decentemente e com ordem” (v. 40) nos faz lembrar da ordem que se via no Tabernáculo no Deserto, com seu ministério ordeiro e transporte cuidadoso. Encarar o ministério da Palavra, ou outros exercícios públicos, com leviandade ou irreverência só pode entristecer o Senhor e comprometer o ambiente celestial na igreja local. Exortações práticas e claras são necessárias às vezes, mas se forem apresentadas com falta de espiritualidade ou com a intenção de humilhar alguém, dificilmente conseguirão algo para a glória de Deus. A palavra “tudo”, no v. 26, abrange o pedido de hinos ou a oração pública. Nestas coisas o Senhor pode guiar, e há uma ligação íntima entre a verdadeira espiritualidade e a direção do Senhor. O bom senso também será consistente com a direção do Senhor. Antes de pedir um hino o irmão vai se certificar de que a música é conhecida. Muitos cristãos têm deveres que precisam ser atendidos depois do partir do pão. Se estiver quase na hora de terminar, não convém pedir um hino comprido. Isto cria tensão naqueles que têm compromissos. O mesmo pode ser dito sobre uma oração longa, em tais circunstâncias. A brevidade de uma oração não é sinal de falta de espiritualidade, assim como uma oração longa não é garantia de piedade; pode sim indicar falta de consideração.

Embora as mulheres devem se manter caladas nas igrejas (v. 34), é evidente que elas vão estar presentes e que terão um desejo de aprender (v. 35). A mulher cristã que pensa que o estudo mais profundo da Palavra é somente para os homens, certamente se privará de muita nutrição espiritual, que por sua vez diminuirá sua contribuição espiritual, tanto no lar como no seu contato com outros cristãos, de um modo geral.

O comportamento na igreja em Filipos

Os santos da igreja em Filipos apresentam um contraste com os de Corinto. Há uma diferença evidente na sua vida de oração. A oração é somente mencionada de maneira geral em I Coríntios, relacionada com o marido e sua esposa (7:5). Somente na segunda epistola é que encontramos um pedido de oração (1.11). Que diferença em Filipenses!

Era com alegria que Paulo fazia oração por eles “em todas as minhas súplicas” (1.4). O grande desenvolvimento do seu amor incentivou o apóstolo a orar para que abundasse “mais e mais” (v. 9). Não era difícil para ele instrui-los a não estarem inquietos por coisa alguma, mas “antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplicas” (4:6). Instruir aqueles que são relaxados em relação à oração com as palavras deste versículo, é perceber o vazio na vida daquela pessoa.

Não era assim com os crentes em Filipos.

O exemplo dos crentes em Filipos em relação à oração tem uma aplicação prática para todos que pertencem a uma igreja bíblica. É surpreendente quantas vezes os irmãos parecem ter uma relutância para orar em reuniões de oração. Há tantos problemas atuais na obra de Deus, um deles sendo a grande preocupação com filhos não salvos, que este silêncio parece injustificável. Os irmãos deveriam vir à reunião de oração já com pedidos no coração, e através da oração alívio seria encontrado.

Assim, todos voltariam para casa convictos de que Deus ouviu as súplicas do Seu povo.

Quanto ao assunto de cooperação financeira no trabalho do Evangelho, havia outro contraste entre os filipenses e os coríntios. Paulo, que recusou ajuda financeira da igreja em Corinto (I Co 9:12), muito se alegrou ao receber de Filipos (Fl 4:10). Além de receber seus donativos, ele pôde contar com “sua cooperação no evangelho desde o primeiro dia” (1:5). Mesmo em Filipos, porém, o pastor e apóstolo previdente parece ter discernido a possibilidade de alguma forma de desunião. Assim ele os incentiva a combater “juntamente com o mesmo ânimo pela fé do evangelho” (1:27). Eles deveriam ter o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa (2:2). Estes ternos apelos, junto com a apresentação do Senhor Jesus como o grande Exemplo (2:5-11), seriam provavelmente o suficiente para afastar estes cristãos destas tendências perigosas.

Refletindo sobre o elevado padrão alcançado pela igreja em Filipos, é importante lembrar que nenhuma igreja, mesmo uma que pareça muito animada, está isenta do ataque do inimigo e da infiltração pérfida de elementos que promovem divisão e perturbação. Quando jovem, o escritor presenciou uma conversa interessante entre dois irmãos experientes.

Um deles comentou sobre certa igreja que ele achou ser “uma das melhores”. Seu companheiro, um homem piedoso respondeu: “Se realmente for assim terão de se cuidar muito, porque o Diabo vai querer atacá-los”.

O comportamento na igreja em Tessalônica

O amor, tristemente ausente na igreja em Corinto, mas evidente na igreja em Filipos, também se manifestou na igreja em Tessalônica, onde servia de incentivo ao trabalho diligente (I Ts 1.3). Este amor unia-se a uma fé crescente e uma esperança futura constante na vinda do Senhor.

Seu amor manifestou-se não somente em trabalho para o Senhor, mas também num cuidado mútuo uns pelos outros. O apóstolo faz questão de promover isto ainda mais: “Pelo que exortai-vos uns aos outros, e edificai-vos uns aos outros, como também o fazeis” (I Ts 5:11). Tal era o progresso em amor entre os irmãos que o apóstolo declarou em 4:9 que era o resultado de uma obra divina nas suas almas: “… vós mesmos estais instruídos por Deus que vos ameis uns aos outros”. É evidente, nas Escrituras, que a obra divina e o exercício humano trabalham em conjunto, portanto o apóstolo os exorta a que “abundeis cada vez mais” (v. 10).

As referências à “fé” em I Tessalonicenses, especialmente no cap. 3, parecem apresentar a fé como a própria essência da vida cristã. O apóstolo procurou confortá-los acerca da sua fé (3:2) por causa da perseguição.

Mandou saber da sua fé (v. 5), temendo que o tentador os derrotasse. As boas notícias trazidas por Timóteo o animaram, e assim ele foi consolado pela sua fé (vs. 6-7), e aguardava a oportunidade para aperfeiçoar o que faltava à sua fé (v. 10).

A fé é realmente o núcleo da vida cristã. Seu poder é estabelecido pela influência que as coisas cridas têm no coração e na vida. Ela cresce com o crescimento das convicções relacionadas com as realidades invisíveis e eternas, e assim se transforma no fator predominante da vida.

As duas epístolas aos Tessalonicenses mostram como a perspectiva da vinda do Senhor era uma esperança sempre viva para os crentes nos dias difíceis de perseguição. Lemos de sua “paciência da esperança em nosso Senhor Jesus Cristo” (1:3). O resultado imediato da sua conversão foi que começaram a “esperar dos céus a seu Filho” (1:10). Assim o bem conhecido trio de amor, fé e esperança se unem como exemplo para todos os cristãos.

Como os filipenses, os tessalonicenses estavam sempre dispostos a levar o Evangelho aos que estavam por perto e aos que estavam mais distantes (I Ts 1:8). Não há dúvida que esta é uma parte indispensável da igreja local e sua conduta.

Resumindo os vários aspectos da conduta cristã vistos nas epístolas aos Filipenses e aos Tessalonicenses, podemos concluir que onde as condições são corretas haverá um ambiente de amor. A fé crescerá. A esperança da vinda do Senhor estará sempre presente. A oração será constante, e a atividade evangélica será uma prioridade. Tudo será feito num espírito de harmonia.

Como convém andar na casa de Deus 

(I Timóteo 3:15)

Nenhum estudo sobre a conduta cristã numa igreja pode ser considerado completo sem algum comentário sobre os versículos que antecedem a grande afirmação em I Timóteo 3:15, que diz: “Mas se tardar, para que saibas como convém andar na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade”.

Os primeiros versículos do cap. 2 deixam bem claro que a piedade e a seriedade devem caracterizar o povo de Deus em geral. Além disso, espera-se que os que oram publicamente na igreja sejam puros no seu testemunho, controlados e convencidos do valor da oração (2:8). Nos vs. 9-15 destaca-se não tanto o que se ouve, mas o que se vê na casa de Deus.

Antes de entrar mais especificamente na seção que trata das vestes e decoro das mulheres na igreja local, seria proveitoso comparar esta passagem com alguns versículos em Isaías 3:12-24. O que é que Deus indica para revelar o estado decadente de Judá? Duas áreas se destacam. Primeiro os líderes (vs. 12-15), e em segundo lugar as mulheres da nação (vs. 16-23), com ênfase especial na vaidade do seu caráter como visto no tintilar dos pés, nos adornos em forma de lua, nos pendentes, nos braceletes, nos brincos, nos anéis, nas joias do nariz, nos vestidos de festa, etc. Assim I Timóteo fala do traje e comportamento das mulheres, seguido pelas qualificações dos anciãos e diáconos. Talvez pudéssemos seguramente afirmar que como antigamente, também hoje, o comportamento e trajes das mulheres e o caráter dos líderes, juntos, apresentam um quadro relativamente claro quanto ao verdadeiro estado de uma igreja local.

O traje honesto com pudor e modéstia em I Timóteo 2:9-10, não é meramente um tipo de uniforme para identificar certo tipo de pessoas. O ponto crucial se encontra na afirmação: “… mulheres que se dizem piedosas” (v. 10, VB). Embora a palavra traduzida “piedosa” seja um pouco diferente daquela usada em outros lugares na epistola, o seu significado é o mesmo. É aquela reverência a Deus que recua diante de tudo que O entristece.

Esta simples definição provavelmente trará à memória dos leitores certas mulheres cristãs de caráter notável. I Timóteo 2 é o que Deus espera ser o normal entre mulheres cristãs. Esta piedade influi na maneira de pensar, e governa suas escolhas quando fazendo compras.

Alguns talvez não percebam o significado do traje e sua importância nos tempos bíblicos. O éfode das vestes do sumo sacerdote sendo de ouro, azul, púrpura, carmesim e de linho fino torcido, de obra esmerada, indicava sua relação íntima com o Santuário da presença de Deus (Êx 28:6). As vestes de saco das duas testemunhas em Apocalipse 11:3 os identificam como homens com uma mensagem solene de juízo. A rapidez com que Pedro vestiu sua túnica em João 21:7, quando soube que o Senhor estava lá, indica que ele não entraria na presença do seu Senhor sem se vestir adequadamente.

Ninguém precisou instruí-lo. Foi instintivo.

Um instinto semelhante, reforçado pelo Espírito Santo, faz com que a mulher temente a Deus se sujeite alegremente às instruções da Palavra de Deus. Ela se veste bem, mas com toda a modéstia. A pureza do seu caráter garante que ela se veste de maneira adequada. O uso de ouro ou sua imitação, ou pérolas ou vestes que chamam a atenção pelo seu exagero ou pelo custo, não lhe interessarão. Ela se afasta da vaidade no seu empenho de fazer a sua vida ser útil, pela prática constante de boas obras.

Diversas passagens dão instrução quanto ao traje das mulheres, mas parece não haver tantas passagens para a orientação dos homens. Sem tentar oferecer uma explicação para isto, é evidente que a piedade de um bom homem também se manifestará no seu traje! Não se pode, nem por um momento, dizer que a ostentação proibida às mulheres é permitida aos homens.

Como os homens devem se vestir quando vão às reuniões? Princípios gerais servem para ajudar. Como Pedro, que já mencionamos, sentia que não podia se aproximar do Senhor vestido com suas roupas de pesca (Jo 21:7), assim homens que percebem a natureza sublime da igreja saberão fazer uma distinção entre o que pode ser aceitável em relação a vestes na vida cotidiana, e como devem se apresentar nos encontros dos santos. O escritor conhece muitas pessoas pobres que, depois de serem salvos, foram recebidas na comunhão da igreja. Sem exceção, e quase sem nenhuma orientação, eles tem se vestido para as reuniões com as melhores roupas que possuem.

Toda pessoa estudiosa fica impressionada com as qualificações elevadas exigidas daqueles que lideram o povo de Deus. Mas ninguém precisa se surpreender, já que se trata da igreja do Deus vivo. O alto padrão exigido daqueles que governam é explicado não apenas pela natureza sagrada dos seus deveres, mas também para que pelo seu exemplo eles possam mostrar a todos como devem viver como membros da igreja local. É evidente que certas qualificações necessárias para o ancião têm a ver com seu serviço. A hospitalidade, a aptidão para ensinar, a maturidade, são indispensáveis para uma liderança bem sucedida. Outras qualidades morais na lista devem ser encontradas em todos os membros na igreja, mas precisam, necessariamente, ser encontradas no ancião. Semelhantemente os diáconos devem guardar o mistério da fé em uma pura consciência. Isto provavelmente indica que pelo menos alguns diáconos ensinarão. Mas o caráter moral elevado exigido destes homens servirá como um exemplo, a todos, daquela santidade que convêm à casa de Deus.

A epístola a Tito

Com a boa mão de Deus, o Evangelho muitas vezes penetrou entre povos cuja cultura deixa muito a desejar. Parece que isto aconteceu em Creta, porque foi um cretense que disse: “Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos” (Tt 1:12). Sem dúvida, este ambiente traria problemas na vida dos salvos, mas a epístola a Tito não manifesta nenhuma tentativa de rebaixar o padrão divino da Sua casa para acomodar a cultura fraca deles. É possível que os novos convertidos fossem mais vagarosos em perceber o novo padrão de Deus e a se conformar com ele. Muitos  mas surgiriam, mas a Palavra de Deus não admite nenhum rebaixamento naquilo que convém àqueles que levam o bendito nome. Assim os homens velhos precisam ser sóbrios e sãos na fé. As mulheres idosas precisam ser sérias no seu viver, ensinando as mais novas a serem prudentes, castas, boas donas de casa etc. Os jovens precisam ser moderados, e os servos precisam ser obedientes (Tt 2:1-10). Como pode um padrão tão elevado ser produzido nas vidas daqueles que outrora eram “insensatos, desobedientes …” (3:3)?. A reposta é que, através da “lavagem da regeneração” (3:5), Deus efetuou uma purificação espiritual que leva os pecadores a desfrutarem uma nova vida. Pela “renovação do Espírito Santo” (3:5) tudo se fez novo, e como o Espírito Santo foi derramado sobre nós abundantemente (3:6), há poder constante para viver como convém aos “herdeiros segundo a esperança da vida eterna” (3:7).

Salmo 89:6-7

O Salmo 89:6-7 apresenta uma conclusão apta ao assunto de comportamento na casa de Deus: “Pois quem no céu se pode igualar ao Senhor?

Quem é semelhante ao Senhor entre os filhos dos poderosos? Deus deve ser em extremo tremendo na assembleia dos santos, e grandemente reverenciado por todos os que O cercam”. A tradução acima torna a aplicação do v. 7 a uma igreja local muito apta. O peso deste versículo, aplicado desta forma, tem sido sentido por aqueles que aprenderam a andar reverente e cautelosamente na igreja.

Quando lemos a Palavra de Deus sempre lucramos se a lermos atentamente.

Fazendo isto com estes versículos, pode ser que a tradução da ARA mostra melhor o significado exato: “Pois quem nos céus é comparável ao Senhor? Entre os seres celestiais, quem é semelhante ao Senhor? Deus é sobremodo tremendo na assembleia dos santos e temível sobre todos os que o rodeiam”. O conselho dos santos parece, portanto, se referir ao conselho dos seres celestes sem pecado. Se for assim, quanto mais Ele deve ser temido entre pecadores salvos pela graça! Se Ele é realmente “temível sobre todos os que o rodeiam”, então o privilégio de se reunir na Sua casa deve ser vista como a honra mais elevada, a responsabilidade mais solene e o maior incentivo à santidade de vida.

Por Thomas H. Matthews, Brasil

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